A Fada

Comecei a perceber que ela era uma fada, tão logo a conheci. Havia nela tão intensa luz,que com certeza, não seria desse mundo concreto. Não era possível existir ser mais celestial que aquele.

Ela tinha brilho próprio como se a sua volta houvesse um elo de luz. Parecia ser toda de marfim, mas os olhos tinham a cor do jade e os seus cabelos tinham sugado da abelha rainha sua cor dourada. Sua voz era um sopro divinal, parecia falar de amor a cada vez que aqueles lábios se distendiam para mostrar quanto perfeito eram aqueles dentes de marfins.

Terminada a inspeção e tendo decidido que estava diante de uma fada, restava-me saber o que fazer. Na verdade, não era uma situação que um mortal estivesse acostumado e, se tratando deste aqui, isso se tornava ainda mais complicado. Não estava preparado para assumir o papel de interlocutor de um ser sobrenatural, na verdade, falar, conversar não era muito a minha praia, eu quase sempre não me dava bem quando tinha que bancar o orador, mas... Já que não tinha outro para fazer o papel de otário, lá fui eu.

As pernas estavam hirtas e a língua parecia que tinha crescido tanto que a senti enrolar dentro da boca, as mãos tremiam que só dente de leite quando mole. Dei alguns passos, na verdade três e parei. Para chegar junto à divinal tinha que continuar. Juro que quis ir à frente, mas as pernas não obedeciam e o cérebro ficou exatamente congelado quando ela sorriu. Que sorriso! Era como se o sol da primavera estivesse invadindo o recinto e com ele trouxesse as flores mais belas e coloridas para alegrar o dia.

Confesso: não consegui andar mais, todavia isto não foi preciso. Aquele ser movimentou-se, o que fez a luz caminhar em minha direção e meu coração descongelar e acelerar tal qual o motor da Ferrari na última volta para ganhar o campeonato. Pareceu-me ter se passado horas até que, pela primeira vez ouvi o mais belo solfejo que alguém já escutou.

- Bom Dia. Por favor, estou perdida o senhor pode ajudar-me a encontrar este endereço?

- Oooooooo... end... ender... endere... endereçooooo?

- Sim. Este endereço aqui. O senhor pode me ajudar?

- Cl... clar...claro. Claro, posso sim.

- Onde?

- Onnnnde o queeee?

- Senhor! O senhor sabe dizer onde fica este endereço?!

- Seiiiiiiiii.... Posso lhe levar lá.

- Então, vamos...

- Onde?! Ah! Sim, vamos.

E caminhamos, ou melhor, eu caminhei a minha fada deslizou por sobre as flores que o Ipê amarelo jogou ao chão em meio a setembro.

Passamos por bosques e rios, cachoeiras e prados, castelos de sonhos e vi até uma cotovia se escondendo do sol, e ai chegamos ao endereço.

Na verdade era um endereço que eu conhecia bem. Ainda poucos dias tinha ali deixado um amigo que se acidentara. E alguns meses atrás aquela velhinha que morava em minha rua também tinha se mudado definitivamente para lá.

De repente, percebi que minhas pernas agora não obedeceriam mesmo e que o pânico tomava-me o corpo por inteiro. Meus dentes não eram mais de leite, se fosse eu não ouviria aquele bater de ossos que eles faziam sem parar. Minhas mãos estavam escorregadias e meus olhos fechados.

Claro, não abriria os olhos nem por ouro, nem por prata, nem por sangue de alazão!

Lembrei-me em tal má hora, que era noite e que não havia sol, que não podia ter visto flores de Ipê amarelo fazendo tapete no chão, nem tínhamos chegado a meados de agosto e a primavera começa em setembro. Em que dia mesmo...? Não importava. O que interessava mesmo é que era dia treze de agosto. Sexta feira treze. E para maior desespero o relógio da matriz a minha frente marcava doze horas menos um quarto!

Correria. Se eu tivesse minhas pernas, mas como não as sentia! Não via, não escutava e não sentia coisa alguma. Pensei por um momento - Virei estátua. Isto com certeza seria até bom. Evitaria o que quer fosse acontecer.

Mas como diz um amigo, depois do ruim vem sempre o péssimo e depois da tempestade nunca vem à bonança, meus sentidos resolveram voltar exatamente nas doze badalas do relógio episcopal.

Ao mesmo tempo em que abri os olhos, senti uma mão gelada tocar o meu rosto e uma voz gutural gritar:

- Acorda menino! Deixaste a janela aberta! O quarto está todo molhado. Se não fosse o despertador me acordar irias acordar todo molhado e pegar um resfriado!

Pegar um resfriado podia até ser que acontecesse.

Quanto ao molhado...

Fui tomar banho!

Arlete Araújo
Enviado por Arlete Araújo em 30/09/2010
Reeditado em 30/09/2010
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