Outra Perspectiva - O Chamado
Meus olhos gostam de me enganar, pensei olhando para a parede em chamas. As labaredas dançavam formando uma árvore que eu desconhecia. Quando o fogo terminou, parecia que todas as folhas ainda queimavam. Meus olhos se arregalaram e os cavalos relincharam nervosos.
Um deles parecia mais paranóico, relinchava loucamente. Virei-me para encará-lo e tive a impressão de que o assustei. Ele se ergueu nos cascos traseiros e se jogou contra a porteira de madeira, quebrando o trinco de ferro e, de costas, coiceou a porta de madeira até que ela cedesse e o animal pudesse fugir. Porque eu o assustava tanto?
Naquela noite, papai havia brigado comigo. Ele dizia que eu estava fazendo minha mãe enlouquecer. Não era verdade! Eu nunca faria mal a mamãe, eu a amava. Papai, não. Ele só brigava comigo. Por quê?
Os cavalos não paravam de relinchar e, como sempre, não dormi.
Mamãe me levou para um lugar completamente branco. Não gostei de lá. Haviam médicos que me faziam sempre as mesmas perguntas: "De onde vieram as imagens?", "Como você as fez?", etc. E quando eu respondia, sempre diziam para que eu dissesse a verdade. Por que não acreditavam? Eu não estava mentindo! Era injusto demais e fiquei muito feliz quando mamãe me tirou de lá.
A mudança não adiantou muito. Eu conheci a árvore que queimou o estábulo. Mas, a única coisa que gostei foi o poço. As pedras faziam um círculo perfeito, gostava de passar a tarde com mamãe, perto do poço.
Naquela tarde, mamãe não veio ficar comigo, assim como fizera toda a semana. Mas, depois de algumas horas, ela apareceu. Não a olhei e ela se aproximou:
-Gosta daqui, Samara? - Ela deu mais alguns passos e ficou logo atrás de mim. De repente, tudo ficou escuro. Um saco preto envolveu minha cabeça e comecei a ficar sem ar, não podia respirar. Apenas ouvi mamãe sussurrar: - Eu queria tanto você!
Ela me empurrou para o poço e minha cabeça bateu nas pedras antes que eu atingisse a água fria.