A LUA É A CULPADA
A LUA É A CULPADA
Até onde será que o cansaço é capaz de interferir na nossa capacidade lúcida, a tal ponto de deixar-nos confusos do que está sendo real ou pura imaginação.
Reparem no que aconteceu com Jorginho:
Ele estava obcecado para chegar ao seu destino viajando sozinho de carro por uma estrada.
As horas solitárias de viagem passavam e o tempo já parecia enganar Jorginho que olhava aquela estrada infinita pensando: “Nossa! Já faz muito tempo que estou viajando e não vejo nenhum carro cruzar por mim nessa estrada! Preciso encontrar algum lugar que tenha pessoas para conversar e descansar um pouquinho”.
O olhar de Jorginho seguia hipnotizado pelas faixas infinitas da estrada, quando avistou ao longe uma velha placa, parecia até ilusão, mas ao se aproximar sentiu um alivio, pois na placa estava escrito assim:
Visite Baguaçu
Era uma estrada de terra que parecia não levar a lugar nenhum, mesmo assim Jorginho se aventurou a entrar, já que o cansaço pedia insistentemente por uma parada.
Antes de entrar naquela estrada de terra, Jorginho já havia perdido o sentido de tempo, agora também perdera o sentido de localização e só se sentiu aliviado quando avistou uma cidade minúscula parecendo um vilarejo.
Foi entrar na cidade e imediatamente avistou uma praça com aparência de abandonada. Nas ruas não havia ninguém, apenas um homem com aparência de andarilho estava sentado em um banco da praça.
Rapidamente Jorginho estacionou o carro e foi conversar com o homem, pois precisava urgentemente conversar com alguém.
Jorginho se aproximou do homem e cumprimentou, porém o homem apenas levantou a cabeça, olhou em seus olhos e falou:
- A lua é a culpada!
Jorginho não entendeu nada, mas só havia aquele homem na praça, então resolveu sentar um pouquinho e ouvir em silêncio tudo o que ele tinha para falar.
O homem falava como se Jorginho nem estivesse ali, parecia estar contando para si mesmo uma história que era assim:
- A lua é a culpada! Eu sei por que estava lá e fui a vítima dela! Naquela noite ela estava cheia e clara! Sua luz iluminava tudo tornando fácil ver! Observar! Seguir e até atacar qualquer pessoa. Mas não é de ataque que eu quero falar! Nem de violência! Eu quero falar de amor e a lua é a culpada. A noite estava clareada pela luz da lua, quando ela chegou simpática com seu jeitinho meigo, atraente, feliz e demonstrando muita vontade de amar, mas não foi isso que aconteceu, pois a lua brilhava forte e tudo mudou, já que ela foi embora e me deixou iluminado pela lua, que observava tudo silenciosa e atenta, parecendo gostar da situação, então elevei meu olhar totalmente focado na lua e desabafei:
- Lua! Eu vou contar para você esta história de amor. A lua me olhou com sua grande cara iluminada, curiosa e prestando bastante atenção.
- Lua! Ela passou e deixou seu rastro na minha vida. À medida que eu falava, a lua se aproximava e chegava mais perto, bem perto, tão perto que eu sentia sua face gelada.
- Lua! Ela falou que me amava e eu acreditei!
De repente o homem parou, pensou um pouco e falou:
- Lua! Você é a culpada! A lua não aceitou a culpa e protestando escureceu. Você me fez apaixonar! A lua foi minguando de tristeza e diminuindo sua luz. Ela se cobriu com um manto negro deixando apenas uma parte de sua face à amostra, minguada e escondida.
-Sabe lua! Não se esconda de mim. Deixe-me ver sua grande face novamente e me cobre com sua luz. A lua voltou furiosa não aceitando aquela situação de culpa e rapidamente foi aumentando o seu tamanho, nova, crescente até virar lua cheia. Foi se aproximando cada vez mais, crescendo, ficando enorme e chegando bem próxima. Naquele momento eu senti uma brisa gelada, um vento lunar e percebi que a lua jogou uma maldição sobre mim como castigo, mas não era um castigo, era amor. A lua se apaixonou por mim e me encantou. Logo senti meus olhos arderem. Não sei o que aconteceu com os meus olhos naquele momento! Eles ardiam.
- Corri e olhei no espelho! Minhas pupilas estavam brancas parecendo uma lua cheia e a minha cabeça estava dominada pela lua, que me atraia como um imã. Quando a lua cheia surgia o meu coração gelava, o meu corpo gelava, o meu sangue gelava e eu ficava louco de amor por ela, subindo nos telhados, nas árvores ou numa grande pedra, onde passava a noite gritando por ela, vendo-a passeando bela e atraente vestida de branco naquele céu estrelado, girando como uma fera e se alimentando do meu amor. Enfeitiçado por ela eu gritava, gritava e gritava de amor.
- Uma noite a Lua decidiu me buscar e levar embora. Naquela noite ela apareceu grande, enorme, cheia e iluminada clareando tudo com sua luz de amor. Foi uma noite de desespero e eu fiquei louco babando feito um animal impaciente. Subi no telhado e comecei a gritar feito um lobo uivando para a lua, gritando muito alto na esperança de que ela ouvisse meus gritos de desejo por ela. Todas as pessoas daquele lugar ficaram apavoradas com os meus gritos que de um momento para o outro se calaram e o silêncio tomou conta daquele vilarejo.
- Quem testemunhou, viu a lua cheia se aproximando, uma grande lua cheia com uma garota de branco que pegou a minha alma e levou embora para sempre largando o corpo jogado no telhado. Deve haver um mistério muito grande na lua cheia, pois ela se aproxima calmamente, nos deixa apaixonados por ela e depois rouba a nossa alma para usar o brilho da paixão e enfeitiçar o coração das pessoas com a luz do amor.
O homem levantou a cabeça novamente e Jorginho reparou nas pupilas dele. Eram duas luas cheias sem brilho, opacas e sem vida. Realmente parecia que alguém havia roubado a sua alma. Um calafrio instantâneo de medo passou pelo corpo de Jorginho, que entrou no carro, voltou para a estrada e continuou sua viagem.
A história contada pelo homem dominou os sentidos de Jorginho, que um quilômetro depois de seguir viagem decidiu voltar e ajudá-lo, mas aconteceu uma situação estranha, pois Jorginho voltou e não encontrou mais a placa da cidade, nem a estrada de terra, o que deixou ele muito confuso com a situação, mesmo assim Jorginho continuou sua viagem meditando: Será que tudo aquilo realmente aconteceu ou teria sido apenas fruto de sua imaginação causada pelo excesso de cansaço.
Paulo Ribeiro de Alvarenga
Criador de vaga-lumes
Iluminando pensamentos
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