OMISSÃO DE SOCORRO
Era madrugada, quase início da manhã, uma leve claridade já podia ser vista pela vidraça da janela do quarto. Assustado com o toque, o homem sonolento pega o telefone, a ligação cai antes que possa atender. Acomodando-se na cama volta a cochilar, mas é novamente despertado por mais um toque. Ao ouvir o início de uma chamada a cobrar, desliga e volta ao leito para mais algum tempo de sono.
Não consegue, outra vez a campainha do celular insistentemente o faz atender pela terceira vez, após ouvir a gravação de telefone a cobrar pergunta já nervoso:
_Quem é? Não tem o que fazer ligando a esta hora da noite?
_ Sou o Domingos aqui da
Não deixa terminar a frase, já atendera outras ligações a cobrar, mesmo tendo a pessoa se identificado, sendo desconhecido muitas vezes fora trote.
_ Que irresponsável, Domingo sei lá das quantas, não conheço nenhum, deita resmungando.
O toque irritante volta a chamar sua atenção, anunciada o tipo de ligação alguém fala:
Sou o João, não desligue, espere
_ Não lhe conheço, responde desligando o telefone.
Enfim o sossego, ao desligar definitivamente o aparelho, não poderiam mais perturbar seu sono.
No meio da manhã, já no seu hospital para o início das consultas agendadas, ao ver o relatório de entradas na emergência, lhe falam de um trágico acidente que acontecera ao amanhecer: A colisão violenta entre duas motocicletas, que resultara no óbito de um dos condutores no local, e do outro, algum tempo após, ao chegar no hospital em estado grave, com grande perda de sangue, causado por hemorragia interna, agravada pela demora por falta do socorro imediato.
Segundo informações, o pessoal que mora perto do local, ao ouvir a colisão, tentou prestar o atendimento, alguém pegou o celular do rapaz, já com sinal vermelho de pouca carga, ligou para um número que estava em destaque, mas não completou a chamada. Com outro telefone, no momento sem créditos, insistiram em ligar a cobrar por várias vezes, mas não aceitaram a ligação, recusando-a com grosseria e desligando o aparelho.
Um tanto confuso, com o coração apertado, buscou em seu fone as últimas chamadas. Para sua triste constatação, percebeu da pior maneira o grande erro que cometera em não atender naquele amanhecer as insistentes chamadas.
Lá estava, o número do filho, seguida de outras com números desconhecidos, precedidas pelo “90”