• LILITH: ANJO DA LÚXURIA ¹

[...] Aquela criatura saltou sobre a mesa da biblioteca, aquele cheiro de livros, toda aquela penumbra, e aquele olhar, que parecia haver trespassado o limite entre realidade e fantasia. Procurei fugir entre as prateleiras, mas podia sentir aquela aproximação silenciosa, decidida em tomar e possuir aquilo que queria, pude ouvir um murmúrio como um cântico sombrio, ecoar entre aquele labirinto de livros, senti um calafrio, não era medo.

Pude ouvir as janelas sendo açoitadas por rajadas incessantes de vento, e apressava em manter distancia daquela criatura, que possuindo formas femininas, poderia atrair uma incauta e inocente vitima, mas eu sabia do que era capaz, conhecia todo poder que exercia sobre suas vitimas, que escolhia, não como uma forma aleatória, mas algo que pudesse desafiar sua força natural, aquela herdada do encontro sombrio entre a noite mais escura e o dia mais claro. Persisti em minha fuga alucinada lembrando do que havia feito, antes daquele encontro.

Havia escolhido entre tantos exemplares da biblioteca um livro especial, conhecido como Domo Negro, um manual de magia, que continha cânticos e rituais, e ao abrir em uma das páginas, ao ler a inscrição, não poderia imaginar que aconteceria em seguida. Em noites sucessivas, era acometido por um mesmo sonho, uma bela jovem, de olhos enigmáticos e profundos, com traços delicados, surgia envolta em uma brisa serena, que perfumava todo ambiente com um aroma de canela, dançava olhando para mim, com um certo fascínio, um olhar desafiador e insinuante, como quisesse conduzir a um jogo de sedução.

Por varias noites, aquele sonho persistiu até que em uma noite, fui acordado por um movimento em meu quarto, em meio as sombras, surgiu aquela criatura, com silhueta voluptuosa, de traços finos, no olhar uma ânsia avassaladora, que fez com que sentisse como pudesse adentrar minha pele, apenas e somente olhando diretamente para mim. Sentada sobre a escrivaninha, ficou olhando, sorria maliciosamente, por vezes afastava os cabelos em um tom de castanho avermelhado, e fazia um ruído, como murmurasse palavras, incompreensíveis e inaudíveis, mas que pareceu um cântico rústico. Por ser quase de manhã, com a primeira claridade, desapareceu fazendo da penumbra, um portal entre a realidade e a fantasia, ou seria um pesadelo do qual iria acordar.

Na noite seguinte, aquela criatura surgiu, parecia ainda mais atraente e sedutora, permaneceu quieta, apenas observando, por vezes, podia vislumbrar apenas a silhueta imersa nas sombras, parecia querer provocar, movimentando o corpo sinuosamente em minha direção, permitindo vislumbrar o decote generoso, e sorria maliciosamente, como soubesse que atraia minha atenção irrestrita, ao amanhecer, desapareceu como na noite anterior, mas pude sentir a fragrância de canela no ambiente.

Na terceira noite, ao mencionar o ocorrido para um professor de teologia, fui orientado a procurar literatura sobrenatural, porque certamente aquela criatura estaria presa entre a realidade e o mundo das sombras, não poderia partir, sem que pudesse levar junto dela, uma marca da realidade, e talvez houvesse sido escolhido entre tantos, poderia ser uma salvação ou maldição. Fui orientado a não manter uma relação muito longa com aquele ser, porque poderia ficar aprisionado entre duas realidades distintas, em um labirinto de prazer e dor, submissão e rendição. No momento presente, tentava escapar, mas aquela criatura, fazia sentir sua presença, aquele aroma de canela, os passos rápidos, e os murmúrios. Havia recitado um dos cânticos em voz baixa, e de repente, as luzes do ambiente começaram a piscar, e como estava sozinho naquele ambiente, imaginei ser um curto circuito pelo prédio ser antigo, mas de repente, senti uma brisa, acompanhada do aroma de canela, e indaguei:

- Quem está ai?

As janelas começaram a abrir com rajadas de vento, e podia ouvir passos, mas não podia ver quem era, apenas uma silhueta formada em meio as sombras, com movimentos sinuosos e lentos, como estivesse dançando, ouvindo uma melodia que apenas seu corpo podia sentir. Senti um arrepio, e indaguei:

- Quem é você?

Não houve resposta a minha indagação, e ao levantar da mesa, aquela criatura saltou com facilidade, alcançando a mesa, sorriu maliciosamente, com aquele olhar castanho brilhante, que parecia possuir a ardência do próprio inferno, embora sua forma delicada não revelasse toda aquela intensidade e poder. Sorriu maliciosamente, e quase fui derrubado pela cadeira, fugindo entre as prateleiras, tentava manter distancia, ouvindo os murmúrios, quando havia silêncio, imaginava que estava sozinho, e surgia envolta naquele manto negro, formado pelo tecido e pelas sombras, a luzes ainda piscando, e fugi apressadamente ficando encurralado próximo das escadas, que conduzia para o piso superior da biblioteca, um lugar que sabia não haver saída, além de para baixo, saltando pelas janelas, e pela altura, certamente não poderia ir muito longe, porque aquela criatura, poderia alcançar com facilidade, e mesmo poderia sofrer alguma fratura, e ficar ainda mais indefeso, foi quando indaguei:

- O que você quer?

- Quem é você?

Pude ver um sorriso formar no rosto daquele ser, de traços delicados, olhar insinuante e intenso, que parecendo desafiar meus sentidos, surgiu rapidamente diante de mim, e com as unhas arranhando meu rosto, murmurou:

- Quer mesmo saber quem sou?

- Ou será que não sentiu quem sou, meu caro?

Senti um calafrio, percorrer meu corpo, a proximidade do corpo que emanava um calor febril, aquele olhar desafiador, e o hálito perfumado e quente, parecia uma armadilha para atrair qualquer ser humano, foi quando sorrindo, e aproximando os lábios de meu ouvido, murmurou:

- Não estava procurando por mim?

- Esse não era seu desejo?

Novamente aquela sensação arrepiante, acompanhado do temor que senti ao ter aquele rosto próximo de meu rosto, como quisesse sentir o calor de minha pele, e sorrindo disse:

- Posso ouvir seu coração, meu caro.

- Todo esse temor atrairia minha atenção.

- Mas hoje, eu quero mais do que seu medo.

- Posso ser seu prazer ou sua dor, é apenas uma escolha.

- E qual você fará, meu caro?

- Qualquer que seja, pode não sobreviver a essa noite.

- Pode não sobreviver ao nosso encontro.

Aproximou mais seu corpo de meu corpo, e começou a murmurar bem próximo de meu ouvido, parecia um cântico, um mantra, podia sentir a respiração quente, e aquele arfar sibilante, e maliciosamente disse:

- Acredite, pode ser do jeito fácil...

- Pode ser do jeito difícil...

- Mas tenha certeza, que vai ser.

- Do meu jeito, sem acordo, sem barganha.

Aquele olhar ficava escuro em meio as sombras e reluzia com a claridade, em nuances distintas, entre sagrado e profano, luxuria em carne e osso, que cada vez mais próximo, parecia querer sentir a simetria entre nossos corpos, quanto mais próxima, mais aquela sensação de poder era sentida, foi quando sorrindo maliciosamente, disse:

- Deveria relaxar, meu caro!

A voz ecoou como uma melodia, um sussurro que ecoou em meus ouvidos, e sorrindo maliciosamente, senti o dedo deslizar em meus lábios, e murmurou:

- Posso arrancar gemidos de dor e prazer de seus lábios.

- Você precisa apenas escolher o que será.

Ouvi o imenso relógio da biblioteca, e uma voz ecoar pelos corredores, como querendo verificar o que ocorria entre as prateleiras, foi quando colocando os dedos em meus lábios, murmurou:

- Fique quieto, e espere.

- Não irá demorar muito, e volto logo.

- Ainda quero ter tempo para você

A silhueta foi envolvida em uma sombra perfumada, um aroma de canela, que pareceu impregnar em meu olfato, um cheiro místico, sutil e delicado, que fez minha pele eriçar, pude ouvir passos apressados indo na direção da voz, e um grito agudo, para em seguida, apenas o silencio daquele lugar ser interrompido por passos apressados vindo em minha direção. Pude ver a silhueta surgir entre a coluna de prateleiras, e sorrindo avançar em minha direção, com movimentos ágeis e delicados, com um olhar de satisfação e um sorriso malicioso nos lábios, surgiu bem próxima de mim, como fizesse avançar o tempo quando surgia em meio as sombras, e sussurrando disse:

- Não quero ser interrompida.

- E agora, onde estávamos mesmo?

Parecia delicada, mas aquela fúria indomável expressa no olhar, em cada gesto de seu corpo, revelava que todo seu poder e força, era contida em uma aparência frágil, de pele morena, olhar imerso em uma simetria de luz e sombras, e sorrindo murmurou:

- Porque todo esse espanto?

- Não imaginou que ficaria sozinho, não é?

- Ou que não voltaria?

- Não pensou que iria fugir de mim, mais uma noite, não é?

Fiquei quieto, por saber, que onde quer que fosse, aquele ser iria ser capaz de encontrar, e fiquei quieto, quando ficou bem próxima de mim, e sorrindo maliciosamente, disse:

- Você pode fugir, pode esconder.

- Mas irei encontrar você, em seus sonhos mais íntimos.

- Irei encontrar você em seus pesadelos.

- Seja como for, esse encontro iria acontecer, cedo ou tarde.

Ficou imóvel, e pude sentir o hálito quente, o sorriso malicioso ser emoldurado nos lábios, e aquele olhar que possuía um contraste singular, de luxuria e placidez, de uma força e delicadeza, de luz e sombras, que parecia entorpecer meus sentidos, e sorrindo disse:

- Ainda vai resistir, ou vai ser do jeito difícil?

- Damien Lockheart

DAMIEN DARKHOLME
Enviado por DAMIEN DARKHOLME em 16/01/2013
Código do texto: T4087060
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