Não deixe um xixi para depois
Uma criança encantadora, vendo ela brincar a vida podia ser entendida como um picadeiro, uma imensa arena de diversões, que tinha entre aquele menino e o céu, somente uma lona separando; o sorriso infantil deixava o paraíso quase que ao alcance da mão.
O avô perdia horas vendo o neto brincar, o garoto era um bálsamo que devolvia ao ancião, quase que a alegria e vontade de viver novamente.
-Ah, como um neto faz bem!!!
Sobravam perguntas, como o pai d criança tivera a coragem de abandonar, esposa e filho de déu em déu, e se não houvesse um avô?
A mãe do menino não suportou bem o golpe, entregou-se ao ostracismo, lacrou-se no sofrimento e vergonha, e esperou o fim chegar, o fim não tardou.
De um grupo familiar, sobraram os extremos: o avô, o mais velho e o neto, o mais novo, um completava o outro em harmoniosa sincronia e convivência, em recíproca ternura.
Aquele que causara todo o desenlace voltou, voltou com o mesmo propósito com que partira pela primeira vez, causar outro desenlace, queria levar a criança consigo, separá-la do único vínculo familiar que o menino tinha, depois da morte da mãe...o avô
Voltou com ameaças de processo, de guarda natural, sendo ele o pai, tutoria ou qualquer outro dispositivo que reconhecesse no pai biológico o responsável pela guarda.
Para se preservar vivo, pois tinha um neto para criar, o progenitor se conteve, não se deixou levar pela fúria e ódio que sentia, obedeceu subserviente as primeiras decisões do infeliz que viera tentando causar infelicidade.
Não queria submeter o descendente a um processo vexatório, não queria se desatrelar de sua alegria, via ação judicial
O bom senso devia prevalecer, o pai precisava entender que o filho necessitava do avô, que a dependência que se estabelecera entre a criança o sogro era nó górdio, não poderia ser desfeito sem destruir estruturas emocionais.
A idade avançada o fez raciocinar com lógica e procurou pelo genro, no hotel em que ele se encontrava hospedado. A maldita pressão alta obrigava aquele homem idoso a tomar diuréticos, e os diuréticos obrigam as pessoas a urinar repetidas vezes, não há como conter.
Logo que entrou no apartamento, quase que envergonhado, o ancião pediu para usar o banheiro, afinal os diuréticos para os hipertensos são extremamente eficazes; e no banheiro, com a ajuda de um canivete suiço e de fita isolante que trouxera consigo, os fios do chuveiro foram, quase que artisticamente, dispostos, de tal forma que ligada a água, o usuário receberia uma carga elétrica violentíssima, prendendo a pessoa ao jato carregado de energia, mesmo as pessoas que sempre se identificaram pela facilidade que possuem de se desprender.
É constrangedor, em visitas rápidas, pedir para se usar o banheiro, mas o velho sabia que não podia controlar uma necessidade natural: xixi não pode ser deixado para depois, isto altera a tensão... perdão, altera a pressão