O MURO
Aquela não era a primeira vez que eu passava por ali. Mas, das outras vezes, não tivera a curiosidade de observar os detalhes que compunha aquele paredão, que parecia querer atingir o céu, tal era sua altura.
Segundo alguns, ele devia ter mais de cinco metros e outros o chamavam de “muro de prisão”, devido à altura e solidez e pelo modo como ele havia sido construído.
Fiquei parado por mais de trinta minutos, observando cada detalhe, enquanto ia imaginando quem tivera idéia tão absurda, de construir muro tão alto, no centro de uma cidade como aquela. Ele cercava uma quadra inteira e perfazia uma área de mais ou menos 10.000 metros quadrados.
Como a curiosidade foi aumentando, procurei falar com um senhor que morava em frente ao muro, no outro lado da rua. Depois de cumprimentá-lo, perguntei:
- Meu caro, por acaso o senhor sabe a quem pertence esta área cercada pelo muro. E complementei. Será que existe alguma coisa guardada por traz destas paredes?
Ele olhou-me detidamente e depois respondeu:
-Por que quer saber?
-Somente por curiosidade, já que uma obra desta deve ter custado muito caro e se nada é guardado por traz das paredes, acho um desperdício de tempo e dinheiro.
- Depende!
- De quê?
- Do ponto de vista e dos valores de cada um.
- Sinto muito, mas não entendi o que quis falar.
- Olhe rapaz, eu já moro aqui há mais de vinte anos, e quando cheguei aqui, ele já estava lá. Ele parou alguns segundos e antes que eu falasse novamente continuou. E olhe que durante todo este tempo, você é a primeira pessoa que vem perguntar sobre ele.
Vendo que seria difícil arrancar mais alguma coisa do ancião, tentei ainda mais uma vez, com outro argumento.
- É realmente uma obra fantástica, por acaso sabe a quem pertence a área?
O velho que parecia não querer conversa foi logo me interrompendo com a frase:
- Olhe moço, você está sendo muito curioso e abelhudo, não se esqueça que curiosidade demais pode matar.
E, antes que eu pudesse responder a frase que ele havia dito, virou-se e, abrindo o portão da casa onde morava, entrou e após fechar o portão, ouvi-o resmungar:
- Tem cada um, porque não vai cuidar da própria vida?
Sem entender nada do que estava ocorrendo, ainda fiquei ali por alguns minutos, sentido que alguém estava me observando de algum lugar. O pressentimento era tão grande, que meu sentido de preservação dizia: Saia logo daqui, o mais rápido possível.
Entrei apressadamente no carro, no momento que um forte arrepio passou por meu corpo. Senti meus pelos ouriçados, por medo e por um pavor insano que naquele momento se apoderou de mim.
Sai apressadamente, sem, no entanto, deixar de olhar pelo retrovisor do carro. Foi naquele momento, que pensei ter visto uma figura se afastando do paredão, indo em direção à casa do homem com quem eu tentei conversar.
Quando cheguei ao outro quarteirão, parei o carro e, após sair dele, olhei para traz e vi que a muralha se destacava no cenário de casas simples e humildes que haviam sido construídas no bairro, em torno do muro.
Fiquei ali ainda alguns minutos e, estava tão absorto, em olhar o muro, que não vi uma senhora de meia idade que ao se aproximar foi dizendo:
- Fantástico, não?
- Sim, é uma obra bastante interessante, mas, cheia de mistérios.
- Em parte você tem razão.
- Por que em parte? Por acaso a senhora sabe alguma coisa sobre quem construiu o muro?
- Bem, o que sei ouvi do meu pai.
- E o que o seu pai dizia sobre o muro?
- Olhe moço agora não tenho tempo para conversar, preciso ir ao médico. Parou por alguns segundos e depois complementou como se fosse um modo evasivo de dizer até logo:
- Estou com hora marcada.
- Onde posso encontrá-la depois, para saber detalhes do muro?
- O Senhor tem um cartão aí?
- Sim, por quê?
- Me dê um, depois eu o procuro e falo tudo o que sei.
Retirei da carteira um cartão, entreguei-lhe e depois fiz várias recomendações no sentido de ela não se esquecer de procurar-me. Ela despediu-se e andou apressadamente rumo a uma clínica que havia ali perto. Quando desapareceu na esquina, entrei no carro e voltei ao escritório, para continuar minha rotina. Eu tinha esperança que aquela senhora, viesse falar-me sobre o segredo do muro.
Por mais de vinte dias esperei que a mulher me procurasse para falar sobre o que sabia do muro, e, ainda assim, todos os dias, eu passava em frente a ele, observando-o, como que esperando que alguém saísse dele e viesse ao meu encontro, falar tudo o que eu queria saber sobre a construção.
Numa destas passagens em frente ao paredão, vi o velho que morava em frente a ele e antes que eu me aproximasse para conversar, entrou apressadamente em casa e fechou o portão.
Não satisfeito com a atitude do ancião enfezado, resolvi procurar em todas as casas vizinhas, para saber onde eu poderia encontrar alguém para esclarecer minhas dúvidas e até mesmo dizer-me a quem pertencia a área cercada. Depois de mais de cem tentativas infrutíferas, fui até a prefeitura para saber em nome de quem, estava sendo lançada à cobrança anual do IPTU.
Depois de horas de espera, consegui saber que a área pertencia a Joaquim dos Santos e o endereço dele era o mesmo onde estava o muro.
Depois de esgotar todos os meios possíveis de identificar o dono da área, para conversarmos, eu ainda fiquei mais uma semana parado, esperando que a senhora aparecesse, para dar-me as informações que eu queria.
Quando venceu o quadragésimo terceiro dia, voltei à rua onde morava o senhor com quem eu falei na primeira vez, e depois de muita insistência, consegui que ele me recebesse.
Entramos e ele pediu que eu me sentasse. Enquanto eu me acomodava num velho sofá que havia no canto da sala, ele saiu para atender ao telefone que começava a tocar. Quando ele afastou-se, observei de relance os detalhes do ambiente onde eu me encontrava. Embora bem arrumado e limpo, era bem pobre.
Quando ele retornou, ofereceu-me café, mas recusei, no entanto, disse que gostaria de um copo com água. Minutos depois, uma senhora que deveria ser a esposa do “velho ranzinza”, trazia uma bandeja com um copo com água gelada. Depois de cumprimentá-la e agradecer pela gentileza, peguei o copo e fui bebendo o líquido lentamente, enquanto meu anfitrião se acomodava numa cadeira perto da televisão, num canto da sala.
Depois de eu haver ingerido toda a água, ele iniciou a conversa que eu tanto desejava ter.
- Mas, o que realmente o senhor deseja saber sobre o muro?
- Na realidade, senhor, eu desejo conhecer o proprietário, pois represento uma empresa que precisa de uma grande área para construir uma loja de departamentos na cidade. E, tentando animar ainda mais o ancião, falei: Se conseguisse realizar um negócio desta monta, todos iriam ganhar.
- Ganhar o quê?Perguntou-me o velho.
- Se construírem uma grande loja aqui, todos os imóveis nas imediações serão valorizados e é lógico que isso irá trazer muitos benefícios sociais.
- Ou desassossego!
- Como?
- Olhe moço, o progresso pode até ser bom para alguns, mas para outros ele traz transtornos.
- Por que e o senhor acha isso?
- Olhe, eu nunca vi chegar o progresso, sem vir com ele os aproveitadores, ladrões e toda sorte de mazelas sociais. E, além disso, pode acontecer que um dia, eu nem possa sair de minha casa, porque alguém estará ocupando a saída da garagem onde guardo meu velho carro.
- É, se olharmos somente sobre estes aspectos o progresso é danoso, mas não podemos deixar de ver os inúmeros benefícios que ele traz. O emprego é o principal, sem contar com o conforto que o senhor poderá ter por morar tão perto de um comércio próspero.
- Bem, moço o senhor não veio aqui para filosofar nem para defender uma tese econômica de aspecto capitalista! Ou veio?
- Não, senhor, eu desejo saber a quem pertence a área, para entrar em contato com o ele e saber se há interesse em vendê-la ou mesmo arrendá-la para a construção da loja.
- Está bem, volte a semana que vem que eu vou tentar falar com ele e saber se há interesse em recebê-lo para conversar.
Quando ele disse aquilo, em não cabia em si de contentamento, mas não deixei transparecer para não azedar meu interlocutor que fora tão difícil de amansar.
Quando completou uma semana de nossa conversa, voltei à casa do dele, para saber se ele havia obtido a resposta do proprietário do imóvel. Após apertar a campainha por várias vezes, surgiu a esposa dele, que antes mesmo que eu abrisse a boca, foi dizendo:
- Moço, volte à semana que vêm, pois o meu marido ainda não voltou da viagem que fez, para tratar do assunto de vocês.
Eu, querendo saber mais alguma coisa, tentei despistar e perguntei:
- Ele viajou para longe, ou é aqui perto?
- Olhe, eu não sei responder, isso para mim também é um mistério.
- Está bem, obrigado, voltarei na próxima semana. Até logo!
Entrei no carro e retornei ao escritório, para tratar de outros assuntos, já que a história do muro teria que ficar parada, por uma semana ou mais.
Dias depois, ao passar pela rua do “velho ranzinza”, eu o apelidara assim, vi-o saindo de casa, acompanhado por uma mulher. Parei o carro e fiquei observando de longe para ver o que poderia descobrir com minha atitude de detetive de tocaia. Por mais de quinze minutos eles conversaram na porta da residência e somente depois de dez minutos que a mulher se retirou, eu arrisquei chegar até a casa para dar continuidade a nossa conversa e saber se ele já tinha uma resposta para mim.
Apertei a campainha e alguns minutos depois ele apareceu e, logo que me viu, foi dizendo:
- Pode entrar que eu tenho notícias para você.
Naquele momento, meu coração disparou de emoção, pois enfim eu poderia ter uma resposta e saber tudo o que queria sobre o muro.
Entramos e, como já me sentia mais familiarizado com o ambiente, antes mesmo que ele pedisse que me sentasse, tomei assento no mesmo sofá da vez anterior e aguardei que ele iniciasse a conversa.
Ele chamou a mulher que deveria estar em algum lugar da casa e, quando ela chegou, ele falou de forma incisiva, como se fosse uma ordem:
- Traga dois sucos para nós.
A senhora, sem retrucar ou esboçar qualquer reação apenas aquiesceu com um frágil:
- Sim.
Ele sentou-se no mesmo lugar da vez anterior e foi logo ao assunto, antes mesmo de esperar o suco que mandara a mulher trazer.
- O senhor disse que tem alguém interessado na área murada, não é mesmo?
- Isso mesmo, respondi.
- E esse pessoal, tem dinheiro suficiente para comprar uma área tão valorizada como esta?
- Claro, eu acredito que sim, o grupo possui várias lojas de departamento espalhadas pelo país e acho que dinheiro não é problema. E arrematei: É lógico que o preço tem que estar dentro do que o mercado paga.
- Pois é, falei com o dono do imóvel e ele disse que poderá conversar com você, se for algo concreto e não apenas uma jogada especulativa de algum grupo, para apropriar-se da área dele.
- E como faço para falar com ele?
- Ele disse para o senhor deixar o endereço, que ele entra em contato no momento certo.
Naquele momento a esposa do “velho ranzinza”, chegava com a bandeja e sobre esta, dois copos de suco de caju.
Bebi todo o conteúdo e quando ia devolver o copo, senti que estava perdendo o controle dos meus movimentos e antes mesmo que eu pudesse entender o que acontecia, ouvi o velho dizer para a mulher:
- Pegue logo o copo antes que caia e vamos esperar alguns minutos para ver o resultado com a chegada dele.
Eu sabia que havia sido drogado e mesmo com todo o esforço, não consegui manter meus olhos abertos e ficar consciente e, naquele momento, um pavor enorme tomou conta de mim. Mas, já era tarde.
Fui abrindo os olhos lentamente, porém o ambiente onde me encontrava era outro totalmente diferente daquele onde estivera antes de sucumbir ao efeito do sonífero. A sala era enorme, os móveis embora antigos, eram de boa qualidade e bem conservados. Na parede em frente onde eu me encontrava deitado no sofá, havia uma cópia da Monalisa. Seu sorriso, para mim, parecia ser de escárnio, pela esparrela em que eu entrara. Em pouco tempo fiquei totalmente desperto, sentei-me e fiquei alguns segundos observando os detalhes da enorme sala onde eu estava e antes que completasse minha análise, ouvi o som do pigarro que vinha de um barzinho que havia no canto da sala.
Sentado num banquinho, por traz do bar, um ancião, de cabelos totalmente brancos, olhava-me com curiosidade, esperando que eu tomasse qualquer atitude ou o interpelasse.
Eu, que me encontrava em desvantagem no momento, só consegui dizer duas palavras:
- Onde estou?
Ele, no entanto, foi logo direto ao assunto.
- Você queria falar comigo? Perguntou ele.
- Depende, se o senhor é o dono da área murada, sim. E conseguindo coordenar mais minhas idéias, continuei:
- Afinal que lugar é este onde estamos?
- Minha casa, por detrás do muro.
- Olhe meu caro senhor, não vai querer fazer-me acreditar que esta casa fica situada por detrás do muro. Respirei fundo e continuei: Estive observando o muro todo pelo lado de fora, e não existe nenhuma porta ou portão para entrar ou sair. Como pode ser isso?
- Olhe jovem curioso, nem sempre os caminhos que vemos existem. Outros são os que existem e não vemos.
Parecia que o velho era afeito aos enigmas, pois antes mesmo que eu conseguisse interpelá-lo, continuou.
- Nem sempre seguimos os caminhos que desejamos, outras vezes, só vamos pelos caminhos mais tortuosos. Hoje em dia, estamos tão cegos pelo dinheiro e o poder, que ainda não conseguimos encontrar o nosso próprio caminho.
Depois das falas enigmáticas, ele fez uma pausa, colocou bebida nos copos que havia sobre o balcão do bar e ofereceu-me, mas eu recusei. Eu não queria entrar noutra fria e ser drogado. Ele pareceu entender minha preocupação e disse:
- Não se preocupe você só foi drogado para chegar até aqui sem conhecer meus caminhos.
- Afinal que caminhos são estes, o senhor fala muito e eu nada entendo. Por favor, explique melhor o que deseja dizer.
- Calma você tem a vida toda para viver e não precisa se preocupar com nossos caminhos. Sim, nossos, porque eles também já fazem parte de si.
- De mim, não estou entendendo?
- Logo irá entender, quando eu passar-lhe o comando deste lugar para você.
- Meu senhor, por favor, fale direto sem enigmas, pois, até o presente momento ainda não entendi nada e não estou aqui para decifrar suas charadas..
- Meu caro, os enigmas agora são seus. Chegou a hora de aposentar-me e passar para outro o comando deste mundo particular.
- Ainda não consigo entender sobre o que fala.
- Pois bem, sempre que vem alguém aqui, para tratar de assunto relacionado ao muro, o ocupante do espaço “entre muros”, ou seja, tudo que existe aqui passa a pertencer e ficar sob a guarda do visitante, enquanto o antigo morador se aposenta, ou melhor, se ausenta do espaço.
- Olhe, parece que há um grande equivoco, eu não vim para ficar, tampouco desejo assumir o seu lugar aqui. Eu vim para tratar de negócios, ou seja, sobre a venda desta área.
- Mas, esta área nunca esteve à venda e nunca estará. E complementou: Vou passar meu domínio para você gratuitamente.
- Então o que estou fazendo aqui afinal? O senhor mandou dizer que deseja tratar do assunto comigo!
- Sim disse que deseja falar contigo, mas nunca disse que desejava vender nada.
Naquele momento eu sabia que começava para mim um pesadelo, ou talvez eu ainda estivesse dormindo sob o efeito do sonífero, por isso vivia aquele pesadelo particular. Enquanto assim pensava, ele levantou-se de onde estava e disse-me:
- Acompanhe-me, quero mostrar-lhe tudo.
Sem contestar, levantei-me e fui seguindo-o por todos os espaços do enorme casarão. Visitamos cada compartimento da casa, enquanto ele ia falando da utilidade de cada um dos cômodos. Depois saímos para a área externa e lá, o horizonte se estendia até onde eu podia enxergar. Parecia que não havia fim e embora olhasse em todas as direções eu não vi muro algum. Por alguns segundos pensei: “Esse senhor deve estar caduco, esta casa e todas estas terras, jamais poderiam estar dentro de uma área tão pequena como aquela que é cercada pelo muro”.
Ele, mais uma vez, parecendo adivinhar o meu pensamento disse:
- Já lhe disse que nem tudo é o que aparenta, embora existam caminhos, nem todos podem trilhá-lo, e mesmo que não sejam vistos, eles existem, em espaços e dimensões diferentes, de acordo com as necessidades momentâneas.
Depois de andarmos por muito tempo nas redondezas da casa, observando o enorme pomar e as plantações que se entendia em todas as direções.Então ele disse-me:
- Devemos voltar, o meu tempo é chegado.
- Senhor, por favor, diga-me em que rumo devo seguir, para voltar para minha cidade, que deve ficar aqui perto.
Ao que ele respondeu:
- O único caminho existente, você ainda não poderá trilhar, e mesmo que ande por estas terras, a vida toda, em qualquer direção, jamais irá chegar onde pensa que está sua cidade.
Ele parou de falar, sorriu e enquanto se dirigia para dentro de casa, disse-me:
- Venha, quero passar-lhe todos os detalhes da propriedade, para que você conheça totalmente as potencialidades dela.
Entramos, ele foi até uma estante, pegou um enorme livro, que deveria ter no mínimo duzentas páginas e antes mesmo que eu pudesse falar, colocou-o em minhas mãos e disse-me:
- Assine e tome posse de tudo que está aqui, como seu. Parou alguns segundos, coçou a cabeça branca e depois arrematou:
- O único modo de sair daqui, é por onde me vou, e você, só poderá seguir este caminho, quando completar seu tempo.
Mesmo sem entender ou poder contestar o que ele falava, peguei a caneta que ele me estendia, abri o livro onde havia escrito termo de posse e logo abaixo deste, um espaço para assinatura. E foi ali, que aceitei por livre e espontânea vontade, a minha reclusão.
Depois de assinar o termo, mesmo sem ler, ele pegou o livro e colocou-o na enorme estante que havia perto do bar ao lado do quadro da Monalisa, que, naquele momento, parecia gargalhar da esparrela em que eu havia entrado. O anfitrião querendo encerrar nossa conversa disse:
- Sempre que houver alguma dúvida de como fazer alguma coisa, é só chamar os serviçais e estes irão esclarecer os detalhes.
- E porque o senhor mesmo não faz isso? ?Interpelei-o.
-Sorrindo, ele respondeu.
-Tudo isso exige muito tempo e o meu é pequeno. As dúvidas irão surgir durante sua estadia aqui.
Eu, naquele momento, tinha perdido a vontade e nem mesmo sabia quem eu era, por isso, nem mesmo protestei, quando o vi desaparecer parede adentro. Ao sentir-me só, tentei segui-lo, mas, fui de encontro a uma sólida parede que impedia minha passagem.
Por mais de hora fiquei parado observando como abobalhado, tudo aquilo, sem entender o que estava acontecendo comigo. Quando comecei a sentir fome, tilintei um pequeno sino que havia sobre a mesa e imediatamente surgiu uma mulher com trajes de governanta que ao entrar foi dizendo:
- Deseja que seja servido o almoço agora, senhor?
-Sim. Respondi secamente, como se ela fosse culpada por alguma coisa.
Durante o almoço, enquanto eu comia, ela acompanhada por outra mulher, ficou o tempo todo em pé esperando novas ordens.
Terminado o almoço, ousei perguntar:
- Você pode-me dizer como sair daqui?
- Sim, senhor, basta ler os livros.
- Qual deles? Perguntei.
- Todos senhor, começando do número um até o último, sem pular nenhum e nem mesmo uma letra.
Olhei novamente a estante e vi que nela deveria mais de uma centena de livros e como não queria ter o trabalho de contar, perguntei:
- Quantos são?
- Duzentos e vinte e dois, senhor.
Depois do que eu ouvi, comecei a entender o ocorrido e mesmo que ainda não fosse tudo, tinha toda a vida para ir me acostumando, ou, até que outro curioso ousasse intrometer-se nos assuntos alheios e procurasse saber o que havia por detrás do muro. Enquanto isso não acontecesse, o melhor era ir procurando me acostumar para conhecer os detalhes e os caminhos que deveria seguir a partir daquele momento.
E foi assim, que fiquei naquele mundo por mais de quinze anos, até que um dia recebi a notícia que havia alguém interessado em saber o que havia por detrás do muro. Graças àquele incauto eu consegui trilhar o meu caminho de volta. Hoje posso relatar apenas parte do que aconteceu comigo, embora eu saiba que muitos pensarão que tudo é apenas fruto de minha imaginação.
03-10-09-VEM