DO OUTRO LADO
Perplexo e um tanto curioso, eu me encontrava no interior da sala de uma casa bastante simples; o chão era batido, as paredes eram rebocadas com barro, o teto era de palhas e pelo aspecto de minúsculos desenhos parecia ter sido entranhado a mão. Pontas de varas amarradas com embiras expunham-se pelos ângulos das paredes, algumas serviam de armadores para belíssimos artefatos tecidos em sisal ou tucum; não sei! Raios de luz entrecortavam as lacunas formando coágulos de sol espalhando-se pelo chão. Na entrada da porta do lado esquerdo na parte superior, havia outros utensílios dependurados como: besta, celas, cintos de couro, cangalhas, grajaus, e até um surrão velho com um buraco no canto.
Eu estava sentado em um cepo apoiado por duas forquilhas, de certo, era o único assento da casa, eu olhava atentamente para os cururus debaixo do banco. Provavelmente eles contemplavam a umidade deixada pelos potes. A sensação era bastante desagradável, eu estava um tanto temeroso, inerte, o silêncio no interior da casa era total e lôbrego; não havia barulho ou qualquer ruído de insetos ou animais. Tive a impressão incomensuravelmente grande de que tinha alguém sentado ao meu lado encostando seu rosto sobre meu ombro direito; mas quem poderia ser? De repente, olhando para a porta que dava acesso a cozinha observei uma moça que caminhava em minha direção trazendo nas mãos um recipiente marrom provavelmente um coité contendo bolinhas brancas, talvez fossem pães de queijo, não sei! Ela parou, colocou o recipiente sobre o fogão a lenha e sem falar nada, adentrou por um vão desaparecendo por entre as palhas. Levantei-me e caminhei em direção à porta, passei pela cozinha e finalmente saí pelo terreiro caminhando por uma vereda em meio às árvores e arbustos, saindo por uma rua estreita, continuei a caminhar.
Era uma cidade pequena e arborizada, com casas totalmente diferentes, não existia ninguém nas ruas ou qualquer movimento de carros, aves ou animais. “Em meu sonho”, algo muito estranho parecia estar acontecendo. As ruas não eram pavimentadas e acabara de chover, lembro-me ainda, de ter atolado os pés até a altura dos tornozelos, minha intuição dizia que alguém seguia meus passos, mas quem poderia ser? Todavia, eu não olhei para trás e simplesmente continuei andando por uma rua bastante declive, até que em fim! Do lado esquerdo sobre a calçada estava um homem velho de cabelos e barba branca, balbuciou algo sobre a chuva e alguma coisa mais. Sinceramente, não entendi, porém, não olhei para o lado e continuei. Ao longo, ouvi barulho de cachoeiras, cascatas ou talvez, a desembocadura de um rio, existiam morros e matas verdes, o arrebol foi o mais deslumbrante que meus olhos já viram, por sobre os morros e montes a refração da luz desfiava raios os enfeitando como se fossem mantos de ouro. “Era simplesmente um lugar muito bonito onde na realidade eu jamais estive!” Senão em sonhos, incrível! Parecia real. Mas que cidade era aquela? E porque eu caminhava solitário como se estivesse à procura de algo? Como se não bastasse, mais adiante avistei uma charrete branca modelo bem antiga debaixo de um pé de algaroba defronte para uma casinha bastante humilde, pensei rapidamente, eu já possuí uma dessas. A casa tinha dois batentes uma porta e apenas uma janela do lado direito, a frente era pintada de branco e cheio de nódoas amareladas pelo tempo. Do lado esquerdo uma cerca de arames caído, no terreiro, havia muito mato um pé de juá e outras árvores, um galamarte velho que há muitos anos ninguém nele se divertia. Andando debaixo da árvore a qual eu não conhecia seus frutos, esbocei um sorriso tímido! Alegria enorme! Foi como se naquele local tivéssemos alguma coisa em comum. Mas o que eu estava fazendo lá? Que lugar era aquele? Nalgum dia teria sido aquela a minha casa? Ou porventura a casa que outrora estive no interior d’ela. Não sei!
(TEXTO: MOURÃO, Francisco das Chagas Esmeraldo. Brasília, julho de 2013).
As palavras do texto aqui narradas foram dedicadas especialmente a minha filha Victória Holanda. (Foi apenas um sonho).