O sequestro de Estela (esboço)
A luz apagou-se.
Ergueram-se dois homens que em vão buscaram por uma forma de reacende-la. Um terceiro retirou um isqueiro de seu bolso e acendeu um cigarro. A tênue luz da chama serviu para que Estela visse a preocupação estampada na face de dois dos seus captores... apenas um fumava seu cigarro tranquilamente. Passou-se alguns minutos para que a energia da casa se re-estabelecesse. A jovem que estava amarrada e jogada aos pés de uma velha lareira sentiu a luz da lâmpada incandescente incomodar seus olhos. O fumante largou o cigarro em cima de um cinzeiro sobre a mesa empoeirada na qual estava recostado e caminhou com passos lentos até Estela. Ele desamarrou as mãos da jovem e algemou um de seus pés a uma estrutura metálica que fazia parte da lareira. Com um gesto o homem ordenou que os seus dois comparsas deixassem a sala e fossem até o interior da casa e então ele os seguiu.
Faziam pouco mais de 12 horas que Estela fora seqüestrada, mas para ela, muito mais tempo havia se passado. Com suas mãos livres, a garota pode sentir que havia sangue coagulado e uma ferida em seu couro cabeludo. Sua cabeça parecia que iria se partir em milhares de pequenos pedaços, devido à dor que sentia. Ela havia reagido, e agora de certa forma, se arrependia de te-lo feito. Também se arrependia de ter deixado o escritório tão tarde à despeito das censuras de Louise. Esta era sua natureza, sempre fora teimosa, e pouca importância dava às opiniões alheias. Tinha uma pilha de trabalhos inacabados e precisava terminá-los. Era assim que gostava de trabalhar... com prazos curtos à se cumprir.
Um barulho de tiro no interior da casa fez Estela voltar de seus devaneios... Fe-la perceber que nada daquilo importava mais... Os prazos, a opinião de Louise ou sua teimosia... apenas um pensamento inundava sua cabeça em frangalhos... ela iria morrer.
Outro tiro se seguiu alguns segundos depois do primeiro... Estela ouviu o barulho de um corpo caindo ao chão e depois um longo e gélido silencio. Em vão tentou se libertar das algemas e só parou quando ouviu passos vindo em sua direção. O homem que havia acendido o cigarro retornava à sala carregando um galão de gasolina. Sua face demonstrava uma tranqüilidade que fazia Estela tremer. Ele saiu da casa e retornou com uma pequena caixa branca que a jovem reconheceu como um Kit de primeiros socorros. O homem parecia ter em torno de 25 anos, era pálido, tinha cabelos escuros e oleosos cortados rente a sua testa. Ele retirou uma seringa de dentro da caixa e se aproximou de Estela. A jovem receou e esperneou diante da aproximação do homem que então falou com uma voz grave e fria.
-Se não for desta forma, levarei você cortada em pedaços no meu porta malas.
Diante do alerta do homem, Estela permitiu que ele aplicasse o conteúdo da seringa em sua veia braquial. Após isso, o homem deixou-a e começou a espalhar gasolina por toda a casa.
Minutos depois Estela já não podia ver mais nada e caiu sonolenta sob os pés de seu captor.
Quando acordou, sentiu que estava presa em uma espécie de baú. O balanço e um barulho de motor indicavam que estava sendo transportada em um carro. O efeito da droga que o homem havia aplicado a fazia enjoar e se sentir ainda mais desconfortável dentro daquele pequeno cubo de madeira. A muito custo a jovem conseguiu se acalmar e percebeu que estava desamarrada. De repente o carro parou e Estela ouviu o ladrar de cães se aproximando.
Pode ouvir a voz do homem ordenar para alguém ajuda-lo a carregar o baú onde ela estava. O baú então foi retirado do carro e carregado por um bom tempo quando então foi largado ao chão. Estela se encolheu e esperou que o baú fosse aberto... o que não aconteceu.
Era desesperador, não entendia o que estava acontecendo e nem onde estava. Sentia-se sonolenta ainda por efeito do remédio mas queria se manter acordada... fazia um esforço tremendo para não gritar e tentar quebrar a caixa que a prendia, mas no fundo sentia que não tinha forças para tal. Depois de minutos que pareciam se estender como horas ela adormeceu novamente.
Quando acordou, estava num pequeno quarto onde havia apenas um colchão, um prato de comida e um bilhete escrito à mão. Estela se lançou sobre o papel e leu o conteúdo.
“Por um mero detalhe você está viva. Não me faça me arrepender de ter escolhido deixá-la viver. Se alimente e não me cause problemas. Pela manhã você receberá um telefone e instruções para seguir. Qualquer desvio de conduta será lhe largamente retribuído”
Estela se manteve calma, guardou o bilhete em um bolso e se voltou para a comida. Estava faminta, e a situação em que estava não lhe tirava a vontade de comer.
Depois de terminar a refeição a jovem deitou-se no colchão e observou a lua que brilhava pela janela. Estava quase cheia... havia surgido do horizonte a pouco tempo, desta forma brilhava avermelhada, quase em sangue. Estela riu-se disso. Riu-se da situação como um todo.
Um riso amargo e doentio.
Estela ria-se de sua sorte... e ria-se de si mesma.
Noites atrás, diante da lua nova, havia se lamentado de sua vida, da forma como se sentia morta, da forma estática em que se portava diante do mundo que girava.
Naquela noite, pelo menos, ela tinha uma garrafa de uísque consigo... agora, porém não havia nada mais que uma garrafa de água. Terrivelmente insípida para o seu paladar.
Com o passar dos anos, estela havia pego gosto por bebidas fortes. Buscava em tudo, o Maximo de intensidade... No amor, no trabalho, no dia a dia.
No entanto, sentia-se sempre parada... e quase morta.
Agora, ela via que tudo o que havia pensado de si mesma não fazia o mínimo sentido.
Estava viva... e sangrava.
Estela se deixou cair sobre o colchão empoeirado e dormiu pesadamente. Quando acordou percebeu que ao seu lado havia sido deixado um bloco de papel e uma caneta. Na primeira página do bloco, escrito com uma caligrafia que lembrava à jovem a forma que médicos escreviam suas receitas, o seguinte texto.
“Escreva aí o que vier a sua mente. Disso vai depender sua vida”
(continuarei)