Ratos

O nome dele era Himller, considerava-se gaúcho mas era natural da Alemanha,testemunha viva do nazismo,veio para o Brasil com 5 anos de idade acompanhado dos seus tios paternos, Anette Luncher e Rudolf Luncher responsáveis por sua guarda,seus pais não puderam acompanha-lo tendo em vista que estavam mortos,não eram judeus,eram alemães puros e perfeitos como o fuhrer queria que todos fossem, mais uma guerra mata dos dois lados.

Foi no dia 29 de janeiro de 1945 quando o exército vermelho, como era conhecido o exército da União Soviética,marcharam sobre Stallingrado prendendo e matando os últimos remanescentes do exército alemão, e um desses era o coronel Ernes Frans Himller pai de Albert Himller e responsável pela unidade de abastecimento de munições e mantimentos das tropas. A morte de seu pai também culminou na partida de sua mãe,não só os chefes e soldados eram mortos mais todos aqueles que resistissem a nova ordem.

Esses episódios o forçaram a sair da Alemanha derrotada,ficou a mercê do destino que seus tios lhe dessem, e esse destino foi o Brasil.

Himller muito inteligente e prematuro formou-se aos 18 anos em direito mas preferiu seguir um estilo de vida mais recluso no interior do Rio Grande do Sul onde havia comprado uma fazenda com 20 cabeças de gado,além de inteligente era um negociador nato,arriscou-se inúmeras vezes vendendo,trocando,leiloando suas cabeças,depois de 5 anos já era dono de um dos mais numerosos rebanhos do Brasil,apesar de ser um empresário muito competente essa não era sua marca,o que fazia com que todos se lembrassem dele era o seu gênio difícil,Himller era sinônimo de arrogância,prepotência e inguinorância,dois meses era o máximo que seus contratados aguentavam nas suas mãos,pelo menos os peões que trabalhavam na fazenda matriz onde ele residia,nessa matriz ele fazia questão de acompanhar todo trabalho de perto como gerente imediato ,daí o apelido dado a fazenda de inferno alemão,ele nunca se preocupou com a fama negativa de sua fazenda e muito menos com o que pensavam seus funcionários, sempre teria mais a ser contratado quando aqueles desistissem.

Em um domingo pela manhã o velho Himller mesmo com o peso da idade nas costas estava verificando a situação dos pastos e viu que tinha trechos do cercado danificado, de imediato sem pensar duas vezes convocou todos os seus peões que também residiam no alojamento da fazenda,levou-os para o pasto colocou todos perfilados cercados por touros, e com toda sua fúria já conhecida berrou para que todos ouvissem.

-Quem é o responsável pela manutenção das cercas ?

Foi como um trovão que fez esta pergunta, e talvez por causa do susto o sujeito requisitado se manteve oculto.

-Cadê o guri das cercas porra?

Depois de tremer o chão com mais essa interrogação,uma voz tremula e falha é ouvida ao fundo.

-Sou eu senhor.

-Vem cá.

Com as pernas tremendo garganta seca,e a certeza absoluta que iria ser humilhado na frente de todos,o rapaz se aproximou do patrão.

-Como é teu nome?

-O pessoal me chama de russo senhor.

-Tu não tem nome não guri?

-Tenho sim senhor.

-E como é teu nome nome porra?

-Francisco Ribeiro das Chagas, mas o senhor pode me chamar de russo.

-Eu vou te chamar pelo teu nome,seu rato.

-Sim senhor, como o senhor achar melhor.

-Tu é de onde?

-Sou do Ceará

-Um russo cearense.....tu viu os buracos no cercado?

-Vi não senhor deve ser recente

-Tu concerta a porcaria desse cercado se não quiser voltar pro teu barraco no nordeste com as mãos vazias e ainda devendo as cabeças de gado que venha a escapar por esta cerca,entendeu?

-Sim senhor

Aquela seria a última vez que o russo falaria com seu patrão. Todos foram dispensados e voltaram para seus respectivos alojamentos com as cabeças baixas .

São dez horas da noite na fazenda, ouvi-se apenas o mugido dos bois e algumas conversas de peões sem sono,na casa principal Himller perambula sozinho pelos compartimentos vazios após ter feito sua refeição noturna,vai para o quarto e deita-se ,quando seus membros relaxam e seus olhos começam a fechar, o silêncio da noite é interrompido por um barulho repentino no telhado.

-Ratos imundos .Balbuciou e voltou a tentar dormir.

E como em um piscar de olhos o velho acorda com a respiração ofegante,não consegue ver nada e nem mexer suas pernas e braços, a única coisa que escuta são orações e lamentos, além de um forte e enjoado aroma de flores,desesperado com a situação que não conseguia entender, tentava fazer barulho mas ninguém o escutava,era como se estivesse dentro de uma espécie de caixa que começava a se balançar enquanto deslocava-se em um movimento descendente até encontrar uma base firme,provavelmente o solo,o silêncio toma conta do ambiente por alguns segundos, até ser interrompido por uma voz.

-Que os anjos o levem até os braços de nosso senhor e que tenha seus pecados perdoados,seja admitido no seio de nosso senhor Jesus Cristo, Amém.

Aplausos tomam conta do ambiente externo, e internamente o velho Alemão escuta algo que é jogado sob aquela suposta caixa onde está preso,o som do impacto sobre a madeira deixava bem claro para quem escutava bem de perto,era terra,era terra que estavam jogando.

A terra não parava de cair, o ar já estava começando a lhe faltar ,suas pernas não o obedeciam, a terra caia ,a voz falhava, seus gritos eram mudos,seu pulmão implorava oxigênio e não era atendido,o velho fazia preces que não eram ouvidas,o ar não mais existia ali dentro,mas a vida sim.

Até que a velha casa da fazenda ecoa por suas paredes um grito de alívio e medo,era Himller que sentado na cama com as pupilas dilatadas e corpo suado tentava organizar sua respiração,e aos poucos foi tomando conhecimento de que estava vivo e que tudo não tinha passado de um pesadelo,então tomou um pouco de água, deitou-se novamente e voltou a dormir.

Novamente ouve-se um barulho no telhado

-Ratos imundos.

Repetiu o velho Himller e voltou a dormir,um sono que durou pouco mais de dez minutos pois foi interrompido por um frio repentino,era a janela que estava aberta,não lembrava-se de ter esquecido de fecha-la mas levantou-se e foi concertar seu possível erro,quando chega que levanta os braços para baixa-la sente uma dor nunca sentida antes,um impacto agudo e frio na sua garganta,com uma das mãos segura a janela e com a outra tenta descobrir o que o faz sentir aquela dor insuportável,numa fração de segundos a mão que segurava a janela é levada ao mesmo local que a outra está, e as duas sentem por igual uma faca enterrada por completo na sua garganta, o sangue foi escorrendo por seus braços e banhando seu corpo de rubro,aos poucos Himller tombou,foi ao chão após a faca ter sido arrancada de seu pescoço e lá ficou com o sangue lhe envolvendo e criando uma enorme poça no piso de madeira.

Bem perto dos estábulos um dos peões que ia passando observa algo e grita.

-Russo! Tá fazendo o que ai em cima da casa do homem?

-Nada,to só matando um rato .Respondeu enquanto colocava dentro das calças uma faca completamente ensanguentada.

Evalldo
Enviado por Evalldo em 08/04/2011
Código do texto: T2897245
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