O LAGO
A noite até que estava agradável, apesar de meio úmida por conta de um friozinho sem sentido que fazia naquela hora próxima à meia-noite.
Os dois casais remanescentes da pequena reunião festiva que atravessara a tarde e boa parte da noite, conversavam animadamente na grande mesa da varanda. O quintal que se estendia à frente deles findava num pequeno lago artificial envolto pela claridade amarelada que emanava da luz do poste quase à beira d'água.
Os homens conversavam alto, as mulheres também! Os assuntos se cruzavam e parecia que todos se entendiam, até quando uma das mulheres que estava sentada voltada para a frente do quintal começou a mudar de fisionomia. Calou-se num instante. A anfitriã percebeu a reação da amiga e perguntou o que havia acontecido. A mulher não conseguia responder. Os olhos logo se marejaram e o máximo que ela conseguiu expressar foi um gesto levantando o queixo em direção ao lago.
Os homens haviam interrompido a conversação para acompanhar o que acontecia com as suas mulheres. Finalmente, a mulher saiu de seu êxtase e disse que estava vendo um homem agachado perto do lago.
O lago distava uns cinquenta metros de onde estavam. A luz fraca transformava quase em penumbra o local. O anfitrião pensando tratar-se de algum invasor, levantou-se imediatamente e se virou em direção do lago. Apertou os olhos para tentar enxergar melhor e nada viu. A outra mulher sem sair da cadeira virou-se, mas também nada viu. O outro homem manteve-se sentado, mexeu apenas com a cabeça e também nada viu.
O frio parecia que aumentara. Um silêncio intimidante pairava por todo o local. Os sons da noite haviam cessado!
A mulher agora chorava abertamente. A outra mulher procurara pela mão do marido que continuava em pé e atento. O outro homem tocava o braço de sua mulher que chorava, pedindo para que se acalmasse.
De repente, a mulher parou de chorar. Sentia-se ainda assustada, mas mais calma. Agradecera ao marido pelo apoio carinhoso. Pedira desculpas pela estranha situação.
A amiga anfitriã sugeriu um café e convidou a outra mulher agora refeita da emoção para acompanhá-la à cozinha e juntas 'passarem um café'.
A conversa entre os homens havia sido retomada do ponto em que fora interrompida.
A noite continuava úmida, fria, silenciosa e escura.
Na manhã seguinte já com sol alto, alguns garotos estavam na mesma varanda. Dois deles em cima da mesa e o terceiro sentado no degrau que separava o piso de pedra do chão da varanda, empoeirado e com bastante folhas caídas das árvores próximas.
Uma lagartixa grande percorre a moldura de uma das janelas da casa que dava para a varanda. Um dos garotos atira uma pedra na vidraça quadriculada, estilhaçando o vidro de um dos pequenos quadrados. Os meninos riem! Mas, permanecem no lugar de forma despreocupada.
O que estava sentado no degrau pergunta ao que atirara a pedra se ele não tinha medo. O garoto disse que não! Estava acostumado a ir até lá! Dizia que a história ouvida de seu pai sobre o que havia acontecido ali quando o seu avô ainda era criança não o assustava mais, e que, a casa abandonada há tanto tempo ser habitada pelos fantasmas dos dois casais assassinados por um ladrão logo após uma festa da família, era invencionice de gente religiosa e ignorante da região.
Os garotos continuaram na varanda por mais algum tempo e depois foram embora atravessando um buraco do que, um dia, havia sido um lago, se apoiaram numa grande pedra próximo ao muro alto e o pularam para a rua lá fora.
Em algumas horas, mais uma noite chegaria!