A Ira dos Anjos
1 - PRÓLOGO
A mãe chora.
Eu sou o cara que dá as más notícias, eu sou o cara que falou que o filho dela de nove anos de idade fora encontrado morto em uma área de mata fechada com os órgãos internos arrancados e que o corte fora algo feito por metal, ou seja, descarta a hipótese dele ter sido atacado por um animal, na minha língua o nome disto é assassinato.
A mãe chora. A família toda chora, o garoto estava desaparecido há mais ou menos nove dias. Ele simplesmente sumiu e a família desesperada entrou em contato comigo. Tenho um escritório especializado em busca de crianças desaparecidas, estou neste ramo há mais ou menos dez anos. No começo era algo gratificante, principalmente quando achávamos crianças que tinham fugido dos pais ou se perdido. Claro que a gratificação começou a acabar quando as crianças eram encontradas mortas, muitas de formas horríveis.
Eu bebia para esquecer, mas acho que isso é clichê.
Eu trabalhava em conjunto com as forças policiais locais, claro que quando os federais eram envolvidos meu trabalho era dificultado em cem por cento, mas eu criei certa fama no meio, eu sempre encontrava as crianças, vivas ou mortas.
Mas, havia algo estranho desta vez…
2- Querubim
A floresta era densa, árvores gigantescas dificultavam a visão, uma pequena névoa da manhã comum em dias de frio pairava no local de uma maneira fantasmagórica. O clima era quebrado pelos carros de polícia e as sirenes, vi o carro da pericia forense se aproximar, vinha lento e pesado e parou com uma tristeza do meu lado.
- Tenho te visto com muita frequência, Xavier - Roosevelt, um dos maiores peritos forenses que já conheci, pena que seu vício no jogo estragava sua genialidade. Homem de meia idade, não queria se aposentar, pois seu trabalho era a única coisa que possuía.
- Ross, mais um daqueles.
Eu e Ross andamos pela floresta, muitos policiais tiravam fotos do lugar, outros tentavam recolher provas mas nunca encontravam nada. Um deles, parecia ser muito jovem para o que fazia se direcionou para Ross.
- Os órgãos internos foram retirados de maneira cirúrgica, parece que foi usado um instrumento cortante como um bisturi ou algo parecido, todas as outras estavam do mesmo jeito – Ross permanecia em silêncio, ele olhou para mim com olhos desperançosos, como se quisesse sair dali. O rapaz olhava para Roosevelt esperando resposta, sinto que me ignorava mas o mesmo sabia quem eu era – foi obra de um profissional.
Profissional!?
O mundo enlouquecera!
A criança estava deitada de lado, como alguém que dorme, sua boca estava aberta e sua barriga estava aberta em um corte na vertical que ia do pescoço até o púbis, por dentro não havia nada, vísceras, coração, pulmão, tudo fora retirado. Era grotesco ver aquela criança ali vazia, morta. Era uma menina de uns nove anos de idade. Estava vestida pudicamente, porém sem a blusa e com o corte mortal. Seu rosto era sereno como se estivesse dormindo.
- Acho que o corte e a retirada dos órgãos internos é uma marca registrada, deve ser algum culto religioso por aqui – Ross estava cansado, seus olhos estavam pesados, ele não queria admitir mas precisava se aposentar, tanto ele quanto eu – ele era a criança que você estava atrás Xavier?
- Sim, a família me contatou há três dias me deram fotos e alguns dados, falei com algumas amigas dela, conhecidos, familiares. Um senhor falou que viu a menina entrando aqui na noite passada e então o corpo fora achado.
- Quem a viu!?
- Não, eu já averiguei, o nome do velho é Davidson, e estava na companhia de mulher e filhos, não parecem mentirosos, mora do outro lado da estrada. Conversei com ele e ele me dissera que viu a menina entrar na floresta de madrugada.
- O que me preocupa é o fato de ser a terceira criança encontrada na mesma situação. Estou preocupado tudo indica ser um serial Killer.
- Sim, tudo indica que seja. Mas o fato que não há pistas, não há nada que indique alguém, nada, as lesões no corpo são sempre as mesmas.
- Xavier, eu estou cansado – Roosevelt me disse isso com os olhos brilhantes, era triste ver aquele homem cair daquele jeito, cansado. Um serial Killer? Seria desgastante, seria tenebroso mas era o que parecia.
Criança.
Sem órgãos internos.
Sem pistas.
Afastei-me dos policiais, da perícia, de Ross. Andei para o interior daquela densa floresta de longas arvores ramificada. Era um lugar claustrofóbico, muito simples de se perder, eu andei em linha reta por algum tempo e quando olhava para trás sentia que eu tinha andado em círculos. Parei e dei uma olhada na paisagem, era tudo silencioso e mortal a névoa e o frio tornava tudo mais branco e tudo mais solitário. As árvores pareciam ter vida própria e eu sentia que era seguido.
- Roosevelt? É Você? – gritei para trás, mas não obtive resposta, apenas o silêncio que engolia. Resolvi voltar, mas eu não encontrava o caminho certo. Não conseguia mais ouvir as sirenes e os carros policiais, sentia meus passos ecoarem atrás de mim como se os mesmos me perseguissem, sentia meu coração entrar em um ritmo constante com a floresta, minhas mão suavam e estava frio. Eu olhei para trás na ultima esperança de encontrar o caminho pelo qual vim e quando volto minha vista para frente sinto que a floresta havia esticado. Uma das árvores parecia se mexer, não sabia se era uma ilusão de ótica feita pelo álcool ou pelo cansaço. Eu me aproximei e senti uma dor forte nos olhos, os galhos da arvore se mexiam como tentáculos e o tronco era negro como se fosse o tronco de um homem alto. Minha atitude foi ficar parada olhando enquanto aquela árvore se aproximava de mim, eu ouvi vozes de várias crianças na minha cabeça. Elas gritavam e choravam, eu vi a menina morta sendo aberta e suas vísceras pulando fora. Aquilo se aproximava de mim e minha respiração se tornava difícil. Eu estava caído no chão de joelhos e não conseguia me mover. A floresta tinha se fechado ao meu redor e eu não conseguia mais enxergar, tudo girava e eu estava paralisados. Aquilo se aproximou de mim, mas eu não conseguia vê-lo, sabia que estava perto de mim, mas não sabia aonde.
- Xavier! Por Deus o que faz aqui? – Ross segurando meu ombro.
- Roosevelt!! – meu coração acelerado começou a voltar – eu não sei, não sei mesmo, não sei o que aconteceu, eu acho que estou pirando. Vamos voltar!
Levanto-me, dou uma última olhada para trás e tenho a sensação de ser observado.