DO OUTRO LADO DA RUA (12) – UM ANJO “DIFERENTE”
          
          Hoje amanheci ansiosa, vou fazer uma visita à dona Chiquinha, preciso que me benza, para colocar em dia meu equilíbrio. Vou em seguida até lá, assim meu dia será mais tranquilo e mais produtivo.
          Com esta visita, enquanto procuro meu bem estar, estarei também oferecendo meu carinho à boa velhinha.
          Após aquele tradicional ritual com ramos de alecrim, a doce velhinha me convida mais uma vez à cozinha, para tomarmos o café fresquinho com bolinhos de chuva. E ali, naquele aconchêgo do fogão de lenha, ela inicia mais uma de suas historias maravilhosas.
          O fato aconteceu nos idos dos anos de 1890, quando tinha seus 15 anos de idade. Não era comum naqueles tempos ver alguém entrando por uma janela altas horas da madrugada, justo naquela hora em que o povo estava ajeitando os pensamentos, organizando os sonhos, acalmando as "trabalheiras" do dia. Mas isso aconteceu. E aconteceu não porque ela queria, mas porque acontece e pronto, e nada pode evitar.
          Passava já das duas da manhã quando uma moça, com a ligeireza de uma das garças que habitavam por aquelas bandas, saltou a janela escancarada, parou ao lado de sua cama, sorriu um sorriso terno e esperou que ela dissesse alguma coisa. Chiquinha ficou estática, perdeu a fala, pois ela era toda branca com um brilho de lua cheia e tinha os braços atados por uma corrente. Permaneceu ali por alguns instantes, deu um aceno e se foi. Assim aconteceu por várias noites até que, Chiquinha tomando coragem resolveu lhe perguntar o que desejava. A moça, sem tirar do rosto aquele sorriso terno indicou à Chiquinha os braços presos, como a pedir que a libertasse das correntes.
          Assim fez Chiquinha, retirando daquela linda moça brilhante, as correntes que atavam seus braços. Naquele momento seu sorriso se alargou, sua voz saiu e ela contou à Chiquinha que fora escrava, morrera acorrentada pelos maus tratos do feitor e agora, graças à doce Chiquinha estava livre, para viver no céu a maravilhosa liberdade dos anjos abençoados.
          Minha doce velhinha da casa de fundos, do outro lado da rua, deixa transparecer a felicidade em seu semblante, após a narração em que foi personagem , o qual guarda na lembrança como o mais prazeiroso de sua vida.

Moly
Enviado por Moly em 31/07/2012
Reeditado em 01/08/2012
Código do texto: T3806095
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