A Cidade do Nevoeiro - CAPÍTULO 3 – O MISTERIOSO MOOGIE

O prédio fazia barulhos estranhos.

As pessoas são estranhas.

É um mundo desconexo.

Neste ponto Sylph se define como alguém que parece estar aceitando bem os fatos ocorridos, possui um bom controle de si mesmo, pensando de forma lógica, mas ainda faltava despertar muito dos seus sentidos e sentimentos.

A cidade de Pequena Dor era realmente intrigante, viviam cerca de dez mil seres ali, todos com seus corpos deformados e pouco comunicativos, ficavam a maior parte do tempo ocupando-se construindo coisas, dia após dia era uma luta para conseguir lidar com aquele local e se acostumar, mas a cada dia que passava, seus sentimentos pareciam retornar um pouco mais e isto dificultava as coisas para Sylph. Ele se sentia encantado por Cynthia, adorava como ela era e o tom de voz dela, ele pensava muito em como falar com ela e isto ocupava bastante sua mente.

Uma semana havia se passado desde que Sylph chegou ao estranho vilarejo de Pequena Dor, sabia que seria uma semana pelo homem chamado “Relógio” ele ficava o dia todo sentado na esquina olhando para o céu e contando vagarosamente, ele definia para as pessoas ali o tempo que estava passando. Completamente acostumado com o local, agora desempenhava o papel de ajudante do Sr.Seguro, que era basicamente ajudá-lo a colocar bandeiras de sinalização em torno dos limites do nevoeiro em torno da cidade, um trabalho bem simples mas que sempre despertava a curiosidade de saber o que há do outro lado, o próprio Sr.Seguro o escolheu para ser seu ajudante, pois havia descoberto o rapaz em uma conversa que teve com Um Olho no mesmo dia em que Sylph caiu naquele mundo.

Sylph fez uma grande amizade com Cynthia neste tempo, passavam muito tempo conversando sobre como eram as coisas na vila e como poderiam ter sido as coisas antes de terem chegado lá, ele realmente se encantou por ela, uma coisa curiosa que descobriram e foi anotado no livro do prefeito Moogie foi que quando tentavam imaginar uma vida antes de terem chegado, no dia seguinte eles sempre esqueciam, ele agora era uma pessoa séria, esforçado, tentava ajudar ao máximo as pessoas do vilarejo e isto mudou um pouco o cenário do local, pois o que antes era um vilarejo sem vida alguma com suas ruas totalmente vazias, agora parecia estar com um pouco mais de vida, Sylph se mostrou um verdadeiro líder.

Uma das melhores amizades que Sylph fez foi com Divane, a mulher responsável por ajudar na aparência das pessoas do vilarejo, pois era muito atenciosa e gosta muito de contar histórias imaginárias de como era o mundo atrás do nevoeiro, mas, umas das piores amizades que Sylph fez foi com o velho Um Olho que desde que o deixou na porta da prefeitura há uma semana nunca mais conversaram. Mas nunca conheceu o prefeito Moogie, as pessoas da vila diziam que ele nunca saia de seu escritório na prefeitura, “Alguém é normal naquela prefeitura?”, pensava ele. O local que Sylph morava era bem simples, ele não gostava muito de guardar coisas, preferia ver seu quarto o mais limpo possível e com poucos objetos.

As ruas da cidade estavam se tornaram mais movimentadas, pois pode se dizer que Sylph promoveu a conversa entre os habitantes, algumas pessoas não gostaram muito desta mudança, como é o caso de Sorriso Sorriso que quando saia de seu escritório, em ocasiões raras, gostava de rosnar quando passava por perto de pessoas que estivessem conversando, também não tinha mais aquele sorriso exagerado no rosto e nem tanta maquiagem.

Agora Sylph e Sr.Seguro se dirigiam para o lado sul do vilarejo, o velho Um Olho havia falado que ao passar pelo local pela manhã percebeu que uma das bandeiras estava possivelmente danificada, possivelmente por que ele disse que não queria se aproximar só para dizer se estava tudo bem ou não, logo comunicou ao Sr.Seguro.

Agora ambos estavam seguindo para o local, Sr.Seguro que era um homem de meia idade aparentemente, pois sua memória certamente era de alguém jovem, Sylph era responsável por carregar as bandeiras novas, elas eram de cor avermelhada ou cinza, pois não haviam muitos tecidos de outras cores e toda cor azul foi utilizada na prefeitura, lembrando que tudo que ali chegava, caia no “local das quedas” aonde Sylph chegara aquele mundo, ele realmente não gostava de carregar a bandeira, mas não haviam outras funções que despertara a curiosidade dele.

Passaram por algumas pedras grandes ao descer um morro que era um caminho para fora da cidade rumo aos limites do nevoeiro, então Sylph pode ver aquele enorme nevoeiro que parecia uma enorme muralha branca, ele era realmente muito denso e quase impossível mesmo perto enxergar alguns centímetros à frente, mas ele já estava acostumado com aquele tipo de visão, além do que neste tempo que esteve na vila nunca viu um dos tais DAIMON passando por ali.

Chegando enfim na bandeira estragada, viram que Um Olho estava certo, mas algo era muito estranho na forma como a bandeira estava estragada, de fato ela estava muito próxima ao nevoeiro, era possível ver que cerca de três centímetros já tocaria a bandeira, a pergunta era “Por que esta bandeira foi colocada tão próxima assim?”.

Sr.Seguro retirou seu capuz, pela primeira vez deixando Sylph ver seus cabelos cinzas caindo sobre seus ombros e cobrindo também seu rosto, ele se virou e parecia preocupado.

- Não me lembro de ter colocado esta bandeira tão próxima assim – Suspirou. – Realmente não coloquei assim tão próxima, me deixa preocupado, pois até parece que o nevoeiro está se aproximando.

- Mas por que te deixa preocupado? – Perguntou Sylph, que ainda tentava enxergar mais claramente a bandeira que era tapada pelo enorme roupão de Sr.Seguro.

- Veja. – Ele mesmo mostrou a bandeira, e claramente era possível ver enormes rasgos nela, o formato de um deles pareciam garras ou uma mordida, na certa era um DAIMON, não havia como supor outra coisa.

O que Sr.Seguro então queria dizer era algo como, um DAIMON fez aquilo, provavelmente pelo nevoeiro estar tão próximo era fácil para um alcançar e destruir, mas por que a bandeira estava tão próxima? O nevoeiro realmente estava se aproximando?

- Isto é algo que suspeito Sylph, algo que venho observando desde que tenho esta função – Suspirou fundo. – O Nevoeiro vem se aproximando da cidade e esta ficando cada vez mais rápido. – Começou a respirar mais rapidamente, realmente parecia preocupado – Precisamos avisar o prefeito, pois, esta bandeira estava no mínimo uns vinte metros daqui.

Ele se virou para a bandeira e começou a puxar a bandeira estragada, parecia desesperado, realmente Sylph sentiu que era uma situação complicada e uma situação muito séria, caso o nevoeiro chegasse a alcançar a cidade o que eles iriam fazer ou para onde eles iriam?

- Rápido venha comigo. – Disse Sr.Seguro enquanto terminava de acomodar a bandeira com ele. - Temos que comunicar o prefeito imediatamente, então pegue... – Foi interrompido brutalmente por um barulho de carne sendo rasgada.

Uma garra enorme saiu de dentro do nevoeiro e com um único movimento rápido decapitou Sr.Seguro, o sangue começou a jorrar instantaneamente e desta vez sim, havia sangue, a cabeça caiu no chão e começou a rolar em direção ao Sylph, que só parou em seus pés com o rosto de Sr.Seguro virado para ele como se estivesse o olhando, mas Sylph que estava ali pálido, sem nenhum movimento, sua mente se esvazio, não conseguia nem ao menos pensar, começou a soluçar aos poucos enquanto via a enorme garra desaparecendo por dentro do nevoeiro, o sentimento de medo havia voltado naquela hora e ele não sabia lidar com aquilo, era uma cena situação assustadora, sentia seu corpo muito frio e não havia nenhuma reação, sua vista começou a sumir aos poucos e tudo ficou escuro.

“Era uma vez, um garoto chamado Prince e vivia no mundo dos homens triangulares, era um garoto muito magro e por este motivo sempre era motivo de piada entre as pessoas de sua cidade, pois ele não era triangular, mas sim uma pessoa que parecia um retangular, mas ele parecia não se importar com isto, as pessoas não poderiam ferir ele por este motivo, afinal era uma pessoa muito bondosa e desejava encontrar alguma pessoa que fosse semelhante a ele, certo dia...” ·.

Divane foi interrompida pelos soluços de Sylph ao acordar meio assustado após o ocorrido, ela estava sentada ao seu lado de sua cama com um pequeno livro em mãos, aliás, um livro escrito por ela mesma, Sylph de relance pode ver o nome, “O Mundo Triangular”, mas estava ainda vidrado no que acabara de acontecer.

- Calma descanse, você está em casa, o prefeito Moogie o chamou para conversar na prefeitura, ele irá explicar tudo e querer explicações para poder te ajudar e nos ajudar, por enquanto descanse – Ela falou sem fazer pausa.

Sylph entendeu as palavras e relaxou, ela parecia muito boa realmente com as palavras e o seu tom de voz era muito confortável, tentou não pensar nas cenas que viu, mas era inevitável pensar, queria perguntar como foi parar ali, mas decidiu não, não entendia a situação, mas decidiu que era melhor não fazer nada, queria que Divane continuasse a história, parecia que assim conseguiria esquecer o que ouve por um tempo, claro por que as histórias nunca faziam muito sentido.

As garras, o sangue e o Sr.Seguro morto, estas imagens não saiam de sua mente, ele realmente estava morto e não pode fazer nada, por algum tempo isto fez com que Sylph se sentisse fraco, ele não queria se sentir assim, pois sabia que não era assim.

- Deixe me começar outra história, você me interrompeu nesta que estava lendo. – Ela retirou outro livro da bolsa e começou a ler.

“Era uma vez um menino chamado Prince, ele era uma pessoa muito solitária, pois ninguém gostava de suas orelhas grandes, mas Prince não era um menino normal, odiava mais a si mesmo do que as outras pessoas, por este motivo, decidiram cortas às orelhas...”.

- Tudo bem apenas me deixe dormir – Assim falou Sylph, de uma forma que pudesse impedir que ela continuasse, não queria parecer desrespeitoso, mas não era o momento para fingir que estava tudo bem, por mais que ele tentasse, ainda não era o momento.

- Sim claro, também não estou com histórias muito boas hoje. - Ela sorriu.

Alguém bateu na porta, “Entre”, falou Divane em um tom de voz alto, a porta se abriu e quem chegou foi Cynthia com uma expressão de preocupada no rosto.

- O prefeito esta chamando você Sylph, ele quer vê-lo imediatamente.

Após muito se contorcer e pensar um pouco no que responder, quando percebeu, já estava na prefeitura em frente a uma porta enferrujada, com uma placa escrita “Prefeito Moogie”, realmente a situação foi rápida no caminho até lá ele não pensava claramente em nada, a mente apenas mergulhada nos recentes acontecimentos. Sylph foi acompanhado até a prefeitura por Cynthia, que o deixou sozinho lá e pediu para que entrasse sozinho, conforme Moogie havia lhe dito.

Moogie mesmo sendo o prefeito da cidade não era muito conhecido pelos habitantes de Pequena Dor, então despertava duvidas e curiosidade de Sylph a respeito de como seria esse prefeito misterioso, mas mesmo com isto em mente não hesitou em abrir a porta e adentrar a misteriosa sala.

Uma sala escura, com visibilidade baixa, a visibilidade na verdade era maior em uma mesa ao fundo onde já era possível ver alguém sentando que lógico era Moogie, Sylph se aproximou e mesmo assim não conseguiu se quer ver o rosto dele, nem ao menos enxergava qualquer coisa a sua volta.

Ele pode sentir uma cadeira tocando sua mão, pois não conseguia a ver, decidiu se sentar, quando se sentou uma voz firme e grossa falou:

- Olá recém-chegado, bem vindo.

Sylph se assustou um pouco, Moogie chegou para frente e encostou-se à mesa e assim ficou mais próximo a luz, agora era possível ver como ele era.

Um homem alto careca, um pouco magro mas com uma enorme barba, usava óculos escuros no mais não era fácil enxergar com clareza pois a luminosidade realmente dificultava muito, mas quando os olhos começaram a se acostumar com a escuridão pode observar um frasco em cima da mesa ao lado da mão esquerda de Moogie, lá tinha dois olhos e um dedo, era uma visão perturbadora.

- Preste atenção. – Ele começou a falar – Fiquei sabendo o que aconteceu, Sr.Seguro foi morto e pelas evidencias encontradas por Vasculha, ele foi morto por um DAIMON.

- Sim exato – Completou Sylph, mesmo sabendo que isto era óbvio demais.

- Muito bem, te chamei aqui para perguntar se ficou sabendo de mais alguma coisa, se sim, por favor, diga. – Parou de falar e virou-se olhando fixamente para Sylph.

Pensara em falar como aconteceu, mas visto a situação que estava sentiu que Moogie esta o analisando de cima em baixo, mas parece que Vasculha já havia feito o trabalho dele e era mais sensato a Sylph não fugir muito do que já havia sido dito, se bem que era muito evidente o que aconteceu, mas Sylph não estava muito familiarizado com a situação na verdade começou a se questionar o que estava fazendo ali, contudo lembrou-se das ultimas palavras de Sr.Seguro, sobre o nevoeiro estar se aproximando da cidade.

Brevemente falou para Moogie exatamente o que Sr.Seguro lhe contou, quando terminou reparou que ele agora apertava firmemente o braço da cadeira que estava sentado, demonstrando preocupação, como se algo do passado o pertubasse.

- Não vejo mentira no que me falou, mas não entendo por que Sr. Seguro não havia me contado isto antes. – Resmungou Moogie.

- Provavelmente ele também não tinha certeza. – Falou Sylph de forma insegura.

- Entendo, mas se isto estiver realmente acontecendo, não há nada que eu possa fazer. – Franziu a testa – Olha é melhor que você também não conte nada a ninguém, não há nada que possamos fazer se isto de fato está acontecendo, alarmar os habitantes seria pior.

- Mas por quê? As pessoas do vilarejo deveriam saber – Retrucou Sylph.

- Mas o que poderíamos fazer? Absolutamente nada!

- Como? As pessoas ficariam em perigo – Sylph falou em tom um pouco mais alto demonstrando sua indignação, era o momento de ele se mostrar forte, algo que vinha de dentro dele.

- Sim estaríamos, mas não a nada que possamos fazer contra um DAIMON, entenda. – Suspirou – Entenda que existem DAIMON com força suficiente para derrubar uma casa.

- Como você pode saber disto? – Sylph o encarou, era o momento de querer mais explicações.

Por um momento ele pensou que Moogie estava preocupado com Sr.Seguro também e poderia não estar analisando bem a situação, mas Sylph estava diferente, parecia que situações assim já haviam acontecido várias vezes em sua vida, por isto ele não se deixava abalar, a volta dos sentimentos é o que confundiam ele, por isto as decisões rápidas que tomava.

Moogie abaixou a cabeça demonstrando estar pensativo, algo estranho estava para contar, isto é o que Sylph sentiu, esperava-se que fosse algo que explicasse os atos de agora pouco, simplesmente não poderiam lutar ou tentar fugir deles, não era possível que o nevoeiro fosse tão perigoso assim, poderiam encontrar um local mais seguro do que esta vila ou tentar passar pelo nevoeiro de alguma forma.

- Olha Sylph, eu já me aventurei por dentro deste nevoeiro. – Ele se afastou da mesa e o que se percebeu era que na verdade ele estava sentado em uma cadeira de roda. – Já tentamos até cavar um túnel, mas existem DAIMON vivendo por baixo da terra, mas preciso lhe dizer, foi isto que aconteceu por ficar cerca de dois minutos lá dentro, mais ou menos. – Voltou ao seu lugar - É impossível sair, de alguma forma eles farejam, sabem onde estamos, existem DAIMON sobre a terra e também voando pelo céu, mas você sabe o que significa DAIMON?

Sylph acenou com a cabeça em negação.

- Escrevemos em letra maiúscula para ser mais “impactante”, mas significa “Demônios Anjos Imaginados Monstruosamente Onde Nascemos”. – Ele suspirou – Um nome complicado, mas foi cada pessoa que ajudou a fundar esta cidade que escolheu uma palavra e ficou assim, mas enfim...

Enquanto ele falava, Sylph pensou a quanto tempo existia esta cidade, ele sentia-se mais incomodado com o fato das pessoas estarem acomodadas como estão e desmotivadas, mas isto se deve é claro pelos sentimentos demorarem a aparecer, talvez para cada pessoa isto varie, mas de qualquer forma sentia que não poderia deixar as coisas assim, sentiu que poderia fazer algo, não poderia ser simplesmente ficar parado se caso o nevoeiro chegasse, mas se bem que ele viu aquela enorme garra decapitando Sr.Seguro, aquilo foi aterrorizante de fato, algo deve ser feito em relação aos DAIMON.

Moogie tossiu forte, virou-se para Sylph e começou a falar:

- Vou te contar a história de como o antigo prefeito veio a falecer, você entenderá melhor. – Se encostou mais adequadamente na cadeira.

Ele pegou um livro muito empoeirado, deu para ler a capa de onde o Sylph estava, dizia “Diário”, era o diário do Moogie, por isto aquilo na prefeitura a forma como tudo é relatado, Moogie certamente adora escrever sobre tudo que acontece. Ele abriu o diário e foleou algumas páginas até chegar na que ele queria, ele disse bem baixo “aqui” e então começou a ler...

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1º Cap - http://www.recantodasletras.com.br/contosdesuspense/5447443

2º Cap - http://www.recantodasletras.com.br/contosdesuspense/5447450

Saah__
Enviado por Saah__ em 13/11/2015
Reeditado em 13/11/2015
Código do texto: T5447453
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