A ILHA DO CURUPIRA
Estava um domingo maravilhoso de sol. O que acontece quando aparece um solzinho no final de semana, ou em qualquer dia claro e quente durante a semana no Rio de Janeiro? O carioca, estando com a saúde perfeita, não pensa em outra coisa que não seja a praia. Pois bem, reuni uns amigos e fomos à praia, por que não? Ver mulher bonita, paquerar, tomar uma cerveja bem geladinha...Chegando lá resolvemos jogar vôlei. Levaram a rede, a bola, e foi só montar os times. Ficamos logo no final da orla, no final da areia, onde haviam pequenos barcos pesqueiros parados.
Um amigo do time adversário, certa hora, deu um saque violento e a bola caiu atrás de um muro de obras, um muro feito de madeira compensada, eu disse : “Deixa que eu vou lá e pego!” Quando corri na direção, uma banhista me advertiu : “Cuidado, dizem que quem atravessa esse muro não volta mais!” Parei e pensei : “Que bobagem! Essa moça está me achando com cara de bobo e quer me assustar!” Um amigo da turma pôs as mãos em concha para que eu pusesse um dos pés e pulasse o obstáculo. Caí de mal jeito, tonto, quis saber onde estava e procurei pelo terreno, a bola. Me deparei com um grande silêncio e com um interminável areal à frente. Caminhei uns trezentos metros adiante e nada de encontrar o que eu queria. Olhei para trás e não vi mais o tapume. Não sei o porquê, mas continuei andando sem saber mais o que estava procurando naquele deserto sem mar. Encontrei depois de dois quilômetros, uma Vila. E me disseram em coro uníssono: “Bem- Vindo à Ilha do Curupira, de onde você nunca mais vai sair! ” Sorri, pensando ser uma brincadeira, mas percebi, no rosto das pessoas um ar da mais pura imbecilidade e servidão. Os poucos lúcidos me diziam: “Cuidado, ele parece bonzinho, mas é o verdadeiro cão. Todos os incautos atraídos por esse lugar paradisíaco se tornam escravos sem perceber e, até hoje ninguém conseguiu escapar daqui.” Levei um mês prisioneiro da minha agonia, sem perspectiva de fuga, o muro por onde entrei não existia mais. Arrisquei perguntar a alguém: “Onde é a fronteira deste mundo e do outro?” Ele me respondeu: “ Tomei conhecimento de que ao Norte, a dez quilômetros, você encontrará um muro de tijolos de uns cinco metros de altura, de lá pode-se avistar o outro mundo, a outra dimensão, mas há seguranças, guardiões desta ilha para evitar as fugas, e até hoje ninguém conseguiu sair vivo deste lugar”. Eu disse: “Quero falar com ele!”, “Com ele quem?”, “Com o Curupira”, “Raríssimas pessoas conseguem vê-lo, ele não tem o costume de aparecer, e se o vir, vai alegar que deve a ele, pois está aqui sem trabalhar e comendo o que lhe oferecem, e cá entre nós, a comida daqui é uma delícia!” “Estou de Licença prêmio no meu trabalho, tenho dinheiro para pagar esta estada, eu preciso retornar as minhas atividades...” O homem virou as costas e me deixou falando sozinho. Fui até a Vila e soube que o Senhor Dono da Ilha estava tomando banho, num dos quartos de uma imensa hospedaria. Eu invadi o banho, para encontrá-lo vulnerável. Entro e vejo um sujeito muito feio, meio gorduchinho, peludo, de cinqüenta centímetros. E digo a ele, cheio de ódio contido, que quero ir embora daquele lugar, agradecendo a hospitalidade e prometendo ressarci-lo imediatamente após chegar em minha terra. Enquanto me olhava com espanto, me aproximei e ofereci as únicas coisas tiradas do meu bolso: três pentes, um azul, um rosa e um marfim, e me retirei do recinto. Do lado de fora havia um enorme banquete e uma música muito animada e alta estava tocando. Enquanto dançava e comia uma empadinha, uma moça bateu em minhas costas e disse: “Olha, ele mandou devolver!” Eram os três pentes. Avistei, ao longe, minha amiga Elisabete, e pensei: “Com certeza ela veio atrás de mim!”, logo depois a perdi de vista, mas corri, com medo, em direção ao muro, eu e um negão acorrentado. Já em frente ao muro disse a ele: “Todo mundo diz que até hoje ninguém conseguiu escapar daqui!”e ele me respondeu: “Nós podemos ser os primeiros, se houver algo atrás deste muro”, ele subiu no muro e os seguranças vieram atrás de nós para nos matar, Perguntei aflito: “O que vê daí de cima?” Sorrindo me respondeu: “A cidade!” Disse: “Me dê a mão, quero pular também!” Estendi a mão e fui puxado para cima. Minha alegria ao revê-la tão linda foi indescritível. Caímos aliviados na Cidade Maravilhosa. Vi, com alegria, meus amigos que perguntaram: “Não achou a bola?” Respondi baixinho: “Não”. No outro instante, meu ar de felicidade extirpou-se, pois me lembrei da minha amiga presa na Ilha do Curupira e resolvi voltar para resgatá-la. Informei minha decisão, tacitamente, ao meu companheiro de fuga que redargüiu: “Embora saiba como voltar, você pode não conseguir escapar outra vez, disseram que a saída muda sempre de lugar!” , Respondi: “É um risco que tenho que correr...” Disse alto aos amigos: “Vou pular o muro novamente, tenho que achar essa bola!” Pulei o muro de volta.
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O Curupira é uma figura do folclore brasileiro. Ele é uma entidade das matas, um anão de cabelos compridos e vermelhos, cuja característica principal são os pés virados para trás.
É um mito antigo no Brasil, já citado por José de Anchieta, em 1560. Protege a floresta e os animais, espantando os caçadores que não respeitam as leis da natureza, ou seja, que não respeitam o período de procriação e amamentação dos animais e que também caçam além do necessário para a sua sobrevivência e lenhadores que fazem derrubada de árvores de forma predatória.
O Curupira solta assovios agudos para assustar e confundir caçadores e lenhadores, além de criar ilusões, até que os malfeitores se percam ou enlouqueçam, no meio da mata. Seus pés virados para trás servem para despistar os caçadores, que ao irem atrás das pegadas, vão na direção errada. Para que isso não aconteça, caçadores e lenhadores costumam suborná-lo com iguarias deixadas em lugares estratégicos. O Curupira, distraído com tais oferendas, esquece-se de suas artes e deixa de dar suas pistas falsas e chamados enganosos.
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