AMOR ALÉM DA VIDA

“A polícia acaba de identificar o corpo encontrado num terreno baldio na região da Lapa...”

Desligo a TV.

Os restos do nosso jantar no prato começava a cheirar coisa morta. Tento mergulhar nos seus olhos, mas ela se esquiva.

-Deixa que eu lavo a louça. Está tarde. Você deve estar com sono - ela diz, evitando minhas órbitas arregaladas.

-Não tenho sono - digo tornando-me frio.

-Minha culpa?

-Não durmo nunca.

A mulher lava as louças e talheres. A água da torneira ressona.

-Sofre de insônia?

-Não sofro - digo que o fato de não poder dormir não me apetece. O que não é totalmente verdade.

Depois de lavar os pratos, ela se enxuga e diz que vai dormir no sofá. Ofereço-lhe a minha cama e ela pergunta por que um cara que nunca dorme tem uma cama. Não sei responder.

Como também não sei responder por que estou abrigando essa estranha, depois dela bater na minha porta assustada dizendo ter cometido um crime, que, por ocasião, ainda não quis me contar.