O soldado de East River

Estou prestes a pular da Ponte do Brooklin. Daqui do alto o Rio East River parece calmo. Os barcos parecem devagar e a brisa é indescritível. Algumas pessoas me observam. Talvez querendo identificar algum parente depressivo, que resolveu se matar no Feriado de Ação de Graças.

Gostaria de ouvir o hino nacional americano pela última vez. Afinal, há músicas que viram tema da nossa vida. No meu caso, ouvia todas às manhãs na escola primária, quando hasteava a bandeira sob a mira de olhares invejosos dos alunos. Mais tarde faria o mesmo no exército, onde cheguei a primeiro tenente. Até recebi uma medalha por bravura, por salvar a vida de um militar no Iraque. O sujeito pediu socorro pelo rádio e como a minha tropa estava próxima, fomos resgatá-lo. O resto do pelotão havia fugido. Prefiro omitir a vida de quantos homens interrompi. Fiz o necessário. Cumpri com o dever.

Abandonei a vida militar um ano depois. Tudo por causa da paternidade. Kate tinha medo de ficar viúva e ter que criar os filhos sozinha. Ainda mais um casal de gêmeos: Sofia e John. Logo arrumei trabalho em uma empresa de seguros. A renda era o suficiente e consegui sustentar a casa. Após sete primaveras o meu casamento terminou. O tribunal deu a guarda das crianças a Kate. Tal situação acabou comigo.

Consigo avistar o carro da polícia de longe. Acho melhor saltar agora. Não quero ser resgatado.

— Quem de vocês chamou os policiais?

— Todo mundo.

— Quem é você?

— Não importa. Desça daí. É perigoso.

— Jamais.

— Podemos te ajudar.

— Nem sabe os meus problemas.

— Então, conte.

— Afaste-se.

— Tudo bem.

Tenho medo. O que haverá do outro lado da vida? Quero acabar com os meus sofrimentos, mas... Se o inferno realmente existir as minhas dores não cessarão. Apenas desistiria dessa loucura, caso ouvisse a voz de Deus.

Faltam quinze minutos para a seis da tarde. As gaivotas devem voar de New York para Manhattan em instantes. O espetáculo sempre me agradou. Quando era criança encostava a bicicleta e admirava o vôo dos pássaros. O sentimento de liberdade tomava conta de mim.

Uma multidão me observa apreensiva. Ouça palavras de conforto. Aves cruzam o céu. Tento imitar tamanha beleza. Aprumo o peito perante o por do sol e entrego o meu espírito.

Herberth Brasil
Enviado por Herberth Brasil em 09/02/2011
Reeditado em 09/02/2011
Código do texto: T2782199
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