A Bailarina, Romance, Cap. XI
Às sete horas da noite, horário previamente combinado no almoço, Ingrid, suas alunas e o grupo de Afonso, isto é, ele, Marcel e os dois assistentes, estavam sentados no gracioso restaurante no Morro do Aipim, indicado por um dos garçons. Wanda verificou que o local não figurava nos diversos folders que ela tinha sobre Blumenau. Talvez por ser novo e não tão sofisticado. As nove pessoas do grupo distribuíram-se por uma longa mesa em madeira pesada e polida, próxima e paralela à parede onde terminava o salão. Alguns ficaram de frente para a entrada e os outros se depararam com o grosso blindex translúcido, ocupando parte da área da parede aos fundos do salão, na forma de dois retângulos que corresponderiam certamente aos banheiros do restaurante.
Pouco depois do início do jantar, voltadas para a parede inteiramente revestida em madeira com as duas aberturas indevassáveis pelo blindex, Ingrid, Marluce, e as outras alunas comentavam o agradável efeito obtido pela conjugação dos dois materiais, quando lhes pareceu, pelo vulto que podiam observar, que um homem entrara num dos banheiros. As cinco continuaram a comer e conversar animadamente, como todos na mesa, sem ter a atenção atraída pela movimentação do homem no banheiro. Sendo que Marluce, alguns instantes depois, achou estranho quando, sem que ninguém do seu lado percebesse, o homem inclinou-se em direção ao blindex e passou a percorrer com o nariz o que seria talvez uma fina prateleira fixada ao vidro, possivelmente sobre o lavatório. A demorada observação de Marluce atraiu a atenção das outras quatro a seu lado e depois a dos outros no lado oposto, tendo alguns destes se virado para poderem observar melhor. Dentro de instantes a mesa toda comentava discretamente a ocorrência:
-É, o rapaz tá se tratando. Fazer o quê, não é?, observou Afonso.
-Puxa! Que carreira, cara, disse Marcel, virando-se mais uma vez para olhar demoradamente.
-Aquela prateleira deve ter uns 50 centímetros. O moço tá cheirando bem, comentou Roger.
Ingrid procurou observar a reação de Marluce. Vilma, Érica e Camila eram só risinhos abafados. Marluce mantinha-se impassível. Continuava olhando, mas fazendo-o de forma discreta. Nada falou.
Quando o homem saiu do banheiro, Marluce e as quatro a seu lado, as primeiras a encará-lo de frente, identificaram a figura de um jovem bonito, alto, claro, num terno muito bem cortado. Certamente um empresário ou funcionário de alguma estatal, foi o que pensaram. Marcel acompanhou-o depois com o olhar até vê-lo sentar-se à sua mesa, onde teve a inquirição dos olhos da bela loura alta que o estava aguardando. E que, aliás, havia chegado antes que seu companheiro, fato apenas observado por Marluce, logo que entrou.
De volta ao hotel, pouco antes de se deitarem, bastante extenuadas pela movimentação desde cedo pela manhã, Ingrid comentou:
-Viu como é? Agora até nos banheiros dos restaurantes!
-É isso aí. A disseminação do consumo. Não é assim que se fala?
-Parece até que a professora aqui é você. Já tinha visto isso?
-Nos filmes, sim. Pessoalmente, não. Mas sei que isso acontece. E tem que acontecer mesmo.
-Como assim?
-Enquanto se der importância à droga, ou enquanto houver quem lucre com ela, ela não sai de moda.
-Nisso você está cheia de razão, Lu. Os principais traficantes, distribuidores, comerciantes e barões da droga devem ser algumas dessas nossas autoridades que andam por aí.
-Penso da mesma maneira. Mas já estou cheia de sono.
-Beijos então, querida, Durma bem.