Uma luz no nevoeiro

George Luiz - Uma luz no nevoeiro

Era uma noite chuvosa. O carro avançava lentamente dentro do nevoeiro espesso. Numa curva mais fechada da estrada, o motorista pôs a cabeça para fora, tentando enxergar melhor. Ao longe, um pequeno ponto de luz indicava o seu destino. A seu lado a mulher, jovem e bonita, fumava indiferente um cigarro.

- Se incomoda de parar de fumar um pouco, querida ? Já está difícil enxergar alguma coisa com esse nevoeiro.

Ela apagou o cigarro no cinzeiro do console.

- Ainda estamos muito longe ?

- Quase nada, mais uns dez minutos.

- Que noite horrível para se sair de casa...

- Também acho. Mas você sabe, não podíamos deixar de vir.

- Você, não podia deixar de vir. Eu só vou fazer figuração.

- Não fale assim. Você é importante socialmente para mim.

- Quer dizer para seus negócios ambíguos, não é ? tem que levar sua bone-quinha de luxo com você para distrair a atenção de seus parceiros.

- Você é muito mais que uma bonequinha de luxo para mim. E meus nego-cios não são ambíguos.

- Sei. São transparentes como o cristal dos cálices em que vamos beber vinho daqui a pouco.

- Você fala sem pensar, querida. Quando foi que você já viu meu nome em algum jornal ou canal de televisão ligado a algum escândalo ?

- É você é muito cuidadoso, assim como seus sócios.

- Olhe, estamos chegando.

A grande casa de dois andares ficava bastante oculta pela vegetação maciça. Tinha as fachadas de tijolos expostos, que, naquela pouca luminosidade, assumiam um tom pardacento. As janelas, de vidraças em guilhotina eram pintadas de verde . O terraço da frente era revestido de mármore escuro e apenas dois postes, com lanternas, iluminavam a entrada social com sua porta de carvalho maciço. Uma aldrava de metal dourado era o único enfeite que quebrava sua severidade.

Como surgido do nada, um empregado se adiantou em direção ao carro.

- Boa noite, doutor Cesar, boa noite, senhora.

- Ah, boa noite, Alfredo. Noite terrível, não ?

- Sem dúvida. Pode deixar que eu guardo o carro na garagem para o senhor.Aí vem Marta com um guarda-chuva grande.

Uma mulher de meia idade de vestido azul marinho, gola e punhos brancos, chegou até eles com um grande guarda-chuva do tipo usado em campos de golfe. Sua fisionomia austera, adequava-se bem à sua função de governanta da mansão.

- Boa noite, doutor, boa noite senhora. Venham comigo, por favor. O Pro-fessor os espera.

No grande living, uma figura magra, esfregava as mãos em frente à lareira acesa. Vestia uma espécie de quimono oriental que lhe chegava até os tor-nozelos e calçava curiosos chinelos de veludo bordado. Voltou-se ao percebe-los. Mas não estava sozinho. Instaladas em confortáveis poltronas e sofás, algumas pessoas bebiam e conversavam em voz baixa, todos homens. Numa saleta vizinha, três mulheres sofisticadas degustavam salgadinhos quentes e canapés delicados, enquanto bebericavam seus drinques. Sobre a lareira, um grande quadro a óleo, representando uma cena tipicamente inglesa de caçada contrastava com vários nus, de tendência bem mais moderna, alguns deles carregados de um erotismo de gosto duvidoso.

- Como está, Teresa ? Bom vocês terem chegado,César.O que querem beber ? Já conhecem todos aqui,o que elimina a necessidade de apresentações. Marta, veja o que o doutor e sua mulher querem beber.

Vinte minutos mais tarde, o Professor e seus sócios passaram ao amplo escri-tório e iniciaram sua conversa de negócios. Discutiam um projeto a ser iniciado.

- Estou lhe afirmando, Professor. Esse seu projeto vai derrubar toda a concorrência nessa área, nenhum de nós tem dúvida disso. A questão é, como vamos implementa-lo ?

- Acho que o Professor já nos expôs bem os detalhes, Augusto. Temos que escolher apenas a data para por o nosso plano em ação.

- Mas isso também já foi resolvido. Começaremos a ,montar nosso esquema logo no início da próxima semana.

- Isso mesmo, Toni.

O Professor ouvia tranqüilo seus parceiros. De repente voltou-se para César.

- Você está mudo como um peixe, doutor. Não vai nos dar sua opinião ?

- Acho que minha posição quanto a este projeto não vai lhe agradar muito, Professor.

- Não ? E por que ?

- Porque me oponho taxativamente a ele. E além disso, se eu participasse, colocaria em grande risco, minha reputação, caso o plano falhasse.

- Mas não há possibilidade de falhas !

- Espere, Augusto, deixe o doutor justificar seu argumento.

- Por mais perfeito que possa ser, um projeto como esse tem uma possibili-dade, mesmo pequena de falhar e eu, repito, não quero correr esse risco.

- Então ?

- Então estou fora dele. Faz quase dez anos que trabalhamos juntos. Creio que sempre dei o melhor de minha capacidade à nossa organização. Acho mais, que mesmo não participando desse projeto específico, ele não correr-rá qualquer risco de vazamento através de mim. Sempre fui e continuarei a ser de uma discrição absoluta quanto a nossas empreitadas.

- Claro, César,ninguém aqui ousaria por sua fidelidade e discrição em dúvida. Estou certo de que nossa confiança em você é unânime. Eu, e todos nós, tenho certeza, apenas sentiremos sua falta nesse projeto. Mas, outros virão e você brilhará, como sempre, participando deles.

- Obrigado, Professor.

- E agora, senhores, vamos jantar ? Acho que ouvi os passos de Marta,

chegando aqui para nos avisar que está servido.

O jantar foi impecável, como sempre acontecia naquela casa. Conversou-se pouco à mesa. Teresa observava volta e meia seu marido. Ele parecia um pouco tenso.

A sobremesa, o café e os licores foram servidos e devidamente apreciados. O Professor sugeriu que não saíssem com aquele tempo, que pernoitassem na mansão, mas com exceção de Toni e sua mulher, todos recusaram o convite.

As onze e meia da noite, César e Teresa partiram.

O tempo continuava ruim, mas o nevoeiro em si tinha melhorado.

- Me diz logo o que houve, César. Você estava tenso o jantar inteiro.

- Nada, querida, está tudo bem.

- Como se eu não conhecesse você. Aconteceu alguma coisa errada na reunião de vocês.

- Nada de errado, Teresa, fique tranqüila.

- Se você não quer me dizer, não vou insistir.

O carro ganhou velocidade.

- Por que você está correndo assim ? O piso está molhado. Diminua !

- Não consigo ! O freio parece que está com algum problema.

- César ! Olhe essa curva !

César apertou o pedal inutilmente, tentou o freio de mão. Era tarde. Com um horrível barulho de lataria e vidros quebrados, o carro ultrapassou o meio fio e bateu com violência numa árvore.

César sobreviveu ao impacto. Internado na UTI de um hospital particular, debatia-se entre os dedos enregelados da morte. Teresa, teve mais sorte. Com exceção de uma clavícula fraturada, passava bem. César faleceu vinte e poucas horas depois.

No velório e depois no funeral, seus parentes e amigos estavam inconforma-dos.

- Um carro com menos de dois mil quilômetros rodados ! Uma falha dessas é praticamente impossível.

- O que diz a perícia ?

- Perícia ? Quem pode confiar nela ?

- Pssst, Teresa está chegando .

- Pobrezinha, parece em estado de choque...

Três dias depois, a perícia ficou pronta. O laudo foi inconclusivo. O defeito tanto poderia ser uma falha de fabricação, como ter sido provocado por agentes externos. Constatou-se também uma velocidade excessiva para as condições da estrada e do tempo no momento do acidente.

Havia duas coisas que o delegado Afrânio Moreira detestava: comida morna e cerveja insuficientemente gelada.

- Francamente, Gonçalves ! Por que você insiste em mandar vir meu almoço desse restaurante horroroso ?

- Mas doutor ! Foi o senhor mesmo que deu suas ordens nesse sentido..

- Ordens ,ordens....Onde está seu critério avaliativo ? Não percebeu logo que a cerveja não estava como eu gosto ? E essa comida execrável ? Morna ! Morna como a água para um banho de bebê no verão.

Riu-se o detetive Gonçalves. Conhecia bem seu chefe, com quem trabalhava há mais de dois anos. Sabia de suas manias, mas também de sua grande in-teligência e capacidade profissional. E de sua bondade, por trás daquele jeito quase agressivo.

- Deixe comigo, doutor. Vou mandar seu almoço de volta ao restaurante e exigir que eles o devolvam bem quente para o senhor.

- Faça isso. Escute, estou esperando uma senhora as duas horas. Parece que é uma recomendada do próprio Secretário. Assim que ela chegar, traga-a aqui.

As duas horas, Gonçalves entrou no gabinete do seu chefe.

- A sua visita chegou, chefe. Minha nossa ! Deve ter apanhado muito do marido. Está cheia de hematomas no rosto. E um dos seus braços está numa tipóia.

- Vamos, em vez de chegar a conclusões erradas, faça com que ela entre.

Teresa olhou o delegado Afrânio com curiosidade. O amigo que o recomenda-ra a ela tinha lhe assegurado que ninguém tinha a inteligência e sagacidade necessárias para desvendar um crime de morte iguais as dele.

- Por favor, sente-se, senhora. Posso lhe oferecer um refrigerante, um café, uma água gelada ?

- Obrigada, delegado, não vou tomar muito do seu tempo.

- Mas eu estou aqui para isso. Para ouvir e tentar ajudar. Um minuto . Gonçalves ! Saia de trás dessa porta e venha ouvir o que a senhora tem a dizer. É um bom detetive mas um bisbilhoteiro....não repare. Bem ,conte-me o que aconteceu exatamente e do que suspeita ?

- Olhe, doutor. O que ocorreu já foi classificado pela polícia como um acidente.

- Mas a senhora discorda. E por que ? Vamos , conte-me tudo.

Teresa relatou tudo o que tinha acontecido, desde o início. Falou com natural emoção e tensão nervosa.

- Muito bem. Seu relato foi claro e detalhado. Agora me diga, quais são as razões, e não precisam ser lógicas, que a levam a suspeitar de um crime de morte ?

- Ele saiu muito tenso da reunião, o César. Alguma coisa se passou dentro daquele escritório, mas ele não quis me dizer o que foi.

- Então, devemos pensar, que o nosso suspeito principal é o chamado Professor...

- O senhor sabe que eu não deveria falar assim, mas acho que ele mandou matar o meu marido.

- Claro que deve falar o que pensa e sente. E o crime teria sido sabotar os freios do carro de vocês...

- Durante o jantar, doutor Afrânio, houve um momento em que o Professor saiu da sala e só voltou uns dez minutos depois.

- Ouviu isso, Gonçalves ? E nessa saida ele teria mandado um empregado mexer nos freios ? É possível.

- Seria o motorista, o encarregado dos carros dele, chefe ?

- Isso, Gonçalves. Mas, continue dona Teresa.

- Sei que é horrível acusar alguém sem provas, mas aquele homem é um demônio, doutor. Eu conversei com a mulher de um dos sócios dele , ela é quase uma amiga minha, e perguntei se o marido dela tinha lhe contado o que se passou na reunião.

- E ?

- Ela me disse que tudo tinha transcorrido normalmente, mas que o César tinha dito que não iria participar do projeto que eles estavam discutindo.

- Ótimo, ela foi indiscreta . Sabe que projeto era esse ?

- Ah, doutor, não sei. Olhe, tenho que lhe contar uma coisa.

- Conte, por favor.

- O César era um engenheiro muito competente. Tinha uma ótima situação econômica, Mas era muito ambicioso. Ligou-se a esse grupo, além de trabalhar como diretor técnico de uma grande empresa. Eu detestava vê-lo metido com essa gente. Eles me causavam arrepios.

- Sensibilidade, intuição feminina. Está vendo, Gonçalves ? Essas qualidades podem ser muito importantes num caso desses.

- Também acho, doutor.

- Você não acha nada, Gonçalves, vamos ouvir mais o que a senhora tem a nos dizer.

- Acho que não tenho muito mais a dizer, doutor Afrânio.

- Tudo bem. Deixe que eu lhe explique uma coisa.

- Me explique por favor, doutor.

- Veja só. Na investigação das causas de um fato, além das provas, indícios, detalhes do que ocorreu, eu sempre levo muito em conta o fator humano. Não me pergunte por que, mas sinto que a senhora tem razão para suspei-tar desse Professor. Até porque há bastante tempo a polícia federal vem de olho nele,e, me desculpe, no seu grupo. Não se ofenda.

- Não me ofendo, doutor Afrânio. Meu pobre César está morto e o que eu quero é que se esse homem for o culpado ,que ele seja preso, pague pelo que fez.

- Claro. Mas, repare. Temos que trabalhar sem quaisquer provas. O que temos é apenas, a sua suspeita, dona Teresa, aliás a senhora tem mais que uma suspeita,tem uma convicção.

- E o que o senhor vai poder fazer ?

- Ah, vou ter que agir muito sutilmente, e o Gonçalves aqui, vai me ajudar nisso. Temos que investigar, sem que percebam, os empregados da casa. Especialmente o que lida com os carros. Vamos fazer uma coisa. Não comente mais, com ninguém, suas suspeitas. Finja que se conformou com o laudo da perícia, com a versão oficial. Eu ficarei em contato com a senhora e lhe informarei sobre tudo que eu conseguir. E me deseje boa sorte.

Teresa retirou-se. A tardinha descia sobre o prédio um tanto antigo da dele-gacia de homicídios. Lá dentro, o delegado Afrânio conversava com o dete-tive Gonçalves.

- Então, doutor ? vai me explicar como vou participar desse seu plano ?

- Claro, Gonçalves. Vamos usar essa sua pinta de galã de novela mexicana.

- Como assim doutor ?

- Há duas empregadas jovens na mansão do Professor, segundo me infor-mou a senhora Teresa. Você vai namorar uma delas.

- Eu, doutor ? Não me peça isso.

- Não estou pedindo, estou mandando. Preciso ter informações bem preci-sas sobre o que acontece na casa e como. E você vai obtê-las para mim através de sua nova namoradinha.

- Doutor, se a Ritinha ouve dizer que eu estou namorando alguém, me esfola vivo.

- Que bobagem...a Ritinha vai é ferver você num caldeirão com um bom azeite italiano. Vá ! Vá para casa e escolha uma roupa esporte, bem colorida, amanhã começa sua missão especial.

- Doutor...

- Ah, não se esqueça daquele perfume detestável que você usa de vez em quando.

Passaram-se três semanas. Gonçalves finalmente estava namorando a arrumadeira da mansão. Numa quarta feira, ele entrou animado na sala de Afrânio.

- Doutor ! Descobri uma coisa chocante !

- Chocante, é ? Vá contando logo.

- O Professor, doutor, é homossexual !

- Gonçalves ! estamos em 2005 e você vem me dizer que isso é uma descoberta chocante ?

- Espere aí, doutor, o melhor vem agora ! O homem tem um caso com o próprio motorista dele !

- Ah, isso já é bem melhor. Com o próprio motorista, então. Será que alguém mais sabe disso ?

- Acho que não, doutor, a Vanda descobriu por acaso e me jurou que não contou para ninguém , além de mim.

- Que interessante, ela contou mais alguma coisa ?

- Bem, ela me disse que esse tal Alfredo, o motorista, sai muito bem vestido nos dias de folga e que já viajou para Búzios, algumas vezes com o patrão.

- Observadora, sua namoradinha...

- Pára com isso, doutor. Estou fazendo tudo isso por ordem do senhor. Já lhe falei do ciúme que a Ritinha tem por mim....

- Bem, continue a namorar a sua arrumadeira e tente tirar dela todas as informações possíveis sobre esse caso do Professor com o motorista.

A noite descera novamente sobre a mansão do Professor. Em sua suíte, ele preparou-se para guardar alguns documentos em seu cofre. Abriu a porta do móvel embutido na parede. Curioso...a lâmpada interna que se acendia automaticamente parecia estar queimada. Ele pegou sua lanterna no armário embutido e iluminou intensamente o interior do cofre. Quase soltou um grito Os dólares, os trezentos e oitenta mil dólares guardados ali, tinham desapa-recido .

O Propfessor recobrou-se e chamou a governanta..

- Me diga uma coisa, Marta. Você viu alguém andando por perto do meu quarto hoje, durante o dia ?

- A arrumadeira, com certeza, Professor. Pela manhã arrumou sua suíte.

- Sim, mas e além dela ?

Marta pareceu embaraçada.

- Fale, Marta, não tenha receio.

- Bem, Professor, hoje o senhor saiu sem carro, de carona com seu amigo, Toni, não foi ?

- Sim foi, e daí ?

- Olhe, Professor, posso estar enganada...

- Vamos, Marta, fale logo. O que está esperando ?

- O Alfredo, Professor, vi ele subindo aqui para o segundo andar, logo após o almoço.

- O Alfredo, então...tudo bem, Marta, pode ir.

O Professor lutou para conservar a calma. Aquele desgraçado ! Estava tendo um vidão graças a ele, seu patrão. E agora mordia a mão que o alimentava tão bem. Gentalha ! Não adiantava ser amigo de gentalha ! Deixara o miserável dormir com ele na mesma cama. Dera-lhe tudo e pretendia dar-lhe ainda mais ! Ah, mas ele pagaria por aquilo ! Pior que não podia procurar a polícia sem despeitar alguma suspeita. Estava com o rabo preso !

Pela manhã, bem cedo, o Professor perguntou, em vão pelo seu motorista. Informaram-lhe seus empregados, que ele ainda não retornara, após sua folga semanal. Não, não levara sua mala ou um embrulho qualquer. Apenas a pequena bolsa de nylon com que costumava sair. A bolsa ! Claro ! Ele carregara os dólares nela...Esperou até as sete e meia. Por fim decidiu-se. Toni ! Tinha que procurar Toni, o sócio de passado mais tortuoso, mais vio-lento que tinha. Entrou na garagem. Gregório, seu empregado mais antigo veio falar com ele.

- Vai dirigir com esse tempo horrível, Professor ? Não quer que eu chame um táxi pelo telefone ?

- Tenho que ir, Gregório.

- Com esse nevoeiro e o horário de verão, o dia está muito escuro. Não quer esperar um pouco ?

- Obrigado pela sua preocupação, mas tenho que ir agora.

O motor da Mercedes bem cuidada ronronou suavemente. O carro começou a percorrer a estrada. As luzes da casa, sob o intenso nevoeiro, ficaram para trás. O Professor diminuiu a marcha, ia começar a entrar no trecho em declive. De repente, uma idéia terrível surgiu em sua mente. E se Alfredo...Não ! Era absurdo ! O luxuoso carro chegou na entrada da curva e o Professor pisou instintivamente no freio. Nada ! Ele gritou apavorado. Torceu o volante para a esquerda, Com assombrosa facilidade, o belo Mercedes subiu na mureta, já na contramão e com grande velocidade despencou no abismo.

O delegado Afrânio Moreira saboreava com prazer sua cerveja bem gelada. Sentava-se confortavelmente numa das poltronas do living de Teresa Alves.

- Pois é, dona Teresa. Nem sempre conseguimos sucesso em nossos casos, mas esta vez parece que o próprio criminoso resolveu nos dar uma ajuda.

- Que coisa horrível, não é, delegado ? O Professor foi vítima do seu próprio cúmplice, foi assassinado por ele.

- Com certeza. E finalmente a perícia acertou em suas conclusões. O exame indicou uma ação deliberadamente criminosa do motorista sobre o sistema de freios da Mercedes.

- E esse Alfredo ?

- Não se preocupe, vamos pegá-lo numa questão de dois ou três dias no máximo. Já temos uma ótima pista sobre o seu paradeiro.

- Ah, que bom ! Então ele vai pagar pelos seus dois assassinatos.

- Isso mesmo ! Que cerveja deliciosa !

O detetive Gonçalves entrou na sala de seu chefe.

- Olha aí, doutor Afrânio, o que a dona Teresa lhe mandou.

- E o que é isso, Gonçalves ?

- Um microondas, doutor. Ela o deixou aqui há pouco. Disse-me que não quer que o senhor coma seu almoço frio, nunca mais. Ora, doutor, o senhor ficou vermelho !Fale a verdade,chefe, o senhor está namorando essa moça?

- Passe fora daqui, Gonçalves. Ou quer que eu telefone para a sua Ritinha e lhe conte sobre seu namoro com a arrumadeira da casa do Professor ?

Perto da mansão de onde se originaram os dois crimes, o nevoeiro cobria outra vez a estrada. Apenas uma luz, no segundo andar da casa, piscava trêmula dentro da noite.

George Luiz
Enviado por George Luiz em 02/04/2007
Código do texto: T435220