O silêncio de Clara
Clara há muito me esperava, desde o dia do seu casamento que eu não a via. Será que mudou muito? E eu? O que pensaria de mim? Os anos passaram, ambas envelhecemos. Clara estava diferente. O seu olhar não era o mesmo. Perdera o brilho? Talvez.
Nosso reencontro foi amistoso, sem euforia, sem entusiasmo. Estava estranha. Fiquei curiosa para conhecer sua casa, sua chácara. Achei um pouco vazia. Os móveis eram escuros, sem cores, sua casa era cinza, assim como lá fora. Nada dava pra ver. A névoa cobria todo o terreiro, não se sabia se haviam vizinhos ou não. A neblina era muito densa, forte e cobria tudo em volta daquela casa... parecia sem vida. E Clara? Antes tão viva, tão alegre, tão falante... agora tão quieta, tão triste, tão ausente. Seu marido? Nem o reconheço mais. Quem é este homem? Mal falou comigo, será que se lembra de mim? Parece ser parte deste lugar. Diria até que seria impossível viver fora daqui. Quem mais vive aqui? Desde o dia em que cheguei não vi ninguém além de Clara e seu marido. Onde estão todos? E esta neblina? Não tem fim? Já estou me cansando. Preciso partir.
Mais uma semana. Coisas estranhas têm acontecido. Esta noite eu o vi. Ele entrou em meu quarto, estava pálido, quase sem vida, se aproximou de mim, olhou em meus olhos e desapareceu. Estou com medo. Será que sonhei? Fui até a janela. Olhei. Ele continua lá a me olhar através dela. Alguma coisa me arrastava pra fora, não sei o quê. Quis ir ao seu encontro, mas minhas pernas não obedeceram. Um sono profundo tomou conta de mim.
Acordei. Clara estava lá. Na cozinha. Silenciosa. Parecia que havia medo em seu olhar. Tentei puxar conversa. Balbuciou algumas palavras, mal compreendi... o silêncio tomou conta. Ele entra, a beija. Ela sorri. Seus olhos brilham. Será de contentamento? Ele sai. Pergunto aonde vai. Quero ir também. Clara se recusa. Então fico. Qual foi a última vez que saiu deste lugar? Pergunto. Não se lembra. Saio.
Pra onde ele foi? Desapareceu na neblina. Vou atrás. Tudo é deserto. Tudo é silêncio. Não há sinal de nada. Quem é ele? Vou atrás de Clara, peço que me acompanhe. Se recusa a passar pela porta, a sair daquela casa. Simplesmente não tem coragem de ir lá fora. Eu insisto. Ela grita. Eu a arrasto. Ouço barulho do carro. De onde veio? É ele. Nos escondemos. Ele me vê... saio e caminho em direção a casa. Clara não se mexe. Está paralisada. Aproximo-me. Nossos olhos se encontram. Não sei mais quem sou. Não me lembro. Só compreendo. Ele me olha. Ri. Choro. Nada posso fazer, apenas aceitar.
Aceitar o que seu olhar me diz. É isso. Cada um está preso ao seu destino.
Vasalisa di Katé