Jardim Filosofico - parte 1
Estrelas brilhantes coloridas enfeitavam o arranjo noturno junto com vaga-lumes que piscavam entre arvores e arbustos. Não muito distante o som de um violão espanhol ecoava indicando que a aparelhagem de som da sala estava discretamente ligada. Não havia ninguém em casa, apenas a ruiva de orelhas felinas completamente consumida em suas leituras.
“Particularmente acho que quando estamos nos sentindo parados no tempo, sempre há algo no universo que nos impulsiona a mudar, a crescer, ou pelo menos que nos faça caminharmos de novo.“
Nisa mais uma vez relia um trecho de seu diário, encostada na lateral da soleira, sentada ao chão próximo a uma escada de 3 degraus de pedra.
Nos últimos meses era só o que ela fazia todas as tardes. Lia e relia incessantemente cada parágrafo escrito, cada musica composta, cada passo de dança ensaiado e criado após suas viagens. Há muito tempo não saia de casa e algumas poucas vezes recebia visitas de pessoas que gostava de conversar.
Dentre as visitas mais constantes estava a do amigo considerado irmão, Terry Bogard. Um loiro corpulento de olhos azuis profundos e madeixas que cobriam os ombros. Ele vinha cheio de encrencas e novidades que a faziam rir nos momentos tristes. Terry sempre aparecia com uma traquinagem ou uma atividade de seus filhos e suas mil amantes malucas. Até então ele era o único a ter presença fixa no lar da ruiva.
A imagem dele sempre vinha acompanhada de um sorriso. A amizade deles transcendia o espaço e o tempo. Em sua ultima conversa com o lutador, alguns assuntos doloridos tinham sido tocados e alguns nomes que Nisa preferia deixar de lado ressurgiam em sua mente. O assunto doía como pequenos projeteis inflamados não retirados da carne. E ainda estão doloridos mesmo com o passar do tempo.
Com a cabeça encostada na lateral da entrada da casa e de olhos semicerrados Nisa sente uma leve mudança no vento, pequena demais para que qualquer um note. O aroma doce de algum tipo de perfume oriental dança próximo ao nariz dela e é sorvido vagarosamente, na tentativa de trazer alguma lembrança de um rosto familiar a sua mente.
Os olhos se abrem, mas ainda não há nada nem ninguém próximo para ser identificado. Então ela fita um ponto escuro no jardim, onde não havia a luz bruxuleante dos insetos luminosos.
Há momentos que palavras são desnecessárias. As impressões mentais são mais claras que imagens, sons, ou sinais.
Aos poucos a imagem esbelta de um ser que caminha entre as sombras como se desfilasse em uma passarela se materializa há uns passos a frente da garota. O aroma doce foi intensificado com a aparição. Uma pequena e leve nevoa se desfez após uma imagem de ossos assumir a aparência humana ser recoberta de um luxuoso tecido bordado a ouro.
Um misto de susto e fascínio brilhou rapidamente no olhar na ruiva. As sombras ainda não a permitiam ver a face daquele ser totalmente, mas sentia um leve sorriso no rosto de quem se aproximava.
(continua.....)