O Perdido.
Tentando completar minha existência de vazio. Fingindo relações sociais que não tenho. Sorrisos falsos são esbanjados, mas não por vontade, daria tudo para saber como é sentir, como é realmente ser alguma coisa, saber qual o meu papel, agir por impulso algumas vezes, mas isso não acontece.
Meu pensamento lógico é meu conforto, minha certeza de um acontecimento calculado é minha segurança, variantes e variantes de um sistema dando em outras variáveis para aquela situação... É divertido mexer com elas.
Mascaras colocadas em mim de varias formas, seria perturbador para as pessoas saberem o que eu sou, ninguém teria sangue frio de aceitar isso, ninguém a não ser eu mesmo...
Vago e vago procurando sentido, ou preenchimento do vazio e ,quem sabe, consiga preencher. A quem eu estou tentando enganar? Não há como fazer isso, não a como preencher algo que não tenha fundo ou fim, minha consciência tem essa natureza, uma natureza infinita...
Então o ser humano se recolhe no medo, no arrependimento, na tristeza, na agonia... pode achar que é ruim, mas pior seria não ter nunca sentido isso.
As trevas, mãe do medo de todos os seres, monstros, contos, sustos! são o meu recolhimento. Sentado no meio da escuridão, do silencio, eu penso em como seria um mundo que não precisasse me esconder, não ter medo de mostrar quem eu sou, viver apenas, sem que ninguém quisesse me destruir só por medo do que eu possa fazer... sentir a calma, fechar os olhos, respirar e existir apenas paz.
Vocês não vão gostar de mim. Sou devasso, meticuloso, chato e esperto demais para ter falsa modéstia, não gosto de sorrisos falsos, não tenho abraços matinais, sou apenas eu e minha existência. Meus gostos, minha luxurias, meus pensamentos...
As mulheres, que tenham seu cuidado, porque eu espero fazer coisas que jamais passariam por suas cabeças, que tirariam a castidade só em pensar a respeito, exerço poder sobre elas e meus desejos serão satisfeitos da maneira que eu desejar.
Os homens, não são mais do que estorvo para mim, não me colocam medo com sua forma de machões ou demonstrações de poder, me escutem
-o que vocês fazem, eu posso fazer melhor.
Honestidade. Uma palavra, apenas, para se usar as vezes talvez, para mostrar pureza ou para se vangloriar. Para mim ela é inútil, meu deus! Como conseguem dormir a noite? Cantando honestidade para todos os lados. Serei honesto ao falar isso, mas não me faz diferença, a honestidade é uma corrente e, aos meus servos, roubem-me o Maximo que puderem, para poder viverem libertos!
Hábitos saudáveis, um bom conselho, mas não se aplica a mim, bem... depende do que você chama de saudável. Bebidas, sexo, drogas são alguns de meus “hábitos saudáveis”
Para que minha vida corra bem e da forma mais errada possível eu preciso deles. Nem toda a estrada e atalho tem um caminho bom e ainda chega a um lugar bom também no ponto final, isso é pedir demais.
já nossos caminhos são diferentes, mas ambos chegaremos, ou queremos chegar, a morte, depende do ponto de vista, a qual ,por não saber o que acontece depois, nos deixa com medo, ou deixa você com medo e a mim incomodado.
Você usará seus hábitos saudáveis e terá uma longa vida com comida orgânica e muito fôlego de sobra ainda quando morrer, já eu usarei meus hábitos e terei o meu atalho de álcool, drogas, sexo, usarei todo o meu fôlego, comerei a vontade e, ao fim, chegarei a morte também, espero, mas apenas com mais historias para contar.
A morte, algo que os coloca tanto medo, tantas especulações sobre o que terá do outro lado, quando chegar ao fim, quando tiver apenas que relaxar seus músculos, fechar os olhos, sentir todos os sentidos se apagarem aos poucos, tudo a sua volta ir sumindo, ir perdendo a cor, ir abaixando de volume ate restar apenas, o silencio.
Na verdade se tem tanto medo assim da morte, porque não se tem certeza do que se vai encontrar quando acontecer, daí entra a fé, a crença, de me parece mais oportunista do que reveladora, afinal sua crença diz que quando morrer você será salvo, julgado e, é claro, perdoado. Quanto aos infiéis a essa crença, se não se converterem, morrerão em agonia eterna.
O ser humano é tão imediatista, não para pra pensar, não como eu que penso sobre tudo que se tem e que eu tenho ou o que vou fazer, daí vem o conhecimento. Ele não tem consciência do quanto tempo é a eternidade, não são mil anos, nem um milhão de anos e sim toda a idade do universo, mas ainda todo o tempo pra frente, sem nunca cessar, nunca. Isso seria castigo demais para uma pessoa que fez mal apenas uma vida, não seria? Ou pelo fato dela não ser da sua religião, ou ate mesmo lhe falar que você estar errado, que sua crença é uma mentira. Ninguém pode falar isso ,por que ninguém tem certeza que aquilo que tem Fe seja verdade, por mais que tenha Fe, ainda é só uma esperança de que aquilo aconteça, não certeza.
Eu olho pessoas com Fe, quando estou vagando em minha escuridão, eu acho interessante e imagino o que elas devem sentir, gostaria um dia poder sentir isso também se fosse escolher algum sentimento para ter, achar que depois de morto irei ao paraíso e ficarei eternamente lá. A. “eternamente” de novo, poucas pessoas sabem que o paraíso é maravilhoso, mas por mais que seja assim, todo paraíso depois de centenas de anos de paraíso, se torna um inferno.
E em muitas culturas a imortalidade é uma maldição, terrível maldição, não um presente.
A fé é uma coisa boa, mas uma pessoa como eu não merece tê-la, não se aplica a mim, mas ,talvez, uma eternidade de inferno seja um tempo pequeno para o monstro que sou.
Talvez a escolha tenha sido minha. Talvez eu nem tenha sabido o que virei até dar por conta do que era, o fato é que: não posso mudar o que já sou, pra minha maior tristeza, ou algo parecido que eu ainda sinto um pouco.
Mas tento fazer algo pra mudar tudo isso que eu não sinto.
E as trevas ,que amedrontam a todos, acolhem-me enquanto ando a noite, lentamente, por uma calçada com pedras irregulares de uma rua vazia onde a escuridão é cortada levemente por fracas luzes ambaricas dos altos postes.
Com meu sobretudo preto de couro, não que eu seja de algum estilo particular, mas fica muito bem em mim, Meus tênis, minha calça jeans já velha e meio rasgada e uma camisa ,de cor meio clara, qualquer ,que eu não me lembro onde consegui, mantém as manchas de sangue, que tenho certeza de que não é meu.
Meu nome é Marco, não sei bem o que eu sou, em que me transformaram, talvez continue humano, mas apenas fazendo os atos de vocês literalmente, talvez não... não sei o que eu sou, apenas sei o que faço e me defini de uma forma inexplicável, a qual eu não consigo, nem sempre, entender.
Então a chuva vai caindo lentamente no silencio da rua, que posso escutar até os pingos chocando-se conta o couro do sobretudo e fazendo leves estalos e meus pés espatifando as águas das poças que eu passo enquanto caminho.
A chuva se destaca ao passar pelas luzes dos postes que ilumina as pequenas gotinhas quando passam pela luz. Vou verificando esses pequenos detalhes que ninguém percebe, porque se tem muita coisa para se preocupar, muita coisa de sua “vida social” tão importante, e que se esquecem que na verdade estão vegetando e não vivendo, apenas seguindo movimentos automáticos ou reações calculadas anteriormente para uma situação especifica. São muitos os que vivem assim, os vivo-mortos, os que precisam morrer para saber que estão vivos mesmo.
Minha fome se acusa em meu estomago quebrando o raciocínio.
Preciso me alimentar.
O que um monstro come? Desde lendas macabras a historias de ninar respondem essa pergunta.
Quando o Drácula drena o sangue de sua vitima para revigorar-se, quando o lobisomem dilacera suas vitimas para ter carne, quando o lobo mal come a vovó da chapeuzinho-vermelho como aperitivo...
Mas é disso que eu preciso para continuar me movendo preciso de um alimento que tenha vida, que me dê sangue para correr em minhas veias, mesmo que não seja por sua vontade, mas como qualquer outro animal, eu tenho instinto para sobreviver e mesmo sendo horroroso, é disso que eu preciso para me manter vivo, “sangue é vida”.
Então, na minha caminhada, vejo uma garota sentada, se escondendo da chuva, no segundo degrau de uma pequena escada de três, na frente de uma loja debaixo de um curto toldo que provavelmente teria fim de fazer sombra de dia.
A garota tinha seus cabelos muito ruivos e um pouco cacheados, já molhados com um pouco de chuva que ela pegou, pele muito branca e olhos castanho-claros destacados por uma maquiagem preta em volta ,que já lhe escorria pelo rosto, e gotejava pelo seu ombro nu, de uma roupa muito curta e brilhante que ela usava de cor vermelha, segurando um cigarro aceso com seus dois dedos da mão esquerda.
Então parei em frente a ela e fiquei observando-a, uma menina muito bonita e um belo corpo, não sabia se faria mesmo aquilo. Ela olhou-me dos meus pés e foi subindo ate erguer seu rosto e conseguir mover o olhar para ver o meu rosto.
Ela deu um sorriso fraco e disse:
- vai querer algo hoje bonitão, posso fazer de tudo- depois deu uma tragada no cigarro.
Uma prostituta. Eu iria matá-la, será que alguém sentirá falta? Alguém sentirá pena, quando vir nos noticiários? Ou será tratada com indiferença só por fazer o que faz?
O respeito pela vida que o ser humano tem para com o outro, pelo menos até seus interesses estarem protegidos ou não. Ou você poder esconder seus erros apontando os dela, dizendo que ela é apenas uma prostituta e nada mais.
Apenas porque essa garota troca seu sexo por dinheiro, não quer dizer que não mereça mais o respeito de ninguém, que tenha perdido o direito de ser importada, mas ninguém se importa... talvez nem por escolha dela tenha entrado nessa vida, talvez sim.
Mas eu não me importo.
- então garotão, vai querer saciar toda essa fome agora?- que engraçado, pensei estar sendo discreto...
Fico olhando de cima pra baixo e vendo ela sentada no degrau, então ela destaca seus seios colocando-os mais para frente do seu corpo e mostrando mais suas pernas levantando um pouco a pequena saia de couro.
- estou precisando de algo para me saciar agora- eu falo, ainda debaixo da macia chuva, olhando profundamente para ela.
Ela traga o cigarro. Ela joga o cigarro no chão.
Coloco-me a distancia de um passo a sua frente enquanto ela se apóia pra levantar-se em cima do longo salto de sua sandália.
-então... O que vamos ter hoje da sua mente taradinha em?- ela fala com uma voz provocante e meio repugnante e morde de leve o lábio inferior, então eu coloco minha mão de leve sobre o seu rosto olho em seus olhos e vou aproximando meu rosto, devagar, chego a escutar sua respiração pesada com o barulho da chuva caindo.
Aproximo-me até quase beijá-la, desvio da boca, vou para o lado do seu rosto e sussurro em seu ouvido:
- apenas relaxe...
-eu não gosto de muitos sentimentos no meu trabalho com os meus clientes.
- ...que bom...tente não gritar muito...- coloquei a palma das minhas mãos pouco abaixo dos seus seios, e encostei a palma dos meus polegares nela, porque as minhas unhas são afiadas, resistentes e um pouco grandes.
- ah eu aguen...- ela parou de falar e sua feição mudou atonitamente quando eu enfiei meus polegares furando seus pulmões com minhas unhas , velho truque para se ela não atendesse meu pedido, não posso me dar ao luxo de gritos muito altos, para meus movimentos calculados. Fazendo isso o medo libera adrenalina que aumenta seus batimentos cardíacos fazendo o sangue sair mais rápido. Mantenho meus dedos e passo meu rosto no dela baixando ate chegar ao seu pescoço, e tocar meus lábios, encostar meus dentes, e cravá-los na sua jugular, uma veia grande, sangramento rápido, grande quantidade de sangue saindo muito rápido, vou tentando conter todo o líquido saindo rapidamente, mas não consigo, sempre escorre pelo meu queixo, sinto o sangue quente descendo pela minha garganta, passando por cada órgão meu e fazendo-os funcionar, passando pelas minhas veias e correndo rapidamente enquanto o meu coração volta a bater para distribuir o sangue que estou tomando.
Ela ainda tenta gritar, gemidos fracos, talvez tentasse me bater, mas quando ela percebeu, o sangue da sua mão com certeza já estava em mim, porque houve apenas espasmos, enquanto eu ainda mastigo o seu pescoço para chegar mais na veia, até que o ultimo copo de sangue é tomado e a minha fome é acalmada e minha maldição é fortalecida.
O corpo morto, caído em mim ainda com a feição de dor ou desespero cravada em seu rosto, não me interessa mais, então retiro meus dedos lentamente que ainda estavam nos seus pulmões e a deito suavemente sobre a calçada de pedras irregulares e vejo que seu cigarro ainda estava aceso... pego e ainda consigo tragar.
Eu trago o cigarro.
Eu jogo o cigarro no chão.
Eu apago o cigarro pisando nele.
Deixo o corpo em frente a loja, cujo o dono ficara chocado, chamará a policia e os policiais acharão horrível, mas depois a identificarão e saberão o que ela é, então perderão o interesse até que outras sejam mortas em um intervalo pequeno, enquanto ao que o dono da loja vai dizer aos que tocarem nesse assunto será: “era só mais uma prostituta que sujava nossa rua, pobre garota, mas foi escolher essa vida, sabia o tão perigoso poderia ser”.
Ela não escolheu essa vida, talvez ela não tivesse tido escolha e ela nem imaginava o quão perigoso poderia ser, ninguém merece morrer por um monstro como eu.
Eu não deixo vestígios, sou um predador, não tenho impressões digitais e meu sangue tecnicamente não pertence a mim.
Deixo o corpo pra traz sendo banhado pela chuva e limpando todo o sangue que sujava ele, escorrendo ,diluído, pela sarjeta.
Caminhando debaixo da luz, olho para minha camisa completamente manchada de sangue, imagino do que seria o tipo de sangue que estava manchando ela antes, já o sobretudo é lavado facilmente pela chuva que ainda molha tudo a minha volta e até onde eu consigo ver na rua.