Um assassino a solta
Quando os policiais entraram na casa, encontraram uma verdadeira cena de terror. Havia sangue por todos os lados. Na sala dois corpos em avançado estado de decomposição. Ambos com a garganta cortada. A mulher aparentando trinta anos estava só de calcinha e do seio esquerdo, o mamilo havia sido cortado. O homem devia estar perto dos sessenta, estava vestido socialmente. Os olhos haviam sidos arrancados. Os policiais subiram para o andar superior e em um dos quartos acharam a terceira vítima. Uma criança de mais ou menos seis anos. Fora estrangulada com uma corda de nylon. Parece ter sido assassinada enquanto dormia, pois estava abraçada á um brinquedo de pelúcia. Duas coisas chamaram a atenção dos policiais: Não havia sinais de arrombamento na casa e aparentemente nada de valor tinha sido levado. A família assassinada era muito conhecida na cidade. Possuíam uma pequena mercearia e eram muito amáveis. A população ficou chocada e amedrontada com o crime e foram unânimes em afirmar que o assassino só podia ser alguém de fora, já que o casal era benquisto por todos.
Dois anos se passaram e outra família foi assassinada. Desta vez foram amarrados e morreram queimados em um incêndio que destruiu toda a residência. A polícia se sentiu de mãos atadas. Muito se especulou, mas não conseguiram encontrar um culpado. Não havendo provas nem testemunha, o caso foi arquivado.
Não existe crime perfeito e às vezes por causa de um detalhe pequeno o criminoso é descoberto. Os habitantes da pequena São Leopoldo ficaram estarrecidos quando souberam a identidade do homicida. Nem em seus piores pesadelos, poderiam esperar que uma pessoa tão generosa, disposta a ajudar e principalmente tão religiosa fosse culpada por crimes terríveis.
Anselmo foi uma criança muito pobre. Tanto de bens materiais, quanto de afeto. Viu a mãe ser assassinada a golpes de machado pelo pai e pouco tempo depois teve de conviver com outra mulher dentro de casa. A amasia do pai detestava crianças, por isso Anselmo e seus dois irmãos passavam quase todo o tempo trancados dentro do quarto, saindo apenas para se alimentarem ,fazerem tarefas de casa e para irem à escola. O pai também não os suportavam e por qualquer motivo eram castigados.Quando tinha dez anos,Anselmo acordou uma noite com soluços vindo do cômodo ao lado e logo depois viu a irmã entrar no quarto onde dormiam e ir para sua cama chorando.Quis consolá-la mas teve medo da reação dos adultos se o encontrassem acordado. Algum tempo se passou e sua irmã começou a vomitar e a ter desmaios e um dia saiu de casa com a madrasta e ao voltar estava ainda mais doente. Nesse dia houve uma briga feia .A Madrasta queria que o marido chamasse um médico para a menina,e esse recusou terminantemente.Em meio á frases soltas,Anselmo ouviu as palavras;aborto,policia,estupro.Ele não conhecia o sentido de nenhuma delas,mas pelo tom com que foram ditas,o garoto percebeu que estavam ligadas á coisas muito ruins.Sua irmã morreu dias depois,perto de completar treze anos de idade e foi enterrada no fundo do quintal.Os garotos foram ameaçados pelo pai e tiveram que se calar sobre o ocorrido.
Os anos se passaram.A madrasta morreu de forma suspeita,o pai se casou de novo e expulsou de casa os dois filhos.O irmão que trabalhava como ajudante de caminhoneiro,foi embora para outro estado.Anselmo seguiu um antigo sonho.Entrou para o seminário e tempos depois se tornou padre.Foi enviado então para assumir a paróquia na cidade de São Leopoldo.
A cidade estava em polvorosa! Um jovem casal fora assassinado. Foram esquartejados. O crime foi descoberto por causa do mau cheiro que vinha da casa e da presença de urubus no local. O medo voltou a reinar. Portas e janelas eram fechadas antes do anoitecer. Foi decretado toque de recolher, as entradas e saídas da cidade eram vigiadas vinte e quatro horas. Ninguém entrava ou saia sem identificação ou um motivo que justificasse a ida ou a vinda. Desta vez havia uma pista. Um crucifixo foi encontrado entre os dedos da mulher morta. Tudo indicava que ela lutara com o assassino. Havia um nome gravado na parte interna da cruz.
O sermão falava sobre humildade e caridade. A igreja estava cheia e todos ouviam atentos. Os últimos acontecimentos despertaram na população a necessidade de religião. Também se sentiam seguros na casa de Deus. Entre os fieis, havia quem estava ali por outro motivo. Essas pessoas aguardavam ansiosas o término da missa. Cada minuto á mais era exasperante.
Padre Anselmo sentiu que havia algo diferente. Viu entre os frequentadores habituais, algumas pessoas que nunca comparecia a igreja. Alguma coisa estava errada e ele não ia esperar para descobrir. Encerrou abruptamente a missa e se dirigiu apressado para seus aposentos. Colocou algumas roupas em uma mala e se preparava para fugir, quando o delegado chegou acompanhado dos seus auxiliares e lhe deu voz de prisão. Levado para a delegacia o padre confessou todos os crimes com bastantes detalhes. Os policiais perceberam naquele momento, que estavam diante de um homem completamente insano. Alguém que teve a mente destruída ainda na infância. Por ter sido privado das alegrias de um convívio em família, ele cresceu odiando tudo oque fosse ligado a lar. Todas as vezes que matou, imaginou estar destruindo as pessoas responsáveis por toda sua infelicidade. Sua madrasta e seu pai. 19\05\2012