Gravataí da Depressão

Tarde quente em um inverno gaúcho. Trinta graus, mas dentro de casa pareciam apenas quinze. Dentro do coração então, abaixo de zero era pouco para se imaginar. Deitado no quarto, com o rádio a tocar constantemente todas as músicas do Nenhum de nós. Lágrimas escorriam de sua face em grande velocidade. Colchão quente, ambiente frio. Levanta e caminha até a sacada. O calor do sol era reconfortante, o silêncio da cidade também.

Sábado silencioso. Gravataí da depressão, assim era chamada sua cidade, não por motivos clínicos, mas sim por ser uma cidade tediosa. Pouco entretenimento pra tamanho território. Sair também não adiantaria nada. Mauro acabaria se jogando na frente do primeiro carro que viesse em sua direção. Direção por direção preferia aquela tomada pela solidão. Pois era esta a única que conhecia agora. Sua amada lhe deixou. “Estou te traindo, tu é um merda. Acabou”. Foi uma SMS. Seis meses terminados em uma simples SMS. Mauro desabou, Mauro caiu, Mauro ligou. Chorando. Foi uma conversa triste e cruel. Triste por parte dele e cruel por parte dela. Contou tudo o que fez e com quantos homens fez. Chamou-o de frouxo, corno e veado. Disse que acabou, riu e desligou. Mauro morreu e a sombra do que foi um dia, restou. Pelo menos foi isto que escreveu em seu mural no Facebook. Ainda teve tempo para isto.

Desceu as escadas e dirigiu-se a rua. Olhou em volta. Deserto. Não havia ninguém. Seus amigos haviam saído de casa, talvez fugido. Correu, correu o mais rápido que pode. O verde das árvores entrava em contraste com o transparente de suas lágrimas. Seus olhos, inundados pelo oceano de falsidade que foi os últimos seis meses. Tropeçou, caiu, feriu-se. Não mais do que em seu coração. Acordou então, mas não estava no asfalto quente. Rimava com poesia o estranho sentimento que sentia bater na porta de seu coração. Sem céu azul como seu teto, mas no lugar deste, concreto branco. Tremeu. Sentia um cheiro familiar no ar. Seus braços estavam estendidos, presos ao corpo. Estava deitado em algo estreito. Estreito demais para conseguir se mexer. Mesmo assim, levantou-se. Muitas pessoas a sua volta. Inclusive a vadia de sua ex-namorada. Chorava e lamentava-se. Tapas, puxões de cabelo e gritos. Sua mãe a agredia. “Você matou meu filho!”, dizia. Assustado, olhou para trás. Havia um caixão e dentro estava seu corpo. Agora tudo fazia sentido. Isso justificava o nome, Gravataí da depressão.

Walter Frank
Enviado por Walter Frank em 11/08/2012
Código do texto: T3825255
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