O Bacamarte...

- Isto é inadmissível, Swanson! – bradou o Sr. Groetz, enquanto batia com a palma da mão numa mesinha de cedro, bem a sua frente.

Swanson limitou uma réplica ao mais absoluto silêncio. Abaixou a cabeça em sinal de respeito, pôs a mão direita no bolso da calça jeans, e aguardou mais alguma agressão verbal vinda de seu velho superior. O Sr. Groetz era o tipo de homem que apostaria todas suas fichas em um único cavalo, se ele se mostrasse capaz de vencer a corrida. Se aquele serviço que tinha obrigado o Tenente Swanson a fazer não havia dado certo, mas ninguém seria capaz de executa-lo. Tudo havia terminado, sem nem ao menos ter começado.

Calmamente, o velho Groetz, de cabelos ralos e dentes carcomidos, abriu a terceira gaveta de sua mesinha de cedro, e retirou um Bacamarte, sua arma de fogo preferida, de cano largo e curto, e apontou para o peito de seu filho Swanson, sem nenhum sinal de piedade.

- O que pretende fazer com esta arma, papai? - disse o tenente, enquanto recuava, com o horror visível em seus belos olhos verdes.

Desta vez, quem limitou as palavras foi o velho. Fechou os olhos com força, e, mesmo assim, acertou em cheio o peito esquerdo de Swanson, que caiu enxovalhando todo piso amadeirado. Após alguns segundos de lamentações, o velho Groetz abriu a última gaveta de sua mesinha particular e retirou um grande envelope dourado. Em seguida, colocou no bolso interno de seu terno Armani, e sumiu na escuridão à sua frente.

Treze anos depois, um menino de aproximadamente 8 anos de idade, corria alegremente por um bosque perto da aldeia onde morava. Era um garoto sem traços marcantes. Nem bonito nem feio. Daqueles que você pode ver por duas ou três vezes que não o reconheceria. Quando se aproximava da casa de taipa onde uma mulher sorridente o aguardava de braços abertos, chegou a seus ouvidos um estrondo, acompanhado de algo mortal.

O pequeno Lucas, poucos segundos depois, já não mais respirava.

Aquele barulho avassalador, convulsionou todos os habitantes da aldeia, que começaram a sair de suas casas, um a um para ver o que tinha acontecido. Logo, puderam perceber o que de fato tinha ocorrido. O menino mais querido da região havia sido baleado, e sua mãe, não parava de chorar com o garoto em seus braços.

- Vão chamar o Sr. Thomás - gritou uma mulher gorda, parada em frente ao corpo de Lucas. Várias crianças, apenas com calções remendados, correram em direção do lago, onde o velho Thomás costumava ficar em dias ensolarados como aquele. Contudo, quando chegavam perto, perceberam que um homem alto, esguio, apontava um Bacamarte na cabeça do velho. Uma das crianças, por pouco não soltou um grito. Só não o fez, porque o garoto mais velho do grupo o impediu a tempo. Depois de passado o susto, tentaram se aproximar em silêncio, tentando escutar algo do que o homem dizia ao Sr. Thomás.

- Tem se divertido nesta aldeia?

- Não seja tolo, você sabe que são apenas negócios.

- Huuuum. Negócios, gosto desta palavra!

- O que pretende fazer? Me matar?

O homem deu uma enorme gargalhada. Depois, tornou a falar com o velho.

- Exato. Vejo que continua muito inteligente, Thomás.

O velho Thomás, que encontrava-se ajoelhado no chão com as mãos para cima, apenas lhe lançou um olhar solicitando piedade.

- Ainda não consigo entender...

- Entender o que?

- Como é possível... - o velho não tinha forças para continuar a frase.

- Como é possível eu ter sobrevivido, papai?

- Por favor Swanson, não me mate!

Outra gargalhada nada divertida o tenente soltou.

- Pensou que trocando de nome e vindo morar neste fim de mundo eu não iria lhe encontrar?

- Eu nem sabia que você tinha sobrevivido, filho.

- Filho? Não me chame de filho seu velho estúpido. Um pai jamais faria comigo o que você fez, seu escroto.

Naquele instante, as crianças que observavam a cena tentaram sair dali para pedir ajuda. Porém, não imaginaram que ao tentar realizar esta manobra iriam fazer tanto barulho. Ao perceber suas presenças, de imediato, Swanson tirou do bolso de sua jaqueta vermelha uma granada e lançou em suas direções. Todos morreram na hora.

- Nããããããão - gritou o velho Thomás.

- Não? Não me faça rir. Isto não é nada, precisa ver o que fiz com meu irmãozinho.

Thomás levantou a cabeça num movimento abrupto.

- O que você fez com meu filho?

- O mesmo que farei com você agora - disse engatilhando a arma, pronto para usa-la.

- Não faça isso, filho - disse uma voz atrás de sua cabeça. A voz chegou juntamente com o clique de um Bacamarte sendo engatilhado em sua cabeça, e uma força tirando a arma de sua mão.

Swanson se virou, atônito.

- O que? Como isso é possível?

Ao terminar de fazer sua pergunta, o velho Thomás levantou-se, e juntamente com o Sr. Groetz, começou a sorrir animadamente.

- Como você é tolo filho. Sempre foi, aliás. Duas semanas após eu ter lhe baleado, obtive informações de fontes seguras que você não estava morto. Como bom fugitivo que é, sabia que nunca iria lhe encontrar. Então, numa jogada de mestre, armei esta pequena armadilha, sabendo que você buscaria vingança. Contratei um homem parecido comigo - disse apontando para Thomás - e paguei alguns trocados a uma mulher morta de fome para se passar por minha esposa.

- Golpe de mestre, chefe - disse Thomás.

O Sr. Groetz sorriu com o que seu sósia disse. Em seguida, apontou a arma em sua direção e atirou em seu peito esquerdo. Depois, caminhou até seu corpo inerte, e deu mais três disparos, desta vez em sua cabeça.

- Só para garantir que ele morra mesmo - disse com um riso sarcástico.

- Papai, só quero que saiba que não tinha intenção de mata-lo - disse Swanson chorando, mais uma vez com o horror em seus olhos verdes.

- Sei disso, meu garoto. Mas, eu tenho intenção em mata-lo.

Apertou com força a arma contra o peito esquerdo de Swanson, e disparou. Nos últimos instantes de vida, o tenente ainda teve forças de fazer uma última pergunta ao Sr. Groetz

- Oh seu velho de merda, o que continha naquele envelope dourado que você nunca me deixou ver?

O Sr. Groetz balançou a cabeça num sinal afirmativo. Chegou bem perto do ouvido do filho e disse:

- Agora vou embora. Se você resistir a mais este tiro que lhe dei, daqui a uma hora volto e te conto.

Pernambucano arretado
Enviado por Pernambucano arretado em 30/03/2011
Reeditado em 30/03/2011
Código do texto: T2879826