OS QU4TRO

Minha mãe era uma boa mulher,após a morte de meu avô,seu pai,ela teve que cuidar de todas as dívidas que ele deixara aqui em vida,fora,outros problemas que foram aparecendo conforme o tempo passava.Ela ainda contava com a ajuda de meu pai,mas isso era muito vez em quando.
Papai trabalhava como promotor de vendas de uma marca de roupas para empresários,e sempre estava viajando pelo Brasil e mundo,sempre,sempre mesmo.Era quase que impossível encontrá-lo em casa.Ela brincava que ele perdera os melhores momentos de nossas vidas,por exemplo,quando um dos meus quatro irmãos disse sua primeira palavra,que,surpreendentemente foi "papai".Perdeu também meu primeiro show com minha bandinha mirim quando estava na segunda série,nunca vou esquecer da mamãe tentando me animar dando pulinhos,gritos bregas de incentivo como "yahoo!","upa upa!",ou,"iuuuuupiiiiii!"...bons tempos,mamãe sempre foi papai também!Não que eu esteja desmerecendo o velho,pois ele é uma homem e tanto,seja no caráter,seja no trabalho,seja na família.Nunca tivemos raiva dele,sempre o entendemos,sabíamos que ele fazia aquilo pra nos garantir uma vida decente...mas a mamãe,mesmo não tendo que quase que morar na ponte aérea,ela tinha nosso maior carinho.
Não entendi como as coisas foram ficando daquele jeito,quer dizer,tudo começou num dia comum,e logo depois da tragédia,mas,não entendo como.Ou por que..ou simplesmente por que com ela.Por que com minha mãe,uma ex-enfermeira de hospital público que largou o trabalho pra dar conta dos quatro filhos homens que tinha uma ano apenas de intervalo entre seus nascimentos.
Não tínhamos mas o pai pra nos ajudar,pra nos dizer o que fazer.Não tínhamos mais ele pra dizer que tudo não passava de uma coisa boba e que logo tudo se acertaria,como quando nosso cachorrinho foi atropelado e morreu.Papai disse que ele não tinha morrido,que na verdade,nós éramos os personagens de um filme sem fim que Deus assistia,como se uma novela fosse.Aí,como nos filmes que víamos todos os sábados a noite,o cachorrinho tinha que sair da novela pra estreiar uma outra,pros deuses de outras religiões.Uma explicação meio complexa para nós quando crianças,mas que entendíamos e carregamos isso até hoje.
Se pararmos para pensar,nossa vida realmente se compara as séries de tv,aos filmes e novelas.Personagens vão e vêm todos os anos,eles chegam,viram nossos amigos,passam por problemas ,e ficam a temporada toda,que seria um ano inteiro nosso,365 capítulos por temporada,com atores indo e vindo e um zilhão de figurantes.E nós,sempre como um núcleo separado,onde ele conseguia avaliar e ser uma espécie de crítico de todos os núcleos,decidindo quem morre,que nasce,quem sobe na vida,que vai para a sarjeta,e assim por diante!

Mas,assim que aconteceu,assim que tudo começou a acontecer durante aquela semana aterrorizante,eu comecei a questionar as coisas.
Minha mãe era uma bela mulher,e em uma semana se tornou uma lunática.
Minha mãe era uma mulher de ótimo humor,e em uma semana se tornou depressiva.
Minha mãe se viu diante do inferno...quase cometeu o pior crime aos olhos divinos.
Minha mãe não merecia aquilo tudo.
Aquilo que começara quando o telefone preso à parede da nossa cozinha de azulejos floridos e brancos,tocou às três da manhã,para dar a pior notícia das nossas vidas.A notícia que uma mulher com uma voz de pronúncia robótica,dizendo que o avião particular em que meu pai voltava para o Rio de Janeiro,havia caído,não restando nenhum sobrevivente entre os vinte tripulantes.
O sorriso que ela carregava todos os dias em seu semblante sumiu no mesmo instante que,imagino eu,escutou que o cara que ela se casara dezesseis anos antes havia morrido,e que ela nem adeus pôde dar.Ela simplesmente largou o telefone e sentou-se no nosso chão de madeira,segurando seu vestido vermelho-tijolo que colocava para dormir.
Então,adormeceu ali,banhada em lágrimas,deitada ao lado do mensageiro da pior notícia de sua vida.
No dia seguinte,eu,meus 3 irmãos e ela viajamos para São Paulo,onde se localizava o corpo do papai.Não conseguimos conter a emoção ao vê-lo deitado imóvel dentro de um caixão fechado,apenas com uma vidro permitindo ver seu rosto.Estava mais velho do que da última vez que o vimos.Mais velho,mas sério,mais triste.Mamãe não soltou do caixão em nenhum momento enquanto voltávamos para o nosso estado.
No cemitério ela também não soltou em momento algum,e em momento algum também,ela falou qualquer coisa.A única coisa que fazia era chorar.Era possível notar seus olhos inchados por detrás dos óculos escuros.Era possível ver seu sofrimento.Uma mulher que perdera seu companheiro.
Me abracei aos meus irmãos.Todas as pessoas vinham nos abraçar,pedindo para sermos fortes.Mas nenhum filho da puta chegou e mandou que cuidássemos da mamãe.Ela era quem precisava de apoio.Estávamos sofrendo,mas ela era quem mais sentia.Passou mais tempo com ele que nós quatro.E ninguém se quer abraçou o caixão junto.Nem sua irmã,que preferiu dar em cima do coveiro bonitão,à ajudar e dar força a própria irmã mais nova.
Não íamos com a cara dela.Acho que nem mamãe ia.Acho que só dava a atenção que dava quando ligava pedindo ajuda em mais uma desilusão amorosa.E a mamãe lá,ajudando,ajudando...ouvindo,ouvindo,
mas na hora que era ao contrário,cadê a vadia?Se escondia,ou estava outra vez,de pernas abertas,numa outra cama,com outro cara que,depois de fazer tudo com ela,daria as costas.
Uma mulher que já fizera seis abortos,dois quando tinha apenas quinze anos.Vadia!Como duas irmãs podem ser tão diferentes?
Enfim...e o inferno começou.
Nessa época,quando papai morreu,eu tinha treze anos,meu irmão Joel doze,Carlos tinha quatorze e Elto,Dezesseis.Todos estudávamos na mesma escola,e,devido a um programa social implantado pela diretora na época,começamos a trabalhar em uma fábrica de tecidos,(papai ficaria feliz ao saber que estávamos na "áerea do pano"...como ele dizia),e,devido a isso,mamãe ficava sozinha de meio dia as dez da noite,já que pegávamos no trabalho de cinco da tarde as nove e meia da noite.Não era fácil.
Sempre que chegávamos do serviço,ou ela dormir,ou estava sentada vendo fotos antigas,sempre vestida com seu vestido vermelho-tijolo,sempre com os olhos inchados e vermelhos,sempre triste e calada.Não tinha mais a animação de sempre.Dava pena de ver a coitadinha chorar pelos cantos.Certa vez,( isso nem contei aos meus irmãos),certa vez,encontrei-a olhando para seu pulso enquanto segurava uma faca.Me escondi atrás da parede que dividia a cozinha da área de serviço,agachei-me atrás da máquina de lavar,de modo que não pudesse ser visto.Ela realmente pretendia se matar!Passou lentamente a faca com a lâmina ao contrário.Um sorriso estranho,assustadoramente calmo e seco,um sorriso que me fez tremer.
Levantei-me e fui abraçá-la.Acho que não entendeu a demonstração de carinho,mas que se dane.Ela precisava de uma abraço naquele momento,só para saber que ainda haviam pessoas que dependiam dela e que davam a ela a importância divina de uma mãe.Algo deveria ser feito.Mas o que?O que poderia fazer nossa mãe mudar?O que poderia fazer nossa mãe abandonar toda aquela tristeza.Tudo bem que era uma morte recente,mas se continuasse daquele jeito,iria morrer,ou entrar numa depressão grave!Precisava pensar em algo,mas,no dia seguinte,uma coisa mudou!
Eu e meu irmão Carlos chegamos mais cedo do trabalho.E não encontramos mamãe em casa.Procuramos em todos os cômodos,mercados do bairro,shopping,ligamos para amigas,para a irmã puta,para toda a agenda telefônica.Ligamos então para nosso outros dois irmãos,e os avisamos.Vinte minutos depois,eles estavam em casa.Ainda com o uniforme da fábrica.
Quando resolvemos esperar alguma notícia antes de contactar a polícia,ou irmos ao IML,ouvimos uma chave sendo colocada na fechadura da porta.Aquele som tão comum,nunca havia sido tão reparado e esperado como naquele dia.E,era ela!Pálida,cansada,e com seus pés sujos de areia.


Entrou em casa e sentou-se no nosso sofá de madeira,onde soltou uma longo suspiro que,até hoje,não sei se foi de alívio ou de dor!
Lembro de suas palavras,do tom melancólico de sua voz rouca,capaz de fazer um urso em pleno verão,dormir,de tão doce que eram as canções de ninar na sua voz.
Ela disse,olhando em meus olhos e segurando meu rosto pelas bochechas:
-Hoje a tarde...-pausou para respirar.-..Hoje a tarde,eu vi...eu vi...
-Viu o que mãe?E onde a senhora estava?-perguntei.
Ela outra vez suspirou e largou minhas bochechas magrelas.
-Eu vi,não sei quem,na porta.Batendo forte,pedindo para abrir...olhei pelo olho mágico...não havia ninguém..só uma voz estranha,sei lá..uma voz que mandou eu ir a praia do Arpoador e sentar-se nas pedras,no...no ponto mais alto...
Olhei para meus irmãos,todos assustados.
Ela continuou,e uma lágrima caiu enquanto falava.
-Eu senti medo..-disse num tom desesperador que fez meu irmão mais velho Elto abaixar a cabeça.-E senti medo como nunca senti.As batidas na porta...Foi como nos filmes de terror.Não havia ninguém...
-Calma mãe!-Pediu Elto abraçando-a e recostando-a em seu peito.-A senhora tá passando por um momento dificil,complicado...as vezes sua imaginação...
-Não...-interrompeu ela,irritada.-Você acha que estou maluca?Eu sei o que vi,e foi tão real quanto vocês aqui!
-Mas o porteiro pode ter visto,vou perguntar a ele.-Disse Carlos.
-Não!Não precisamos de mais gente aqui,atrapalhado e se metendo!-pediu Joel.
Todos nós a abraçamos.Ela,mais confortável,chorou de novo.E,por fim,adormeceu em nossos braços.
Naquela noite,não conseguimos dormir.Até Elto e Joel,que haviam saído a mando do patrão da fábrica o dia todo,e estavam notavelmente cansados,não pregaram os olhos,ambos deitados no chão,aos pés da cama de casal onde mamãe dormia,cercada por nós.
Nunca havia visto uma noite tão longa.

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Correu pela rua como uma louca,e se eu não estivesse lá,não sei qual seria o resultado.
Por sorte,era domingo.Por mais sorte ainda,não quis ir a praia com eles.Apenas fui comprar pão logo cedo,e,de repente,Só escutei alguém berrando meu nome.Ao achar visualmente de onde vinham os gritos,vi uma mulher semi nua,correndo entre os carros.Era minha mãe.
-Filho eles voltaram!Filho!!!-gritava ela!-Eles não querem mais que eu chore!
E quando ela virou-se de costas para onde eu estava,pude ver em seu dorso,uma enorme mancha de sangue escorrendo por suas costas.Sua calcinha se encontrava enxarcada de vermelho.
Corri desesperado em sua direção.E abracei-a.Um policial se aproximou e nos prestou ajuda.
"-..ELES NÃO QUEREM MAIS QUE EU CHORE!",essa frase não saiu da minha cabeça.

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Mais tarde,assim que eles chegaram da praia,aproveitando que mamãe estava no banho,sentei rapidamente para dizer o que havia acontecido.Expliiquei tudo,e que a ferida nas costas,foi causada por um tombo.Segundo escutei ela contando ao médico.Assim que saí,os barulhos voltaram,novamente as batidas violentas na porta,novamente ninguém dava as caras,desta vez ela ainda tomou coragem e abriu a porta.Assim que fechou de novo,contou até dez,e,ao aproximar o rosto do olho-mágico na porta,um vulto preto surgiu de repente e,causou sua queda,arranhando as costas numa cadeira.
Eles ficaram tão assustados quanto eu.Carlos abaixou a cabeça.Elton levantou-se e trouxe água para nós quatro.Joel foi com Carlos buscar água minutos depois.E eu,eu fiquei pensativo,ainda com a frase "-ELES NÃO QUEREM MAIS QUE EU CHORE!"
Carlos sentou-se ao meu lado triste.Vi que estava abalado.
Mamãe saiu do banho.Enrolada em uma toalha foi até a cozinha e pegou um mamão para comer.Deixou a fruta sobre um prato na mesa de centro da sala.E foi vestir-se.Voltou minutos depois,com o vestido vermelho-tijolo,e sentou-se ao meu lado,ainda me oferecendo um pedaço,mas eu,neguei.
Nesta noite,apenas eu não preguei os olhos.Apenas eu que havia visto uma cena tão forte.

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No dia seguinte não fui ao trabalho.Fiquei o tempo todo com ela.Assistimos três filmes seguidos na televisão,dois da nossa coleção de dvds e um na tv por assinatura.Foi um dia comum,mas diferente de todos os últimos.Não houveram batidas assustadoras na porta.

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Certa vez,eu estava na internet lendo algo sobre espíritos,isso muito antes de papai falecer,mas sempre me interessei pelo assunto.Li algo sobre espíritos malignos que vêm ao mundo dos vivos atormentar aqueles que estão tristes.Espíritos que se alimentam de tristeza,e que fazem de tudo para que esta pessoa atormentada se mate.Não costumava a acreditar nessas histórias,mas,devido ao desenrolar das coisas,comecei a crer!
Tive uma conversa rápida com Carlos sobre o assunto.Ele andava muito estranho.Triste.Dos irmãos,ele era com o qual eu tinha mais afinidade,sabe!O meu irmão mesmo.E acho que saber que mamãe podia estar a beira da loucura estava o incomodando,mais que a nós todos.Não mais que a a mim,que presenciei.Mas ele estava abalado.
Carlos tinha um bom coração.Era o mais religioso de nós,mesmo sendo novo,era um cara que era um amor de pessoa.Sempre ali presente...sempre...
Comecei a crer que algo sobrenatural acontecia em nossa casa.
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No meio da semana seguinte,eu pedi licença na fábrica,aleguei problemas familiares.Junto comigo,Elto também pediu.Mamãe não estava mais tendo alucinações.E,cá entre nós,eu estava querendo que ela tivesse apenas uma vez mais,só para eu ver se se tratava mesmo de espíritos malignos...Espíritos que vivem de dor e tristeza.
Certa noite,recebemos um telefonema do nosso chefe.Queria que pelo menos um de nós fôssemos a uma reunião de empregados,para as novas regras da fábrica.Bem,eu logo me ofereci.Precisava sair um pouco daquela casa,tentar esquecer um pouco os problemas diários.Pra você ter uma idéia,eu estava perdendo cabelos devido ao estresse.Isso tava me matando.E eu fui então a reunião.
Lá,enquanto nosso chefe falava,minha cabeça,mesmo que eu não quisesse,minha cabeça estava lá,na mamãe.Será que eles estavam bem com ela?Será que ela estava tranquila?A porra daquela frase não saía da minha cabeça!"ELES NÃO QUEREM QUE EU CHORE MAIS!"...Eles quem?
E o chefe falava sem parar.Poucas coisas eu entendia,poucas coisas se mantinham presas no meu raciocínio.Não via a hora de voltar para casa.Mas,quanto mais necessitamos que o tempo passe rápido,mas lento o puto passa!Como naquela música linda do Claudinho e Buchecha,que ficou ainda mais linda na voz da Adriana Calcanhoto,"Fico assim sem você",que diz em uma parte:" Eu conto as horas pra poder te ver,mas o relógio tá de mal comigo!".O relógio realmente estava de mal comigo.
Mas,depois de um tempo,a reunião acabou e eu peguei um táxi de volta para casa.
Em vinte minutos eu já estava abraçado a ela.E ela me contando suas histórias com o papai.Contou-me de como se conheceram na escola.E de como se odiavam no início.Um história típica de Hollywood,e que eu já havia escutado dezenas de vezes,mas que sempre me cativava e emocionava.Eles eram do grêmio estudantil,e se odiavam,aí,certa vez,ele a viu tocando violão e se apaixonou.Fez de tudo pra conquistá-la,correu atrás,fez música,cantou em público em sua homenagem,acho que ninguém resistiria.Talvez por isso ela sofresse tanto.Um sofrimentoi bonito,de uma mulher que perdera um homem que a conquistava todos os dias,mesmo estando longe.Nós tínhamos que entender seu sofrimento.Mas era dificil vê-la sofrer daquele jeito.O pior,era não poder fazer nada.

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Tivemos que voltar a trabalhar.Meu setor mudara depois da reunião.Fui trabalhar no escritório,digitando relatórios para meu chefe.Quase não via meus irmãos no trabalho.Parecia que eles nem trabalhavam mais lá.Eu entrava mais cedo,e saía mais tarde.Meu salário subiu em dez por cento,o que ajudou muito.Mas estava cansando rápido.Chegava em casa já morto.E só dava tempo de beijar mamãe no rosto e ir dormir,pra,no dia seguinte,acorda cedo e ir trabalhar.
No primeiro dia,quando cheguei todos estavam dormindo.Na mesma cama de casal.Eu sorri.Achei bonita aquela cena,e,como não iria aguentar ter que arrumar uma cama,fui deitar no outro quarto...me arrependo até hoje.
No meio da madrugada,senti algo como um estompido.Sonhava que estava no Maracanã assistindo Flamengo e um outro time que,por incrível que pareça,o presidente Lula,qual eu não via o rosto,também fazia parte.Quando um gol foi marcado,os fogos soaram e aos poucos fui acordando,e notei que os fogos,na verdade,era a porta que tinha batido.Levantei-me e fui tentar abrí-la..sem sucesso,ela estava trancada.Me deseperei.Podia ouvir as batidas na porta lá fora.Batidas violentas,exatamente como ela descrevia.O que quer que fosse,naquela hora,a hipótese de que tudo era alucinação não era mais aceitável.
As batidas continuavam.E eu podia ouvir os gritos da mamãe.
-São eles!São eles!Eu chorei...eles vieram por isso!-gritava.
Do lado de dentro do quarto eu chorava e gritava também.Chamava por meus irmãos,mas,segundo mamãe gritara,eles estavam presos no outro quarto.
-Filho,eles prenderam os outros no quarto..eles não estão me respodendo!-disse ela.
De repente ela gritou agudo,apavorante.Nesse momento,eu pensei em pular pela janela,estava no segundo andar,poderia me machucar,mas salvaria mamãe.
O que ela estava vendo lá fora,depois fui explicado.Mas,nesse momento,eu só chorava,e chutava a porta.Batia,gritava,e puxava a maçaneta com toda minha força.Cheguei a ferir minhas mãos enquanto tentava.
Foi então que houve silêncio.Não havia batidas,não havia choro,não havia gritos.
Senti sono.
Dormi.
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No dia seguinte,todos nós estávamos abalados.
Mamãe finalmente aparentava estar mais calma.
Ela contou tudo o que vira.
Contou que quando olhara pelo olho mágico,pôde ouvir assobios e palmas no corredor do nosso andar.Pôde ver vultos passeando vestindo mantos negros e andando em frente nossa porta.Passeavam rondando,como se esperassem algo.Ou como se tomassem conta.Depois.um desses vultos se aproximou da porta e colou o que seria seu rosto na porta.Segundo mamãe,a sua voz era algo assustador,essas foram as palavras:
-Seu choro nos alimenta enquanto te consomes.Enquanto choras,toda sua vitalidade é consumida.Pare com esse sofrimento e entregue-se a calma eterna.Não lhe deixaremos em paz.Primeiro será você,depois teus filhos,por fim,ninguém mais poderá chorar pelas mortes.Não queremos que chore mais.Não queremos ter que levar você conosco.Mas não está fazendo por onde.
Após ela falar isso,Carlos se levantou parecendo irritado.Deu um soco na parede,olhou para nós com um olhar amedrontador e disse aos outros:
-Não acho isso certo.-Disse saindo de casa batendo a porta de vidro e fazendo estremecer tudo.
Um silêncio tomou conta da sala.Mamãe,estava tranquila.Levantou-se e foi até a mesinanha de centro,pegando o controle prateado da televisão.Ligou em um canal qualquer.
Continuamos em silêncio.Um olhando para a cara do outro.Não podíamos dizer que ela estava delirando,pois também escutamos.Mas era dificil acreditar.Como algo que só estamos acostumados a ver em filmes de terror de sábado a noite,acontece na nossa própria casa,com um de nossos parentes mais queridos.Nossa mãe,cara.
Levantei-me e fui até a cozinha.Abri a geladeira,peguei uma garrafa d'água e fui beber no gargalo mesmo,enquanto olhava pela janela.Escutei mamãe sorrindo lá na sala.

Um sorriso involuntário saiu de minha boca.Era bom poder vê-la sorrindo.
Perdi meu olhar em um ponto qualquer,mas logo voltei a si,ao ver Carlos sentado sob uma árvore,pensativo.
Desci correndo e,sentei ao seu lado,para a que seria nossa última conversa.

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-FIM DO DEPOIMENTO DE DIEGO LUCIANO OLIVEIRA.-

Declaro aqui que o menor Diego Luciano Oliveira culpado pelo assassinato de seus irmãos Carlos Luciano Oliveira,Elto Luciano Oliveira & Joel Luciano Oliveira há 2 anos.O menor alega-se culpado,mas sob a desculpa de que estava se vingando do que os irmãos haviam feito durante a primeira semana de maio do ano de dois mil e sete,como já citado,dois anos atrás.
O menor afirma que seus irmãos,agiram juntos,de má fé,afim de fazer com que sua mãe,Letícia Bastos Oliveira,parasse de sofrer com a morte do pai dos quatro citados.
Diego afirma que seus irmãos utilizaram de terror para amedrontar a mãe,usando fantasias encontradas na sala do zelador do prédio desativada desde o início do ano de dois mil e dois,fantasias quais o trio se fazia passar por espíritos ruins que se alimentavam de tristeza e dor.Diego diz ainda que só tomou tal atitude,após seu irmão Carlos,arrependido de sua atitude,ter lhe confessado como agiram,e que no início,não sabia,mas fora convencido por seu irmão mais velho Elto,este,deixamos de passagem,com a morte mais cruel,sendo carbonizado dentro do forno de sua casa.
Em sua confissão,Diego não se demonstrou arrependido em momento algum,e diz que só se lamenta ter assassinado Carlos.
Abaixo,alguns detalhe da parte mais relevante de sua confissão:
"Eles esperavam eu sair ou dormir para agir.Não iam mais trabalhar.Não iam mais ao lugares que eu ia,nem a praia eles foram quando disseram que haviam ido,só para poderem agir.Na noite em que fiquei preso no quarto,eles estavam agindo.Eles me trancaram.Não acredito que puderam fazer isso com a própria mãe?Não acredito.Precisavam ver suas caras.Elto foi quem começou tudo.Sua morte demorou.Meti sua cabeça dentro do forno.Eu estava tomado por um ódio horrível.Estava fora de si.Carlos eu matei com uma tesourada na nuca.Primeiro ganhei sua confiança,e,quando vi o momento certo,o desmaiei e amarrei-o.Obriguei a ver todos morrerem.Peguei todos enquanto dormiam.Com meu salário,antes de começar a matança,e já com todos amarrados e amordaçados,eu levei minha mãe para um spa.Ela não poderia ver aquilo tudo.Mas eles sim.Matei sim.Mas matei por minha mãe.É inaceitável.Todos falsos.Até a tia puta era mais sincera,pois pelo menos era esnobe.Queria fazê-la parar de sofrer na base do medo.O Joel matei sufocado com uma das mantas pretas.
Não somos mais Os quatro,como mamãe nos chamavam.Nem sei mais como ela vai nos chamar.Mas hoje,aqui,acho que cumpri a tarefa de fazê-la parar de chorar."

O menor será encaminhado para um reformatório,onde aguardará a maioridade penal para ser então,julgado.

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E nunca mais ela chorou,pois,na noite em que voltara para casa,teve a impressão de batidas na porta,sem nunca saber,que as batidas,vinham de dentro.
Para ela,seus filhos apenas haviam viajado.
Sua felicidade se mantinha nas fotos dos quatro.

FIM
Fael Velloso
Enviado por Fael Velloso em 11/05/2007
Reeditado em 24/05/2009
Código do texto: T482839
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