Há Tempos Já Estava Morta Por Dentro.



O lugar era alto, o silêncio era quase total.
Um ouvido mais atento seria capaz de identificar
o som das ondas batendo nas pedras lá embaixo.
O vento gelado dava movimento ao seu cabelo cacheado,
as roupas escondiam as marcas de uma violência de muito tempo,
antigas, recentes, se misturavam em tristes cores variadas.
Do roxo ao avermelhado, lisas ou com alguns pontos,
variavam de acordo com o que fora usado para feri-la.
Olhando as luzes da orla da praia ao longe,
fez mentalmente um filme da própria vida. 
(Que vida? Se há tempos já estava morta por dentro)
Precisava desesperadamente finalizar esse filme.
Com as mãos trêmulas pegou o papel e a caneta,
no escuro depositou suas palavras na folha em branco.
O coração batia descompasado, faltava-lhe ar,
e talvez tivessem dificuldade para entender o que havia escrito.
Cuidadosamente dobrou o papel recém preenchido,
juntou à um outro, escrito com uma caligrafia masculina onde se lia:
"Se pensar em me deixar, eu te mato, então desista."
Amarrou ambos com uma fita vermelha, sua cor preferida.
Prendeu-os ao galho de uma árvore,
que durante o dia oferecia sombra a quem buscasse um pouco de paz.
Olhou mais uma vez a cidade iluminada, não voltaria atrás,
queria libertar-se. Saltou.
No dia seguinte, encontraram seu corpo sem vida preso às pedras,
e jovens que visitavam o mirante da cidade, se depararam
com as duas cartas presas à árvore,
uma delas com caligrafia feminina, 
dizia:
"Não me julguem, sem saber o tamanho da dor que eu sentia."

 
 
 
 
 
Sandra Ribeiro
Enviado por Sandra Ribeiro em 26/08/2011
Código do texto: T3182764
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