Venezianas Verdes, Cap. 28
Faltavam mais ou menos quarenta minutos para a chegada dos homens. Eulália sabia que nunca se atrasavam. Como não deixavam de cumprir seus compromissos. Quaisquer que fossem. Sobretudo os que se referiam aos amigos de fato. Era uma tradição.
Como Eulália ficou sendo conhecida quase que no mundo todo. Mas Marjorie era o seu verdadeiro nome. Herdara do pai o complexo e altamente lucrativo negócio de distribuição, importação e exportação de produtos diversificados em vários países. Pano de fundo para a inclusão na atividade das substâncias químicas consideradas mais nobres no mundo. O mundo vulgarmente conhecido como das drogas. O velho Ostinato Lia Papapulos, antigo amigo de seu falecido pai, os dois nascidos na Grécia, vinha mais uma vez em pessoa reunir-se com ela para fecharem outro negócio milionário, com base na distribuição pesada desses produtos na Ásia e na América Central.
A ligação de Ostinato com Hípparchos Antonopulos, pai de Marjorie, ou da nossa Eulália, era tal que, com o falecimento do segundo, o amigo praticamente assumiu a continuidade, pelo menos, das orientações e aconselhamentos que vinham sendo dados à herdeira. Marjorie tinha 23 anos. A diferença de idade – Ostinato contava 41 anos – não impediu que o “tutor” de Marjorie tentasse vencer os 18 anos que os separavam para estabelecer uma relação homem-mulher entre os dois. Mas não era a forma com que Marjorie aprendera a encará-lo. Ao perceber a real intenção de Ostinato, Marjorie tratou de desestimulá-lo, vindo a casar-se dois anos depois com um engenheiro inglês que conhecera num cruzeiro pela Europa.
Ostinato, fiel amigo e seguidor de Hípparchos, respeitou a decisão da herdeira, sem deixar de lado, embora discretamente, a função de seu protetor e amigo, apesar dos interesses comerciais comuns.
Ostinato era o mandatário de um outro braço da organização que na verdade era uma só. Sua atuação restringia-se ao Panamá. Havia outras ramificações, conforme a sua área de atuação, todas com os seus principais responsáveis – Marechal, na Venezuela; Quevedo, em Costa Rica; e Hombros, em Honduras. O negócio expandia-se pela Europa e Ásia, áreas que deveriam ficar sob o comando de Manicera e Altamirando, respectivamente.
Marjorie se desencantou com o casamento dois anos depois. As discussões tornaram-se freqüentes e o marido cada vez mais agressivo. Decidiu-se pelo divórcio quando soube, pela conhecida eficiência do serviço de inteligência da organização – Ostinato Lia à frente –, dos vultosos desvios de recursos confiados ao marido. Ele deveria observar o limite para a utilização do capital nos negócios de sua empresa de construção civil. Só que esse limite foi diversas vezes ultrapassado, o que contrariou a confiança e os interesses da organização. Quando a situação tornou-se insustentável, Ostinato sentiu-se na obrigação de permitir que Marjorie ficasse sabendo.
Percebendo-se igualmente traída, Marjorie decidiu-se pela separação definitiva. A partir daí, conhecedora de algumas regras rígidas da organização, temeu pelo que pudesse suceder ao marido. Seis meses após a consumação do divórcio, Marjorie, na sua primeira viagem à América do Sul com a filha, teve notícia do acidente que ele sofrera. A caminho de Londres, seu carro fora abalroado numa curva por uma carreta contendo uma substância química sob a forma de um líquido inflamável. Com o impacto o líquido, derramando-se sobre o veículo menor, provocou a sua explosão. O pai de sua filha morrera carbonizado, tendo o motorista da carreta se evadido sem qualquer ferimento.