NO JARDIM DO MOSTEIRO (final)

(continuação de No Jardim do Mosteiro - parte 2)

A bancada do laboratório estava repleta de frascos contendo substâncias coloridas.

A um canto, sobre o bico de Bunsen, aceso, o conjunto de ampolas de vidro, num circuito fechado, longo composto por retortas, serpentinas e tubos cegos de várias alturas, semelhante aos antigos órgãos de igrejas, contendo o líquido verde que emitia a luminescência.

O que seria aquilo? O que tinha em mente a pessoa, ou grupo delas, quando construiu aquele lugar de aparência, no mínimo, suspeita? Quais seriam as conseqüências para o mundo lá fora se aquela coisa vazasse e se espalhasse na atmosfera? O cheiro forte de tetrametilenolamina, sufocante, dominava todo ambiente.

Tomei outro susto monumental quando vi, num enorme espelho, a minha imagem refletida e logo atrás, num segundo plano a imagem do monge, ou seja lá o que aquilo seja, sempre com a cabeça coberta e na obscuridade.

Como seria a face daquele ser, que não podia ser considerado pessoa porque, conseguia se transformar em fumaça, aparecer e desaparecer quando e onde queria.

Instintivamente olhei para trás. O monge, agora sem o capuz estava me olhando.

- Foi bom você ter vindo.

- Eu não tinha alternativa. Só quero ver onde tudo isso vai dar.

Havia serenidade em sua voz quando disse:

- Vamos ao que interessa. Desse laboratório em que estamos, já saíram grandes descobertas, tanto para o benefício como para a perdição do ser humano. Nomes célebres e respeitados em todo mundo, passaram por aqui antes de você. Galileu, Newton, Da Vinci, Lavoisier, Sabin, Einstein, Pauling, Chardin e a graciosa Maria (*) foram meus estagiários mais brilhantes, assim como Verne que apresentou ao mundo, em forma de conto infanto-juvenil as nossas “descobertas” que seriam realidade mais de cem anos depois.

Naquele painel tem a fotografia de todos eles.

Disse isso apontando para o painel alto que, como biombo tapava a visão para a outra metade do laboratório.

- E o que há depois desse painel.

- É a máquina que vai me levar de volta ao meu tempo.

- Então você matou a todos só para poder voltar ao seu tempo?

- Quem lhe disse que matei alguém?

- Todos os monges estão mortos! Não sobrou ninguém! Disse com voz embargada lembrando-me de meu amigo Manoel.

- Caro amigo, não tive nada a ver com isso, eles morreram realmente por terem comido o cogumelo venenoso.

- E você foi o escolhido para me enviar ao meu tempo, por ter aparecido no momento de desespero para mim. Pois somente a cada mil anos a Lua se alinha com Júpiter e com o cinturão de Órion como está se alinhando agora. Temos pouquíssimo tempo.

Andamos até o biombo. Havia um artefato semelhante às cabines telefônicas de Londres, com uma vigia oval, com vidro, por onde se podia ver o seu interior todo espelhado.

- E o que é que eu preciso fazer?

- Aquele líquido verde é tetrametilenolamina e entrará em ebulição dentro de 90 segundos, você deve transferir todo conteúdo para a câmara, acoplando o conjunto nesta rosca. Coloque os óculos protetores, ou então ficará cego para sempre.

Enquanto falávamos foi acionada a sirene de alarme, intermitente, como de reator atômico. O frade disse então.

- É agora. Rápido antes que se torne massa crítica. Depois de acoplado, abandone este local imediatamente, caso contrário você será sugado também.

Rapidamente coloquei a máscara e trouxe o conjunto para perto da câmara. Acoplei a mangueira de descarga.

Antes que se esgotasse todo conteúdo falei para o monge, que ainda estava com a porta entreaberta.

- Você não me disse quem é.

- Isso é irrelevante, mas pode me chamar Merlin.

Dizendo isso a porta do equipamento se fechou. Houve uma explosão e tudo se apagou.

Acordei na cama do hotel, molhado de suor e com a garganta mais seca que as areias do Saara.

Desorientado, sentei na cama e houve uma sensação de alivio por ter sido um sonho, ou melhor por ter acordado de um pesadelo.

Mas não parecia pesadelo porque eu estava com a roupa que saíra para o mosteiro, depois que o frade esteve sentado em minha cama.

Com essa dúvida martelando minha fronte, fui, cambaleante, até o frigobar para tomar água. Aquele cheiro novamente, era... era, tetrametilenolamina? Não pode ser!

Não vou ficar aqui nem mais um segundo, pensei já descendo a escada em direção à recepção.

Antes de chegar ao terceiro lance da escada parei estático.

A minha frente, parada, e agora com os dois olhos, a gárgula parecia sorrir.

- Nããããããããããããããããooooo!

(*) Galileu Galilei, Isaac Newton, Leonardo Da Vinci, Antoine Lavoisier, Albert Sabin, Albert Einstein, Linus Pauling, Teillard Chardin, Maria Skolodowska Curie, Julio Verne.

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Este final é uma produção conjunta, parte Paulo Moreno escreveu, parte eu escrevi e combinamos a versão final.

Para mim foi uma experiência maravilhosa poder trocar ideias com um jovem talentoso, de rara sensibilidade e que sabe empregar a palavra correta para se exprimir.

A admiração e o respeito que sinto por Paulo ficou ainda maior .

Meu sincero agradecimento ao confrade, agora co-autor.