O HOMEM QUE VOLTOU NO TEMPO

São Paulo, 14 de Março de 1958.

Alguns garotos brincavam de bola em um campinho improvisado dentro de um terreno vazio perdido nos cafundós da periferia de São Paulo.

Não que o lugar fosse tão longe assim do centro da capital. Porém naquela época era considerado longe devido às dificuldades com condução. Todavia hoje, com a facilidade do metro e pela fartura de ônibus, nada mais é longe em São Paulo.

Um dos garotos, de nome Luiz, é quem comandava as peladas aos sábados pela manhã. Ele organizava os times, ele jogava, ele era o juiz, ele era o massagista e por ter pulso firme era ele quem decidia se tinha sido pênalti ou não. E apesar de sua pouca idade, apenas 13 anos, todos o respeitavam. Percebia-se nele o carisma e a inteligência de organizar e comandar.

Naquele sábado tudo corria normalmente como sempre ocorrera nos outros fins de semana. Até que de repente um clarão cortou os céus como um raio e caiu por de trás do bambuzal que tinha do outro lado da rua em um outro terreno vazio, que era muito comum naquela época quando vários bairros estavam começando a nascer em São Paulo.

As crianças pararam a pelada e apesar da curiosidade ninguém se atrevia a aproximar do local.

Até que, como não poderia deixar de ser, o menino Luiz tomou a dianteiro e foi se aproximando pé ante pé até próximo de onde aquela coisa parecia ter caído.

Os outros meninos o acompanharam a certa distância, andando meio de lado e prontos para correrem caso surgisse algum monstro do meio do bambuzal.

Perceberam alguma coisa se mexendo por entre a ramagem até que, como se tivesse surgido do nada, um homem com uma roupa completamente estranha para a época saiu do meio do bambuzal e com um sorriso rasgado no rosto aproximou-se dos meninos. Assustados, eles se afastaram inclusive o Luiz.

----Não precisam ter medo não! Eu não vou morder ninguém! Podem ficar tranqüilos!

E enquanto os meninos afastavam-se, Luiz continuou parado com uma pedra na mão, que havia apanhado em meio ao entulho caso precisasse proteger-se daquele sujeito esquisito.

----Quem é você? –Perguntou Luiz.

----Meu nome é Adrian! Sou cientista! –Respondeu o homem.

As outras crianças, ainda temerosas, aproximaram-se de Luiz, agora também com pedras nas mãos, e ficaram esperando o homem que vinha em direção a eles.

----Em que ano estamos? – Perguntou ele.

Ninguém respondeu. Apenas ficaram olhando achando que o homem fosse louco.

----Em que ano estamos? Perguntou novamente.

----Mil novecentos e cinqüenta e oito. – Respondeu Luiz.

O homem deu um giro em torno de si próprio, apreciando tudo em volta, com os olhos arregalados como se fosse a primeira vez que vislumbrasse o mundo.

----Não acredito que consegui!!! –Gritou o homem, caindo ao solo de joelhos, com os braços erguidos para o céu, como se agradecesse a Deus por uma grande conquista.

Os meninos assustados afastaram-se. O homem ao perceber que os meninos estavam com medo começou a rir.

----Não precisam ter medo! Eu não vou machucar vocês!

O homem levantou-se e aproximou-se deles cautelosamente para não assustá-los. Com os olhos brilhando como duas perolas continuou olhando tudo em volta como se não acreditasse no que estava vendo.

----Mil novecentos e cinqüenta e oito! A máquina é de uma precisão inacreditável! Acertei na mosca! Só faltou cair dentro da casa dele! Vim parar no lugar certinho! Sou o primeiro homem na face da terra a conseguir isso!

Os meninos apenas olhavam, sem entender nada do que ele falava.

----Algum de vocês se chama Luiz? –Perguntou o Homem.

Ressabiados ninguém respondeu.

----Ei!... Vocês são surdos? Perguntei se algum de vocês se chama Luiz?

----Eu me chamo Luiz! Porque você quer saber? –Respondeu o menino, afastando as mãos para trás, ficando em posição de atirar a pedra caso aquele sujeito se metesse a besta.

----Luiz Inácio da Silva? – Perguntou o homem com os olhos arregalados dando a impressão de estar vendo um Deus a sua frente.

----Sim! Por quê? -- Respondeu o menino, surpreso por aquele sujeito saber o seu sobrenome.

O homem não respondeu nada, apenas abriu a sua bolsa, tirou uma pequena câmera e começou a fotografá-lo. Depois pediu para que o Luiz mostrasse as suas mãos.

----Para que? – Perguntou Luiz, intrigado com tudo aquilo.

----Para que eu possa fotografá-las!

----Fotografar as minhas mãos! Mas por que você quer fotografar as minhas mãos?

----Por favor! –Pediu educadamente o estranho.

Luiz ficou parado por alguns segundos e depois, não tirando os olhos daquele homem, estendeu vagarosamente as mãos.

----Você ainda tem todos os dedos! -- Gritou o homem pateticamente enquanto fotografava.

Um homem que do outro lado da rua observava a tudo aquilo, aproximou-se curioso ao perceber aquela movimentação toda próximo ao campinho de futebol. Um dos meninos gritou para ele:

----Seu Aristides!!! Esse cara tá tirando foto do Luiz!!!

----Quem é aquele senhor? – perguntou o estranho.

----É o meu pai! – Respondeu o Luiz.

O homem apontou a câmera para o senhor Aristides e tirou várias fotos dele também.

----Ninguém vai acreditar quando eu mostrar isso! – Murmurou baixinho o estranho

Seu Aristides gritou para as crianças que saíssem dali. Todos correram em sua direção e ficaram observando de longe aquele sujeito esquisito fotografando tudo a sua volta como se fosse um doido. Depois sumiu pelo meio do bambuzal, enquanto do outro lado, tanto as crianças como o senhor Aristides permaneceram parados com medo de irem atrás dele, pois não sabiam se o homem estava armado.

De repente ouviram algo parecido com uma explosão e em seguida um clarão emergiu por de trás da ramagem e subiu aos céus como um raio, desaparecendo misteriosamente por entre as nuvens deixando um rastro de luz para trás que logo se dissipou como se nada daquilo tivesse acontecido.