Olhos de Víbora
Eu me deito com ele. Sinto o cheiro da sua pele. Para mim, não será um prazer. Mas estou sendo paga por isso, então não importa. Já me deitei com todos os tipos. Altos, baixos, novos, velhos, brancos, negros. Todos. A melhor parte não é o pagamento. A melhor parte não é o ato em si. A melhor parte, é o que vem depois.
- Nossa! - ele me diz, ofegante - Você foi incrível! A melhor que já tive na vida.
- Ah, é? É sempre bom ouvir isso. - olho para dentro dos seus olhos - Eu gostei de você. Que tal mais uma rapidinha, dessa vez, por conta da casa?
- Uau, tá falando sério? Então vamos!
Homens. Eles não resistem ao charme de uma mulher. Tão fácil enganá-los. E começamos tudo de novo. E é a hora de agir.
Enquanto ele está sobre mim, estico a mão para dentro da minha bolsa; ele está tão extasiado que nem percebe meus movimentos. Agarro uma seringa contendo um coquetel de venenos de cobras e drogas com ação paralisante. Aplico-lhe bem na sua jugular. Agora é só uma questão de tempo pro veneno fazer efeito.
Ele tenta me falar algo, mas não consegue. Está paralisado. Eu coloco minha mão sobre sua boca, impedido que seu último suspiro venha à tona. Ele se foi.
Me levanto rapidamente daquela cama. Pego sua carteira com todos seus cartões de crédito e dinheiro dentro e coloco dentro da bolsa. Visto minhas roupas. Abro a porta do apartamento e passo pelo corredor, com todo cuidado para não ser vista. A adrenalina ainda está alta em meu corpo. Vou embora pela saída dos fundos daquele prédio de periferia. Pego meu celular na bolsa e faço uma ligação:
- Alô? Maurice?
- Sim?
- Estou te esperando na esquina da rua 32 com a 40. Venha rápido.
Fui andando por aquelas ruas úmidas. Maurice era um bom amigo. Sua família havia fugido de Cuba quando era pequeno. Ele me servia como motorista e, em troca, eu dividia os lucros com ele. Além do mais, ele me protegia quando eu precisava.
Chego ao local combinado, mas não preciso esperar muito. Do outro lado da rua, vejo um carro parado piscar os faróis para mim. Era ele.
- Como você tá? - ele me perguntou, com um tom preocupado
- Eu tô bem, não se preocupe. Você já sabe que sou grandinha, já sei me cuidar.
- É melhor que saiba mesmo. Ou vai acabar ferrando com nóis dois.
Continuamos conversando enquanto ele dirigia de volta para casa.
Cheguei em casa, tirei os meus calçados para me sentir mais confortável. Aquela casa tava uma bagunça. Fui ver como estavam minhas queridinhas de estimação. Fui até o porão aonde havia três grandes viveiros, cada um contendo uma víbora. Dei uma olhada e fui durmir.
Na manhã seguinte, fui acordada por meu celular tocando. Era Maurice.
- Você não vai acreditar! Já temos quase que todo o dinheiro! Só mais uma noite e você vai poder dizer adeus a essa vida... essa vida de prostituta, de assassina!
Não sei o que senti. Eu já tava cansada daquela rotina horrível. Ninguém merecia passar por isso. Mas, ao mesmo tempo, eu senti uma certa aflição. Eu sentia algo diferente dentro de mim quando estava matando alguém. Algo inexplicável. Não queria deixar essa emoção de lado.
- Que ótimo! - eu falei - Já arrumei um cliente para hoje à noite. Me pegue às duas da madrugada aqui em casa.
- Tudo bem! Só me prometa que, quando tivermos o dinheiro, nunca mais vamos fazer isso, ok?
- Tudo bem. Eu prometo.
Estava na hora combinada. Ouço a buzina do carro de Maurice. Ele me leva até próximo da casa do cliente, mas me deixa 2 quarteirões antes, por precaução. Quando chego ao local, toco a campainha. Um homem com cerca de 50 anos, gordo e já apresentando sinais de calvíce atende a porta. Ele pede para eu entrar. Subimos as escadas e vamos até seu quarto. Eu estava impaciente. Já que era a última vez que eu ia fazer isso, que fizesse direito. O homem se aproxima. Pede para que eu me deite na cama. Não. Não vou me deitar. Pego a minha bolsa e retiro a seringa contendo o coquetel de substâncias. O homem se assusta, tenta se defender. Recebo um soco direto no rosto e caio. Filho da mãe. Vai pagar. Ainda no chão, dou uma rasteira nele. É a minha chance. Vou para cima do homem, que tenta impedir que eu lhe aplique as substâncias. Mal lhe espeto a agulha da seringa, ele arranca ela e a joga longe, derramando todo o conteúdo. Vou até minha bolsa e ligo pro Maurice, mas não tenho tempo de falar nada. O homem veio para cima de mim, tentando me sufocar. Luto com o sujeito por cerca de dois minutos, quando escuto passos dentro da casa. Era Maurice. Ele pega sua arma e dá um tiro certeiro bem na cabeça do homem. Rapidamente, pego os pedaços da seringa quebrada, para não deixar evidências. Saimos correndo dali e entramos no carro de Maurice.
- Droga! O que foi que você fez? Porque não esperou pegar o homem desprevenido?
- Eu cansei, tá? - disse, brigando - Cansei dessa vida!
- Ah, isso não importa agora. O barulho da arma provavelmente chamou a atenção dos vizinhos, que devem ter visto o carro. Estamos ferrados.
Maurice tinha razão. Havíamos sidos vistos.
- E agora, o que vamos fazer? - perguntei, apreensiva.
- Não sei, não. Vamos dar o fora daqui o mais rápido possível. Vamos para um bairro mais afastado.
Perfeito. Já sei o que fazer. Mecho em minha bolsa e encontro mais uma daquelas seringas. Com um movimento rápido, aplico uma na perna de Maurice.
- O que você tá fazendo?! - vejo o desespero em seus olhos.
- Estou me livrando de tudo isso. Adeus, Maurice. Você foi um ótimo amigo. Pena que tenha que acabar assim.
A perna dele começa a adormecer, e em instantes, seu corpo todo. É o tempo de eu abrir a porta do carro e me jogar para fora. Caio no chão e saio rolando por alguns metros. Meus braços e pernas estão todos ralados. Com dor, levanto meu pescoço para olhar. Vejo o carro de Maurice bater em uma árvore, com força. Adeus, meu amigo.
Alguns dias depois, meus ferimentos já estão se cicatrizando. Precisava sair, para esfriar a cabeça. Juntei meu dinheiro e fui em uma das melhores boates da cidade. Dancei um pouco e me sentei no bar. Um rapaz, com aparentemente a minha idade, se senta do meu lado.
- Ai, essa vida anda tão estranha ultimamente. - ele falou, com um forte sotaque do sul
- Pois é, né? Tanta coisa louca acontencendo...
- O bom é que ela não se torna tediosa. Se torna cada vez mais emocionante. - o rapaz se virou para mim. Tinha belos olhos azuis e cabelos que batiam no ombro.
- Com certeza. - sorri para ele
- Aceita uma bebida?
- Ah, eu adoraria.
Continuamos conversando. Ótimo. Mais uma presa. Como isso me fazia falta. Olhei dentro da minha bolsa para verificar se a seringa estava lá dentro. Perfeito.
- Você tem belos olhos - ele disse. Agradeci, e então, saímos daquela boate.