O aniversário de casamento.
Era quase meia noite. Ele estava atrasado. A mesa estava posta: os pratos brancos de porcelana estavam nas extremidades, juntamente com os talheres de prata, os guardanapos de seda e as taças de cristal; No centro da mesa estava o candelabro de ouro e o mais caro vinho tinto italiano. O escargot esfriava na cozinha. A paciência e confiança dela se esgotavam a cada segundo.
Após duas horas de espera, ele finalmente aparecera em casa. Ele mentiu outra vez. E lá se fora o aniversário de casamento. Ele a beijou, mas nem sequer tocou na comida, foi direto se deitar. Embora quase todo o prédio estivesse sentindo o aroma do escargot, o único cheiro que ela sentia era o da mentira.
Ela sentou-se à mesa, chorou por um instante e apagou as velas. Foi até a cozinha e depois se dirigiu ao quarto. Ela não acendeu a luz para não acordá-lo. Cautelosamente, ela subiu na cama, levantou um pouco do vestido, abriu as pernas e sentou-se em cima dele. Ele abriu os olhos, mas não teve tempo de dizer palavra alguma. Ele apenas sentiu a lâmina fria da faca adentrando seu estômago... Uma, duas, três, quatro vezes... As mentiras não mais saltaram de sua língua, uma vez que o sangue que agora escorria de sua boca tomara para sempre o lugar delas.
Ela permaneceu lá por alguns minutos, admirando a cena, com seu vestido de cetim azul turquesa ensangüentado, os lençóis brancos de algodão egípcio encharcados, suas mãos, pernas e braços sujos e sua respiração ofegante. Ela encarou a faca, com seus olhos castanhos repletos de orgulho, maldade e satisfação; sorriu e lambeu o sangue da lâmina, para sentir o gosto de sua vingança. Depois, ela levantou-se, limpou suas mãos e seus sapatos, foi até a cozinha, serviu-se de escargot e do vinho tinto, acendeu as velas e aproveitou com êxito o seu jantar.