Últimas sombras
Jeremias olha para o prédio. Pelas informações que obteve ela pode sair a qualquer momento.
Quem o visse ali no muro não suspeitaria que ele não fosse daquele lugar.
Os cabelos compridos, presos e cobertos com uma touca de lã preta.
O blusão gasto de couro espanta o frio.
Uma camiseta de uma banda de rock qualquer.
A calça jeans, velha e justa com uma corrente presa em um daqueles “baguios” de prender o cinto que vai até a parte detrás da calça.
O velho Nike companheiro de aventuras mil.
Alguns anos antes, Cinthia fora embora com a família para a cidade grande.
A vida de Jeremias era um mosaico quebrado desde então.
Brigas, bebedeiras, vandalismo.
Jeremias olha para a foto recente mais uma vez.
Para ter certeza quando a visse. Não pode falhar em seu intento.
Naquele dia frio e triste de Outono até o sol sai com certa má vontade.
Cinthia sai do prédio. Seus cabelos negros esvoaçam.
Os lábios sorriem fazendo duas covinhas no rosto negro.
Ela se despede da amiga e logo em seguida vê Jeremias.
Sua primeira reação é de espanto, depois, inundada pelas lembranças dá um sorriso tímido.
Jeremias desencosta da parede sente o peso dentro do casaco.
Ele comprou especialmente para a ocasião.
Não consegue pensar em como ela o abandonou.
Ele a mostrará como se sente.
Um vento frio balança o rabo-de-cavalo do rapaz.
Jeremias atravessa a rua. Cinthia pisca os olhos ansiosamente.
É agora ou nunca!
Jeremias saca do casaco e aponta para a garota.
Anos de abandono acabarão ali.
Cinthia arregala os olhos. Não pode acreditar.
Lágrimas escorrem pelo rosto da garota.
Ela abraça Jeremias beijando-o docemente, com a caixa de bombom nas mãos.
Os dois vãos embora abraçados junto com o cair das sombras, quando se encerra aquele longo e frio dia.
Fim.