Belial
Hoje, a tarde me acordou barulhenta. Por mais quente que ela estivesse, eu tava com frio por conta do nervoso. As palavras, ou prefiro chamar de facas, não saiam da minha cabeça. Tava tudo lá ainda, encravado e provocando dor... Ai eu descubro que eu acordei de um sonho de novo.
Eu já sabia que ele não me amava, mas ainda sim eu fazia tudo pra manter ele sorrindo, sem perceber que o meu coração tava trincando aos poucos. Agora, com os cacos na mão, eu não tenho a menor vontade de colar de novo... A única vontade que eu tenho é de jogar tudo fora, deitar e dormir pra ver se a dor passa ou se pelo menos eu esqueço de tudo.
Então, algo dentro de mim estalou, levantei depressa e tomei um bom banho. Fazia tempo que aquele vestido negro não saía pra rua, então o vesti junto com o sapato estilo boneca de salto e fui fazer compania pra noite. As luzes refletiam nos meus brincos prateados e pareciam dar um contraste interessante com o batom vermelho, era tudo como eu não via há muito tempo. O pub estava cheio, rapazes e moças de todas as idades bebiam e se divertiam falando besteira e alguns mais altos choravam suas magoas ou cantavam suas alegrias... Um verdadeiro desperdício.
Peço minha Marguerita Frozen de morango e fico olhando aquele espetáculo de juventude mal aproveitada... Até que ele vem, cabelos longos e loiros como os de uma modelo, muito bem tratados, roupa meio social preta e o rosto de um anjo. Me disse que se chamava Michael. Acompanhou-me com um Scott duplo com gelo enquanto tentava me encantar com elogios e um vocabulário pra lá de formal... Eu diria até meio barroco.
Eu estava deprimida, queria que o mundo acabasse naquela noite, mas ele me convenceu que fazer sexo talvez fosse uma idéia mais plausível. Fomos a um motel bem caro... Ele fez questão de pagar tudo. O quarto era lindo, pétalas espalhadas por toda a parte e um perfume afrodisíaco no ar, estava tudo perfeito, como se já estivesse me esperando, o que obviamente me deixou desconfiada.
Transamos a noite toda ou até eu cair pro lado, exausta. No meio de meu sono, sonhei com todo o ocorrido da noite anterior, mas fui despertada por um leve movimento no colchão. Abri os olhos discretamente e olhei através do espelho meu algoz com uma faca tão reluzente quando as jóias que eu usava naquela noite. Ele não contava que eu tivesse um sono tão leve, ou talvez achasse que incenso fosse me fazer dormir profundamente, o que provavelmente aconteceu com as outras que tiveram o mesmo fim, sendo assim consegui faze-lo se desequilibrar na cama e pegar a faca dele.
O segundo em que eu consegui encravar aquela faca nas costas do maldito, foi uma mistura de vários sentimentos juntos, eu nunca havia matado ninguém na minha vida e agora tinha um cadáver na minha frente... E sangue em minhas mãos. Tirei a camisa dele para ver a profundidade do corte, talvez ainda tivesse um jeito de salva-lo (não que eu o quisesse de verdade, afinal tentou me matar primeiro) e me deparei com uma tatuagem interessante, algo parecido com um castelo ou qualquer coisa do tipo... Com um nome escrito em volta.
A polícia veio, a ambulância veio, os peritos. Duas semanas depois, eu era inocente e ele um serial killer procurado. Na minha cama, os pensamentos, antes de mágoa, agora se transformaram em líquido rubro escorrendo pelo meu rosto. Aquele anjo branco ganhou uma mancha vermelha nas costas e a culpa era minha, toda minha. As semanas passaram e eu ainda estava com aquela sensação, como se fosse algo tão emaranhado que não pudesse ser explicado por nenhum psicólogo. Como se fosse... Algo inimaginavelmente superior a um bom orgasmo.
Uma nova noite. O vestido apertado e curto exibia muito bem as minhas curvas e pernas, a gargantilha dava um toque de submissão a minha produção e as argolas chamativas junto com o bom e velho batom vermelho não deixavam dúvidas sobre o que eu queria... Ou pelo menos os fazia pensar isso.
Entrei dessa vez num strip bar, as garotas ficaram me olhando feio e todos aqueles homens estavam loucos para me provar. A pista ficou livre para o pessoal dançar, então dei meu show de pole dance, mostrando bem que por baixo do vestido não tinha absolutamente nada. Um gringo, talvez alemão ou francês, começou a me acariciar e não demorou muito para irmos ao motel... O mesmo da primeira vez.
Ao perguntar meu nome, o beijei alucinadamente enquanto me esfregava nele e antes de lhe dar a última e melhor noite da sua vida eu respondi a minha caça do dia.
Belial, aquele agora era meu nome de caçadora... O nome que jazia nas costas da minha primeira presa.