A Morte de uma Boneca
E se aquela boneca com lacinhos rosas e uma fita vermelha no vestido florido não te encantar mais? Se esta boneca que faz 14 anos que vc ganhou, não te despertar mais com aqueles sorrisos ao pega-la, ao fazer suas comidinhas, ao trocar suas roupinhas e dizer "vou leva-la para passear"... Se, por ventura, este encanto morrer? Este amor por aquela boneca quase gente acabar? Se ali, na estante cheia de brinquedos novos, acessórios, vc esquecer do que a boneca te fez sentir? Se vc não mais sentir o prazer de receber aquela alegria real e pura de brincar com a dona Lili com seus amiguinhos quando crianças? Oi, vc não se lembra quem é Lili? Então já posso concluir que vc já esqueceu daquela bonequinha que ganhou se seus pais quando não tinha irmãos, não tinha amigos, a Lili era a única com quem vc brincava, ela falava oito frases e a sua preferida era "ame tudo o que te faça bem"... Um vácuo naquele momento interrompia a prosa entre vc e as lembranças deixadas naquele quarto. Longos minutos de silêncio corria junto com suas lágrimas... Como pude esquecer desta grande amiga-boneca? Sou uma ingênua que não valoriza as pequenas coisas! Um mão por trás se aproxima, deslizando aquele rosto já pálido e cansado de chorar. A mão era de sua mãe, que ao perceber todo aquele episódio de choro, abraçou a filha de vinte e cinco anos. Longos choros aconteceram por ali. Cecília, então disse a sua mãe:
- Mãe, por que vc me deu esta boneca?
- Filha, por que isto agora? Tem tanto tempo que vc tem ela?
- Mãe, preciso saber! Por favor, me diga!
- Filha...
- Por favor, mãe! [choros]
- Ok, vou dizer... Antes deu ficar grávida de vc [choros] [choros]
- Mãe, o que foi? Por que está chorando?
- Minha filha, esta boneca é especial, ela é diferente de todas as bonecas! Ela já me fez feliz em dias que eu queria apenas fechar os olhos para nunca mais abrir!
- Mãe! [choros]
Aquele momento, Cecília ficou ainda mais confusa, e ao mesmo tempo se identificou com o que a mãe disse.
- Filha, esta boneca significa muito para mim! É o primeiro brinquedo que vc ganhou de mim e do seu pai. O nome dela foi a gente mesmo é quem escolheu: Lili. Até as roupinhas dela, o cabelo, as fitinhas... Cada detalhe tem um enorme sentido para mim. Melhor dizendo, para nós!
- Me explica isto, mãe! Preciso saber!
- Vou explicar, sente aqui! [...] Filha, quando vc tinha dois meses [choros] [choros] ...
- Mãe...
- Você tinha uma irmã mais velha, ela era a criança mais sensível e doce, adorava fazer os outros felizes, não demostrava nunca que estava triste! E um dia quando ela fez 5 anos, me pediu um presente, mas falou "mamãe, se vc e meu papai não puderem comprar minha bonequinha, eu entenderei". Aquilo foi forte para mim por que uma criança era daquele jeito? Alegre, meiga, compreensível... Então, naquele momento eu abaixei a cabeça e abracei-a! Compramos a boneca para ela, quando chegamos em casa, chamamos-a por um bom tempo e ela não apareceu. Falamos exatamente estas palavras "filhinha, temos um presente para vc, adivinha o que é?" Mesmo assim, ela não apareceu. Então demos um tempinho e nada de Lili. Fomos no quarto dela, a porta estava trancada, daí, começamos a desesperar, porque ela nunca tinha trancado a porta... Seu pai pulou a janela e, quando penso que não, ali estava ele com sua irmã nos braços, ela estava pálida, gelada, e com um sorriso bem distante, como se tivesse despedindo da gente. [choros] [choros] [choros].
- Mãe, o que aconteceu com minha irmã?
- Naquele momento eu a abracei e começamos a chorar. Ao lado dela tinha um diário e uma carta separada em sua mão... No diário estava registrado cada dia que ela passou, ninguém sabia deste diário! As visitas dela ao orfanato e hospitais de crianças. E na carta estava escrito "mamãe, não sei se vc vai chegar a tempo, estou passando muito mal, estou sentindo fortes dores no coração e quando tentei me levantar desmaiei. Depois acordei e desmaiei de novo, pensei, será que vou morrer? Então escrevi esta carta... Ah, a bonequinha que vcs foram comprar, não era pra mim, era pra eu dar minha irmanzinha, eu queria dar um presente para ela... Mamãe, diga ao papai que eu o amo muito! Vcs são os anjos mais bonitos da minha vida!"
Naquele momento eu não sabia o que fazer, minha filha! Seu pai ficou desconfigurado! Eu comecei a balançar sua irmã, chama-la, abraçá-la... e nada! Pois, ela já não estava ali conosco! Aquela imagem dela é registrada até hoje em mim, cada detalhe, a roupinha que ela estava, um vestidinho florido com uma fita vermelha, os laços rosas no cabelo... E no final da carta estava escrito "ame tudo o que te faz bem"...
- Mãe? [choros] [choros]
Naquele momento, Cecília já tinha entendido tudo! E sua mãe não conseguiu falar nem uma sílaba! Cecília foi correndo pegar a boneca, abraçou-a e começou a chorar por horas e horas... Cecília nunca soube que tinha uma irmã! Sua mãe preferiu esconder isto para ela não sofrer! E a boneca, era na realidade o presente da irmã de Cecília a ela. A imagem daquela menina doce, alegre, amorosa e precocemente madura voltou naquele lugar, e todos começaram a chorar...
[...]
Cecília acordou e olhou para o lado e não estava em seu quarto, estava acordada em meio ao sonho.
(Karine Oliveira Cardoso)