A NOIVA MORTA - Cap. 3
Getúlio foi obrigado a rir ante os preparativos do primo. Um pouco antes das oito horas da noite ele já estava pronto para sair. Lavou o cabelo, pegou emprestado o perfume caro de Getúlio e até vestiu a calça nova comprada na loja da Clotilde poucas horas antes. Ao contrário do dia anterior, a noite estava agradável e estrelada. Perfeita para um encontro como ele mesmo fizera questão de frisar.
— E se ela não estiver lá? - perguntou Getúlio, meio que surpreso com o empenho de Josué em ir atrás da moça desconhecida.
— Se não estiver hoje, pode ser que amanhã ela venha. Ou depois - Josué estava bastante empolgado. — Quero saber quem deixou uma dama daquelas esperando sob chuva e frio. Aquilo não se faz.
— Bem, boa sorte.
— Obrigado - disse ele dando o retoque final no cabelo. — Se eu demorar você saberá o motivo.
Josué saiu em seguida e tomou o rumo da praça. Seus passos eram nervosos e apressados. Ainda não sabia bem o que dizer se ela estivesse lá. Geralmente desinibido no trato com as mulheres, daquela vez Josué se sentia tímido. Mesmo assim isto não foi o bastante para desanimá-lo. Seguiu firme e forte, sentindo as mãos frias dentro do bolso. Seu empenho foi recompensado. Assim que dobrou a esquina, deparou-se com a visão da jovem sentada no mesmo banco, exatamente como a noite passada. Josué parou, respirou fundo e tomou a direção dela. A ansiedade aumentou à medida que se aproximava. Não havia ninguém na praça quando ele parou ao lado da moça.
A jovem olhava para algum ponto indefinido a sua frente, as mãos cruzadas no colo sobre o vestido branco. Os cabelos louros estavam cobertos por uma espécie de véu. Apesar do ventinho frio, aquilo não parecia lhe afetar.
— Boa noite, moça.
Ela não respondeu imediatamente e Josué chegou a se perguntar se seria surda. Aos poucos, porém, voltou seus olhos para cima e fitou Josué. Assim, tão de perto, a moça era ainda mais linda.
— Boa noite - repetiu ele.
— Boa noite - ela disse com a voz quase sussurrada.
Estranho aquilo, disse Josué para si mesmo. Algo não estava certo ali.
— Você… você está sozinha?
Ela voltou a olhar para frente e balançou a cabeça fazendo que sim.
— Qual seu nome? O meu é Josué. Muito prazer.
Nada. Sem resposta, Josué se sentiu um bobo. Ele tentou novamente:
— Qual seu nome?
Silêncio. Um vento mais geladinho começou a soprar e o rapaz aconchegou-se no seu casaco. O vestido dela era fino, mas mesmo assim a garota não dava sinais de que passava frio. Criatura estranha aquela!
— Por que você está sozinha? Desde ontem eu a vejo aqui. Está esperando alguém?
A moça o olhou mais demoradamente desta vez. Murmurou depois de alguns segundos:
— Eu preciso ir para casa.
— Bem, eu posso levar você. Permite?
Ela não respondeu e se levantou, parando ao lado de Josué.
— Você é daqui da cidade? Onde você mora?
A moça apontou para frente e Josué entendeu que aquela era a direção para onde ambos deveriam se dirigir. Ao lado dela, o homem acompanhou os seus passos suaves e silenciosos. A moça era tão graciosa que parecia deslizar. Era uma lástima que não fosse de muita conversa.
— De onde você vem? - insistiu Josué, ansioso para travar uma conversa.
Pelo visto a moça não estava nem um pouco disposta a bater papo. Josué, desconcertado, iniciou um monólogo incessante. Não sabia sequer se a moça estava ouvindo alguma coisa. Ela permanecia ao seu lado, olhando para frente, parecendo alheia a todo o resto. O próprio Josué se sentia um tolo.
A jovem tomou um rumo um pouco desconhecido para Josué. Depois de um tempo, ambos pegaram um caminho que se afastava da parte central da cidade. Um pouco temeroso, Josué olhou ao redor. Não estava gostando muito daquele novo trajeto.
— Você mora para estes lados?
Subitamente ela parou. A rua não era muito clara. Faltavam postes de iluminação por ali. Sem falar nada, a moça apontou para um local atrás de dele. Josué, a princípio, não entendeu. Havia dois portões de ferro enferrujados e muitas árvores mais para o fundo. Não parecia ser um local de moradia.
— Aqui? Você mora aqui?
Intrigado, Josué foi até os portões. Queria saber o que havia atrás deles. Era tudo muito antigo. Como seria a casa da garota? Velha, caindo aos pedaços, solitária como ela?
Os olhos do homem custaram um pouco a se acostumar com a escuridão além dos portões. Era difícil conseguir visualizar alguma coisa mesmo com a luz das estrelas.
— Meu Deus... ─ sussurrou quando distinguiu dois túmulos velhos e carcomidos pelo tempo poucos passos de onde estava. Aquele lugar era o cemitério da cidade!
Totalmente pálido e sem sentir as pernas, o rapaz se voltou bruscamente para a moça. O sorriso fantasmagórico que ela lhe lançou fez com que Josué soltasse um grito horrível, de puro medo.
— Quem você é? De onde você vem?!
A moça fez menção de se aproximar e estendeu sua mão para tocá-lo. Tomado pelo pânico, Josué deu dois passos para trás, tropeçou em uma pedra e se estatelou no chão, sem nunca tirar os olhos de cima dela. O fantasma, a alma penada ou seja lá o que fosse aquela criatura, caminhou na direção de Josué. Mais do que rápido ele ficou em pé e com as mãos feridas e sangrando pela queda nas pedras do cemitério, ele deu meia volta e saiu correndo e arfante daquele lugar tenebroso.