UM CAMINHO DE DOR E TRISTEZA

Célio encontrava-se totalmente perturbado, não tinha mais nenhum controle de si mesmo. Sua existência estava completamente degradada. Todos que conheciam aquele homem achavam que ele havia superado a sua infância problemática, mas os fantasmas do passado haviam voltado para atormentá-lo. A imagem do pai alcoólatra e violento não saia da sua lembrança. E a dúvida do que de fato aconteceu com sua mãe, transtornava a essência do pobre homem.

Na adolescência, Célio se mostrou um bom estudante. Não era brilhante, não havia nele o mínimo lampejo de genialidade, mas era muito esforçado. A sua existência parecia seguir um ciclo normal, aos vinte anos de idade, logo após ter ingressado na carreira de policial militar, o jovem encontrou Gerlice, a garota que ele imaginava ser a companheira perfeita. Tudo entre eles transcorreu como um mar de rosas, se casaram e pareciam felizes.

Porém, alguns anos se passaram, o mar de rosas que adornava o casal tornou-se turvo, as flores secaram e não enfeitavam mais as suas vidas. A rotina e o tédio envolveram os jovens. O tão sonhado e desejado filho não veio para alegrar e completar a família. Gerlice já não era mais dócil com o marido. Célio era constantemente envolvido por um ciúme doentio e consequentemente as brigas entre eles se tornaram rotineiras. A pobre mulher decidiu abandonar o confuso policial e retornou à casa dos pais. Ela descobriu o mar de lama em que o marido se aventurou e resolveu ir embora, não queria ser co-particiapante da tragédia anunciada.

No trabalho, Célio havia se tornado um policial corrupto e violento. Paralelo a isso, tentando evadir-se da perturbadora realidade, ele havia se enveredado no vício das drogas. Dentro de poucos meses, a sua falta de disciplina e a sua vida desregrada o levou a ser expulso da corporação. E assim, o seu barco naufragou definitivamente no seu oceano de lama existencial. Pobre Célio, havia se enveredado num caminho sem volta. Todos o abandonaram, os seus poucos “amigos” o viam como um ser desonrado.

A casa do pobre viciado se tornou uma mescla de desorganização e sujeira, o toque feminino de Gerlice não se fazia mais presente naquele lugar. Não existia ali nenhum resquício de amor e afetividade, tudo era vazio, tudo era tédio, tudo era tristeza “temperada” em dor. O agora ex-policial perambulava por dias, tentando saciar o seu vício. Quando retornava para casa, o perdido homem fixava, por longo tempo, os olhos em um cofre e pensava e refletia se o abria ou não.

Célio vê a sua imagem no espelho, estava maltrapilho e sujo, ele não se reconheceu naquela imagem degradante. Sentiu-se envergonhado e percebeu que naquele ser não havia mais nenhuma essência e integridade. Ele fica por dois dias sem sair de casa, a depressão se tornou insuportável. Gastou o seu último esforço e nesse curto período, não usou nenhum tipo de entorpecente. De repente, ele se lembrou daquela que fora sua amada companheira e decidiu lhe fazer uma visita, para tentar reatar o já perdido relacionamento.

Perturbado e com um olhar estranho, ela caminha pelas ruas em direção à casa dos pais de Gerlice. Chegando lá, o pobre homem encontrava-se em um estado deplorável. Assustada, a moça não o recebe. O pobre Célio é expulso da casa como se fosse um animal sarnento. Desnorteado, com o rosto lambuzado com catarro e lágrimas, e com muita dificuldade, ele perambula pelas ruas em prantos incontidos. A sua situação era tão degradante, que assustava os transeuntes que cruzavam com aquela criatura, que era a metáfora da tristeza e da humilhação.

Célio aproxima-se da porta de sua casa, de repente, os seus passos se tornaram firmes. Com um olhar decidido ele atravessa a sala tropeçando no lixo que a inundava. Ele caminha pelo sujo corredor e finalmente entra em seu quarto. Então ele abre o cofre, contempla por um tempo o objeto que ali se encontrava. Olha para a imagem de Gerlice em uma foto a muito esquecida pendurada na parede. Determinado, Célio apanha a pistola 9 milímetros, sente um frio estranho invadir o seu corpo e sem hesitar, dispara contra a sua cabeça. O corpo ensanguentado cai no chão e o brilho fosco dos seus olhos se apaga, colocando fim a uma existência amargurada.

Vicente Mércio
Enviado por Vicente Mércio em 23/09/2014
Reeditado em 18/05/2024
Código do texto: T4973147
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