No balançar da rede

           Joaquim era um viciado em redes, confeccionava e usava constantemente. A rede era sucesso na cidadezinha. Rede para dormir, rede para descansar, rede para transportar os senhores de engenho e para sepultar mortos. A rede de "Joaquim da rede" tinha muitas utilidades.

“Joaquim da rede” foi um caboclo nordestino que passou quase a sua vida inteira a fazer redes. Viveu em uma pequena cidade do Ceará, onde aprendeu o ofício com os pais: o de fabricar redes.

Na casa simples onde sempre morou, construía as redes para vender e também para uso próprio. A mobília era redes em quase todos os cômodos da casa. No quarto principal, uma rede de casal para dormir com a sua amada Ritinha. Em outro quarto, duas redes de solteiro para os filhos, José e João. Havia, ainda, um quartinho minúsculo com duas redes de solteiro, onde dormia a filha Mariana e quem mais chegasse na casa de “Joaquim da rede”.

O xodó do caboclo era a rede feita pelas mãos da sua mãe que o presenteara pouco antes de morrer. A ninguém era permitido deitar nessa rede. Todas as noites Joaquim se balançava na rede e contava os seus segredos para Veludo, um cachorro velho que estava em sua companhia há muito tempo. Enquanto Joaquim tivesse na rede, lá estava o Veludo a fazer-lhe companhia.
Em uma noite de luar, Joaquim deitou na rede e não conseguiu se levantar.

Durante uma madrugada, a esposa Ritinha percebeu a demora do marido em ir para o quarto e saiu para chamar o amado. Encontrou-o ardendo em febre, tremendo de frio e sem pronunciar uma palavra sequer. Ritinha se desesperou e temeu pela vida de Joaquim.

Ao amanhecer o dia, os dois filhos e um compadre do casal colocaram o artesão em uma rede e o levaram para a cidadezinha, em busca de socorro médico. Mas Joaquim não suportou a espera pela chegada do médico e faleceu, enrolado em uma rede. Foi velado na capelinha da igreja, tendo a rede cobrindo o seu corpo. O artesão foi enterrado no cemitério da cidade, sob comoção popular. Veludo não saiu de perto do dono enquanto era velado.

Quando a família retornou para a casa, o Veludo olhava para todos como se quisesse saber notícias de Joaquim. Todos tentavam explicar, mas ele na sua inteligência canina não entendia. A noite chegou e o cãozinho foi deitar no lugar de sempre, perto da rede.

Dos quartos, a família ouvia o balançar da rede todas as noites. Veludo, sempre deitava perto da rede, no mesmo horário, até a meia noite, como sempre fazia nos tempos de vida de Joaquim.

A notícia se espalhou e quem na casa dormia, sempre escutava o balançar da rede até a meia noite. Também, podia ver o fiel escudeiro deitado ao lado da rede, todas as noites, além de olhar para a rede como se tivesse a ver alguém na solitária rede.

E foi assim até o Veludo morrer e a rede ser retirada da varanda pelos familiares de “Joaquim da rede”.


 

Joyce Lima
Enviado por Joyce Lima em 23/07/2017
Reeditado em 22/04/2022
Código do texto: T6062538
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