Peras...

A rua estava deserta. O cheiro de dejetos humanos era inconfundível. A luz, mais a frente, piscava paulatinamente, deixando o ambiente com uma aparência ainda mais assustadora.

Ela apressou o passo: alguém estava atrás dela. Segurou forte sua bolsa e começou a correr. A pessoa, fosse quem fosse, era rápida. Dehíse sabia que aquele ambiente era perigoso, mas não tinha outra escolha.

Um puxão no seu longo cabelo a fez gritar de dor e parar de correr. Finalmente a pessoa conseguiu alcançar-lhe. O homem segurou-a por trás gemendo doces e excitadas palavras:

- Você tá fudida, dondoca. Vai ter que pagar para poder sair daqui, piranha.

Apertou-lhe os seios.

- O meu dinheiro está dentro da bolsa. Pegue e me solte.

- Até parece que é isso que eu quero dizer com pagar, cadela. – Jogou-a no chão e começou a baixar sua bermuda. – Tá vendo ele? Vai ter que mamar todinho.

Dehíse colocou o pênis na boca. O homem começou a delirar.

- Vai, vadia, lambe. Isso... Assim... ah... AH... AAAAAAH

Com um rápido movimento, Dehíse guardou o canivete. Cuspiu o membro, enquanto o homem urrava de dor. Ele desmaiou.

Começou a voltar a si. Abriu os olhos. “Nunca mais eu uso cocaína... Aquela tava estragada, certeza.” Tentou mexer os braços, mas estes estavam totalmente imobilizados. A lembrança do ocorrido voltou, ainda que a dor não. Um curativo havia sido colocado onde deveria existir um pênis:

- MEU PAAAAAU, VOCÊ ARRANCOU MEU PAU. EU VOU TE MATAR.

Dehíse riu. Histericamente.

- Homens... sempre tão previsíveis. “Eu vou matar”, seguido de “por favor não, eu serei bonzinho” até “você vai morrer, vão te pegar”. – Aproximou-se da maca. Ajustando as luvas, começou a desvelar um embrulho em cima da bancada.

- Mas eu não sou assim, moça, eu juro. Eu só precisava de dinheiro... eu tenho família...

- Eu sei. E bate em sua mulher, né? E estupra sua filha? – Ele ficou ainda mais pálido. – Eu venho lhe acompanhando, ô xará... E não é de agora. Desde que saiu da prisão. Eu não sou a primeira mulher que você humilha.

Seus olhos recairam sobre o bisturi.

- Mas com certeza serei a última. – Posicionou o objeto no ventre inchado - eu tenho que ter muito cuidado com esses corte... – falou pensativa - Ninguém vai gostar se você morrer por perda de sangue.

- Por favor, eu juro que não s...

- Eu falei... sempre desse jeito – revirou os olhos. - Malditos homens, vocês conseguem deixar qualquer coisa menos poética.

Com a mão firme, começou a fazer a incisão. Os gritos no quarto eram brancos, apáticos, sem vida. Sem esperança.

Cortou. Só o suficiente para retirar um filete de carne e gordura. O sangue escorria. Reposicionou o bisturi do tendão do pé direito. Abriu com um movimento preciso. Com os dedos, começou a puxar e abrir o local. Explorou com o dedo.

Ele nunca havia sentido tanto medo na vida. A dor era excruciante. Perdeu os sentidos. Acordou quando sentiu que algo estava incomodando o seu anus: Dehíse acaba de inserir uma pêra anal. Ela começou a enrroscar o parafuso e a pera começou a abrir. O metal dilacerou o anus e o reto.

O corpo foi encontrado no mesmo lugar dos outros: ao lado da delegacia. Nenhum fio de cabelo de Dehíse fora encontrado. A polícia ficava dividida entre a consternação de não prender aquele serial que matava apenas estupradores que de alguma forma conseguiam escapar deles... E a gratidão. O número de estupros vinha caindo consideravelmente desde aquele mês.

Dehíse continuava a fazer terapia. Seu psicólogo disse que o trauma de ser estuprada tinha sido substituído por algo maior... Ele ainda não conseguira identificar o que. Mas estava fazendo tão bem, que ele queria estudar para poder melhorar o tratamento das outras pacientes que haviam sido estupradas.

Dehíse permanecia com as cicatrizes em seu corpo. Mas as da as alma tinham sido exterminadas. Para sempre.