VEXAME
Todos riram. As gargalhadas tomaram conta do recinto, era um escancarar de mandíbulas, nos rostos os músculos contraídos o amedrontavam, não pareciam pessoas, assemelhavam-se a animais vindos de outros planetas, eram bizarros, seus olhos alternavam momentos em que estavam quase fechados com outros em que quase saltavam esbugalhados dos canais orbiculares, dado ao tamanho desproporcionado do escárnio, ele sentiu o sangue inflamar-lhe as veias, todos riam dele, suas bochechas ficaram intumescidas e avermelhadas como se fossem acometidas por venenosas picadas de marimbondos, mas todos gargalhavam dele. Sentiu o peito lhe escapar de dentro da blusa, os botões se abrindo, era um peso terrível entre o gradil costal do tórax! Não podia agüentar tamanho vexame! E todos gargalhavam e riam e zombavam dele! Foi então que de súbito num crescente, aos sentir a pele arder e arder e queimar e quando não podia mais agüentar entreabriu os dentes e uma espuma asquerosa foi tomando conta da boca e escapando entre os lábios até que um grito rouco se fez ouvir mais sombrio que os risos desenfreados daquela gente e ele caiu paralisado sobre o tapete vermelho de veludo. Um silêncio moribundo desabou junto com ele. Todos que antes se regozijavam felizes e debochados, agora tensos com o horror da cena fúnebre, estupefatos, não reagiam nem mencionavam um pio sequer, seus olhos eram repletos de dúvidas sobre o que fazer, olhavam-se entre si como se não ousassem comentar, criticar ou tomar qualquer providência, talvez se culpassem, ou eximissem-se da culpa, ou simplesmente estavam chocados com o desfecho daquela situação vexatória. O fato é que nada fizeram, foram saindo de um a um, silenciosamente, até que uma criança timidamente em sua inocência infantil tendo a mão unida a da mãe ao passar pelo corpo caído pergunta: - Mamãe ele está morto? Ao que a mãe sinaliza fazendo um biquinho selado com o dedo indicador sobre os lábios para depois responder docemente como quem fala tentando não incomodar ou quebrar o silencio no salão, quase num sussurro: - Não filhinha, ele está dormindo. Para logo depois desaparecerem pela porta que seria trancada por fora com um pesado cadeado laçando grossas correntes que estridentes ecoaram por todo aquele lugar de forma que o homem ao perceber que já estava só e livre de toda aquela gente em seu íntimo aliviado pensou: – Melhor que morrer é se fingir de morto...
TRIMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM
Eram seis da manhã, o despertador como quem beija lhe despertava mais uma vez daquele pesadelo reincidente.
CRISTIANA MOURA