Sou sua ninfa
- Então ela não quis publicar? – quis saber Ana.
- Pega o vinho pra mim. – pedi.
Ela esticou o braço alcançando a garrafa. Meu copo estava perto e a executiva me serviu. Encheu o dela também.
- Ela não quis falar comigo. – respondi.
- Essa garota deve ser maluca. – sentenciou Ana. Depois começou a deslizar um dos pés pelo meu corpo.
- Acho que sim. – respondi pensativo.
- Vou preparar um lanche pra gente. – falou Ana.
- Vai lá. Vou ficar mais um pouco por aqui.
- Tudo bem – respondeu – mas não demore muito, ok?
- Sim, senhora.
- Bobinho. – falou e avançou por cima de mim, beijando-me. Saiu apressada da banheira. Depois, se enxugou superficialmente e vestiu um roupão.
Fiquei sozinho na banheira. A água ainda estava quente. A garrafa de vinho ao meu lado, no chão. Quase no final. Completei a minha taça e recoloquei a garrafa em seu lugar, Olhei ao redor para ver se havia algum cigarro. Estavam no quarto, me lembrei, na minha camisa. Pensei em pedir que Ana me trouxesse o maço, mas deixei para lá. Recostei a cabeça no apoio da banheira e imergi meu corpo dentro dela. Os olhos se fecharam. Aquela tarde havia sido agitada e me sentia cansado. Comecei a pensar na coisa toda. Naquele meu dia. Logo que saí da faculdade de Camila, fui direto para a editora. Fiquei apenas duas horas no escritório. Comecei a ler alguns esboços, mas foi impossível. Lixo! Apenas Lixo. Quando já estava ficando nauseado além da conta, Ana apareceu. Fechei a porta do escritório e a segui até o subsolo. Entramos no carro e viemos direto para o seu apartamento. No caminho, ela sorria, sorria, sorria. Parecia feliz. Eu estava longe. Pensava em Camila. Era estranho! Era absurdo! Era idiota! Mas eu estava sentindo uma espécie de saudade, mesmo ainda não tendo a conhecido. Só a foto, só o livro. Sua imagem obsediava minha mente. Precisava saber mais. Era como se fosse possível absorver numa espécie de osmose a sua confusão, sua dor. Já no apartamento, descobri assustado que Ana me amava. Agarrou-me e fomos direto para o quarto. Ela na cama se contorcendo como uma serpente. Disse que gostava da sensação de sentir a minha boca deslizando por todo seu corpo. Chafurdando, talvez fosse o termo mais adequado. Terminamos cansados, suando. Cada um se abandonou num canto da cama. Acendi um cigarro. Um sorriso de saciedade. Mais algumas palavras. Que me amava e coisas do gênero. Não prestei atenção, acho que não prestei atenção. Pensava ainda em Camila. Pensei nela o tempo todo. Saí da cama e me enfiei na banheira, precisava ficar só, precisava pensar. Mas Ana veio ao meu encalço e mergulhou na banheira junto comigo. Só consegui um pouco de paz no momento em que se ofereceu para nos preparar um lanche. Já estava quase adormecendo, numa agradável sensação de torpor, mas logo ela gritou dizendo que tudo estava pronto na sala. Saí da banheira e coloquei cauteloso os pés no ladrilho ainda molhado. Enxuguei meu corpo com uma toalha e também vesti um roupão. Caminhei rumo à sala. Encontrei Ana esparramada no tapete, ao lado de uma mesinha de vidro. Sobre essa mesa, uma garrafa de vinho, pedaços de um pão italiano cortado em fatias e uma bandeja com as mais variadas besteirinhas. Sentei no chão, ao seu lado. Experimentei um pedaço de queijo. Bebi um gole de vinho, mas resolvi que precisava de algo mais forte. Abri uma garrafa de uísque e despejei uma grande dose no meu copo. Ana despiu-se do roupão e ficou nua.
- Tire o seu também. – pediu ela.
Obedeci e Ana se aproximou. Deslizei uma das mãos pelo seu rosto e toquei em um dos seus seios.
- Gosto deles. São duros e não muito grandes. – comentei.
Ela riu.
- Não sabia que você era um especialista em peitos. Um perito.
Sorri e a beijei. Bebi uma dose de uísque. Estava quente. Peguei duas pedras de gelo e as joguei no meu copo.
- Onde estão os cigarros? – perguntei.
- Acho que no quarto. – disse Ana.
- Por que você não vai até lá pegá-los pra mim, quer dizer, pra gente?
Ana levantou e foi até o quarto buscá-lo. Olhei para um dos quadros da parede. Ninfas brincando juntas num bosque. Nuas.
- Aqui estão. – disse Ana, jogando o maço sobre a mesa, ao lado do meu copo.
Acendi o cigarro e continuei observando as ninfas. Ana acompanhou o meu olhar.
- Gostou do quadro? – ela perguntou.
Uma forte trovoada. Olhei para o céu. Relâmpagos iluminavam esporadicamente as nuvens. As cortinas do apartamento fronteiriço ao nosso balançavam num ritmo frenético.
- Então você gostou do quadro? – perguntou Ana novamente, irritada com meu silêncio.
- Gostei. As ninfas são bonitas.
- Sou sua ninfa. – ela disse.
- Não, não é. É Circe. Uma maligna feiticeira e quer me transformar em um porco.
Instintivamente Ana cobriu os seios com as mãos. Olhou para mim ressentida e comentou:
- Às vezes você é estranho. Diz coisas estranhas.
- Estou brincando. – comentei, aproximando o meu corpo do seu.
Ela se acomodou e deixou a cabeça recair no meu ombro. Acariciei as suas costas.
- Isso é tão bom! – disse Ana.
Olhei o relógio. Duas da manhã. No dia seguinte continuaria minha busca por Camila
- Vem, vamos lá, vamos nos deitar. – falei pra ela, meio entediado.