GERALDO COSSALTER - A ESTUDANTE SUSPEITA

Ela era muito misteriosa, olhos esbugalhados, cabelos pintados de vermelho, sombra azul anil, usava um vestido laranja e um sapato vermelho, impossível de não ser notada. Vinha toda noite pela entrada principal da faculdade carregando livros, não olhava e nem falava com ninguém, sentava-se na primeira carteira, assistia a aula e sequer uma palavra ela pronunciava. Tentei me aproximar dela, mas não fui bem recebido, ela simplesmente me ignorou. No semestre seguinte, ela continuou a vir da mesma forma, agindo sempre da mesma forma, e eu incrédulo decidi segui-la uma noite para descobrir onde ela morava. Na primeira tentativa, ela subiu em um ônibus e desapareceu. Na noite seguinte eu consegui pegar o mesmo ônibus sem que ela me visse. Descemos no mesmo local, fiquei um pouco atrás, ela manteve o seu passo, eu fui ficando para trás propositalmente, quando percebi ela havia sumido novamente, eu a perdi de vista. Na semana seguinte eu iria segui-la de qualquer forma, decidi esperar no local onde ela descia, e lá fiquei, vinte metros longe, até que ela apareceu, da mesma forma, com as mesmas roupas, passei a segui-la e eis que ela entra na Igreja, passei tres horas aguardando a sua saída e nada, pensei, vou entrar, porta trancada, disse para mim mesmo, será que é parente do padre? Na noite seguinte estou eu novamente lá, no ponto do ônibus, nada dela, de repente a vi, novamente ela entra na igreja, espero vinte minutos e nada, tento entrar na igreja, porta trancada. Meu Deus pensei, será que está ocorrendo algo? Fui á igreja durante o dia e falei com o Padre. Ele me informou que não conhecia a tal garota, achei estranho, meu Deus, será que estou ficando maluco? Não pode ser, eu a via todos os dias e o Padre disse que não sabia quem era ela! Depois de aguardar duas semanas, eis que ela surge novamente, resolvi fotografa-la e segui-la, corri até o ponto do ônibus, aguardei 30 minutos, ela apareceu, eu a segui ela passou pela igreja e não entrou, continuou a caminhada, na curva da rua do cemitério, eu a perdi de vista, não podia ser, de novo não, como poderia ela sumir da minha vista. Olhei a foto no celular, nada, onde foi para a foto, só havia um clarão, meu Deus vou ficar louco. Dia seguinte fui ao cemitério, cai das pernas, sua foto estava cravada em um túmulo, seu nome, Ana Cristina Alentajo, corri para a Faculdade, pesquisei seu nome na secretaria e descobri finalmente depois de cinco dias, ela foi sobrinha de um padre e faleceu vítima de uma ‘’bala perdida’’ em um confronto da polícia com estudantes, na porta da faculdade no primeiro dia de aula no ano de 1969......

Geraldo Cossalter
Enviado por Geraldo Cossalter em 06/06/2012
Reeditado em 22/11/2014
Código do texto: T3709558
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