O HOMEM DO JARDIM (Capítulo 2)
Dona Laura era uma simpática velhinha de cabelos brancos. Quando Magda abriu a porta do quarto espaçoso, a senhora abriu um sorriso.
- Finalmente minha companhia chegou.
Francesca simpatizou imediatamente com Dona Laura. Magda fez as apresentações:
- Mamãe, esta é a…
- Já sei, a Francesca. Não precisa me apresentar. Gostei dos seus cabelos.
A moça riu e pegou um cacho dos seus cabelos vermelhos.
- Ah, muito obrigada. Mas eles dão um pouco de trabalho para cuidar.
- Venha até aqui – Dona Laura bateu com a mão no assento de uma cadeira. - Sente aqui ao meu lado e vamos nos conhecer melhor.
Francesca percebeu um alívio na voz de Magda quando esta disse:
- Bem, meninas. Vejo que está tudo em ordem por aqui. Francesca, ela é toda sua. Bom dia para vocês.
Magda deu um rápido beijo na mãe e saiu do quarto, apressada. Dona Laura, sentada em uma cadeira próxima à janela, comentou:
- Ela estava louca para ir embora.
- Impressão sua, Dona Laura – retrucou Francesca, polidamente, sentando próximo a ela.
- Nada disto. Conheço minha filha muito bem. Então, conte-me sobre você – pediu a senhora com os olhos brilhantes. - Quero saber quem você é.
- Ah, não tenho muito que contar, não. Deixe-me ver... Sou formada em enfermagem, tenho 24 anos e esta é a primeira vez que fico longe de casa. Rompi um noivado de dois anos há pouco tempo... Acho que é isto.
- Você é uma moça muito bonita. Não vai se entediar aqui?
- Não, não vou mesmo! Eu precisava de algo diferente na minha vida. Estou muito feliz por estar aqui. De verdade.
- Que ótimo – Dona Laura parecia satisfeita. A porta se abriu naquele momento e entrou uma empregada trazendo um bule de chá, biscoitos e duas xícaras. - Veja, é para nós. Adoro um chazinho.
Francesca serviu chá a ambas. Dona Laura disse:
- Esta é uma casa grande. Você vai se surpreender com o tamanho.
- Dona Magda me contou que a senhora gosta muito de passear pelos jardins.
- Gosto muito – disse Dona Laura, mordiscando um biscoitinho. - Magda tentou me convencer a vender a casa várias vezes.
- A senhora deve gostar muito de viver aqui.
- Ah, sim! Nasci e cresci aqui. Morei com meu marido nesta casa por quinze anos.
A jovem percebeu um tom de tristeza na voz de Dona Laura. Arriscou-se a perguntar:
- Ele morreu jovem?
- Morreu? Não sei se ele morreu, Francesca. Ele simplesmente sumiu.
- Sumiu? – Francesca quase queimou a língua com o chá, subitamente interessada naquela história. - Como assim?
- Era nosso aniversário de casamento. Ele havia ido tratar de negócios em uma fazenda vizinha. Eu preparei um jantar bem caprichado para quando ele retornasse. Só que ele nunca mais voltou.
- Mas ninguém sabe o que houve?
Dona Laura balançou os ombros em sinal de dúvida.
- Ele chegou a visitar a outra fazenda. Depois que saiu de lá ninguém mais soube o que aconteceu. Fizemos buscas por dois meses. Nem um fio de cabelo foi encontrado. Nos primeiros anos chegavam pistas de que o teriam visto em algum lugar, mas nada nunca foi confirmado – ela suspirou. - Às vezes tenho a impressão de que ele entrará por aquela porta, jovem e altivo. Não o imagino um homem velho, da minha idade. Minha filha tinha apenas 13 anos na época. Acho que é por isto que ela sempre quis ir embora daqui.
Francesca comentou:
- Deve ter sido bem difícil para a senhora...
- Ainda é. Várias vezes eu o vejo ao pé da minha cama. Deve ser por que está morto né? Ou é minha cabeça de velha.
- Não diga isto, Dona Laura. Espero que ele esteja em um bom lugar.
Dona Laura bebeu duas xícaras de chá e então convidou:
- Vamos dar uma voltinha no jardim?
*
Dona Laura e Francesca passeavam pelo jardim ao final da tarde. Um ventinho frio obrigou ambas a vestirem um casaquinho. A primeira alertou:
- No final da tarde sempre esfria um pouco, mesmo no verão. Espero que você tenha trazido um casaquinho, Francesca.
- Eu trouxe roupas para todas as estações, Dona Laura – riu a jovem. - Não precisa se preocupar comigo. Eu que devo me preocupar com a senhora!
Dona Laura apontou para um balanço antigo mais a frente.
- Vamos parar ali. Quero ler um pouco do meu livro.
Francesca a conduziu com a cadeira de rodas até o local e Dona Laura comentou:
- Magda costumava se embalar neste balanço quando menininha. Depois que ela cresceu pouco foi usado.
- Será que eu posso experimentar, Dona Laura? Adoro balanços!
- Claro, distraia-se. Estou atrasada na minha leitura.
Sentada no balanço de madeira, Francesca fechou os olhos e respirou fundo. O ar puro e fresco era revigorante e a moça sentiu um grande bem-estar. Aproveitando que Dona Laura estava concentrada no livro, a jovem começou a prestar atenção ao seu redor. No lugar onde estavam havia dois bancos de madeira e mais adiante um chafariz. No balanço de madeira cabiam duas pessoas e era adornado por trepadeiras. Dona Laura havia mencionado que havia uma grande piscina do outro lado da casa e, quando esquentasse, Francesca poderia dar um mergulho, se quisesse. Em cada parte do jardim havia canteiros de flores diferentes. Francesca desejou ter trazido o celular no passeio para tirar algumas fotos.
Mais adiante um movimento chamou atenção de Francesca. Um homem de cabelos escuros encostado a uma árvore olhava fixamente para ela. A surpresa foi tanta que o balanço foi parando lentamente. Não podia distinguir direito suas feições, mas dava para perceber que era muito bonito. Quem seria?, perguntou-se ela, encantada. Dona Laura, concentrada na leitura, não percebeu nada. O homem continuou no mesmo lugar, imóvel. Talvez fosse algum empregado da casa, embora não estivesse vestido como se fosse um.
- Francesca...
Ela piscou assustada. Dona Laura a olhava com curiosidade.
- Tudo bem com você?
- Sim? Oh, sim, está tudo certo.
- Está um pouco frio. Vamos voltar?
- Claro! – Francesca deixou o balanço e se aproximou da cadeira de rodas. Olhou disfarçadamente para onde estaria o homem, mas ele não estava mais lá.