A JORNADA
O som oco dos passos no corredor extenso da sala é vibrante. Pela porta entreaberta, bem lá no fundo, um pequenino facho de luz invade o corredor. O restante, apenas uma luz perolada invocando-se entre dois corpos, que devagar vagam no instante em que tomam rumo a um lugar inexplorado e jamais a ser acessível.Ambos completam-se vestindo camisa e calças cor creme, enquanto o ar no extenso corredor é purificado como nenhum outro lugar poderia ser. Um deles encontra-se ofegante, sem ter como reagir. Ao longe, ele escuta notas de violino sendo mesclados com o etéreo som das harpas. Sua reação parece alucinante, porque afinal de contas não é o que deseja. De repente, a porta que estava entreaberta agora se fecha comum baque estrondoso.Medo, desilusão, fraqueza e, imobilidade, se entrelaçam numa tentativa de sobressalto. A voz do indivíduo é quase extinta, e a visão de tudo o que restou desmanchou-se como folha emerso em água.
Enquanto permanece aos prantos, o outro homem ao seu lado continua seu percurso normalmente. Uma sombra mística é realçada em seu rosto para que sua face não seja revelada. A alma, à sua direita, por sua vez, tentou falar, mas logo percebeu que o único modo para estabelecer uma conexão, ou uma fonte de comunicação seria a sua mente. Então ele fechou seus olhos permanecendo estáticos. Concentração, força, instinto.
Um turbilhão de imagens vem ao seu encontro, entre elas: um céu azul límpido e brilhante se preparando para o entardecer, dando lugar ao lusco-fusco sereno, e uma extensa trilha de pedras de calcedônia num grandioso jardim florido, enquanto nela uma figura infantilizada corre ao seu encontro. A menina de cabelos castanhos cacheados sorri para ele tão vivamente, enquanto ele se prepara para segura-la fortemente num grandioso abraço.
Uma luz branca materializa em seus olhos dando início a uma nova visão. Dessa vez, elas começaram a aparecer e desaparecer tão rápidas como uma mudança repentina de flash backs. Não demorou muito para perceber que eram filetes de memórias vívidas há tempos, e tempos, durante sua vida no plano material. Então ele lança um sorriso ao ver uma mulher bem ao longe, no horizonte esplêndido, também sorrindo para ele. Mas logo em seguida cai numa onda de angustia ao ver o radiante sorriso transformando-se em lágrimas escorrendo pelas maçãs do rosto dela no constante estado de sofrimento. Seria o fim de tudo?, pensou ele, angustiado.Como se já não bastasse, tudo parou. As memórias lentamente foram se apagando, e tão distante visualizava a amada desaparecer de seu foco. Inconformado, sua alma gritou. Ecos começam a se rebater no corredor desértico, despertando formas e espectros que nunca existiu. Olhando ao seu redor, por entre os canteiros das portas e vielas, só conseguiu enxergar o espaço á espera de um vão a ser preenchido. Deixou-se devagar tombar pelo chão, encostando-se em posição de cócoras pelas paredes monumentais. Criando um casto momento de expressões, deixou que a saudade mera de uma composição tão singela e inocente, fosse marcada plenamente junto com seu doce espírito. Seu sorriso tão alegre, harmonioso, e afável, continuaria presente em estado e nos corações de cada um naquele outro plano, para que desde então continuassem a sorver com bastante vigor seu suave e acalentado amor por cada um, mesmo podendo haver saudades.
Com tamanha firmeza, se viu novamente ao lado da outra figura ao seu lado. Despertando-se de um sonho real leve e pacífico, finalmente, por um equívoco momento, conseguiu finalmente ver o rosto do homem. Boquiaberto, e sem nenhuma palavra trilhando-se em sua mente como ondas sinuosas, entendeu que tudo se passa de um mistério inexplicável e inacessível, até que uma alma, por sua vez, chegasse naquele ponto da jornada.
Vagarosamente, uma das portas do corredor abriu, e dela a mesma figura infantilizada apareceu correndo ao seu encontro. Suas emoções e surpresas foram além. Abrindo os braços, escancarando largamente, seus pensamentos anuviou-se por completo. Muito por completo. Pois para ele, nunca haverá o fim... nunca.