REFLEXÕES DA VIDA 


Eu sempre fui fascinado pelo cemitério!
É uma sensação estranha para muitos e para outros, um ato insano, irresponsável, uma brincadeira de mau gosto. Num escuto! ou melhor, finjo não escutar, afinal são tantos assuntos que causam estarrecimentos e discórdias, que mais um não será novidade, nem motivo para explicações ou justificativas.
A verdade é que o cemitério é um dos lugares mais convidativos para uma reflexão aprofundada sobre a vida. O que somos, de onde viemos, onde terminaremos ( e aí falo do corpo!) É no silêncio do cemitério que descemos do pedestal e descobrimos a nossa fragilidade. Descobrimos o quanto somos insignificantes, embora insistamos em manter a pompa e olhar por cima do ombro em direção ao próximo.
Não sei precisar de fato quando me dei conta de que gostava de visitar este lugar. Lembro-me somente de que, ainda adolescente, quando vendia jornais pelas ruas da minha Garanhuns, não tinha um dia de verão que, distante da minha casa e para escapar de um sol intolerante, eu não entrasse no cemitério São Miguel para me abrigar um pouco em algum túmulo proximo a uma árvore ou em frente a algum mausoléu que projetasse uma sombra refrescante.
E ali passava horas discorrendo sobre a vida!
Minha mãe conta que quando criança eu num podia ouvir falar de um defunto que corria até a sua residência e lá ficava ao lado do caixão como se fosse algum parente. Bom, essas experiências logo cedo podem indicar o caminho para aqueles que, curiosos e estudiosos, queiram traçar o meu perfil ou tão somente, adeptos de Sigmund Freud, queiram encontrar uma explicação plausível para esse meu estranho e reprovável gosto. Mas o certo é que eu sempre gostei de passear por entre os túmulos, relembrando os amigos e parentes que foram e que um dia estiveram lado a lado, trilhando o mesmo caminho.
Pois bem, este era um dia diferente daqueles que eu  acostumara a visitar o vale do descanso. Era uma tarde fria e o céu era de um aspecto nebuloso. Havia chovido todo o dia, mas desde as 15:30h fez-se uma trégua e somente o ar gelado e o assobio do vento passeando por sobre os galhos das árvores, gerando um som propício ao ambiente, faziam-se presentes junto a porta de um dos túmulos que eu resolvera escolher para meditar, devido a sua localização um pouco mais escondida do acesso principal e da entrada, evitando assim um vai e vem de pessoas. Estava eu a divagar sobre a transitoriedade da vida que nem percebi o jovem que se aproximara com passadas suaves e lentas, parando ao meu lado. Cumprimentamo-nos e ele perguntou se eu permitiria que ele sentasse, por um pouco, consentindo sem nenhuma dificuldade. Dentro de mim, indagava surpreso com aquela presença inesperada. Um outro jovem que, como eu, tinha o mesmo hábito ou então estava visitando o túmulo de um ente-querido. Logo a minha curiosidade foi satisfeita   ao ouvir do mesmo a razão da sua presença e maravilhado confirmei que seus motivos não eram diferentes dos meus! Há muito ele também visitava o local e revelou que nunca tinha prestado atenção ou pensado sobre a brevidade da vida e o que temos feito de útil para com ela. E somente há pouco tempo ele descobrira tal verdade, embora não parecesse feliz com tal descoberta. Conversamos por cerca de 40 minutos e fiquei impressionado com a harmonia dos  seus pensamentos e colocações a respeito de buscarmos viver intensamente todos os momentos, principalmente ao lado daqueles que amamos, como também buscar viver em harmonia com os demais seres humanos, pois a vida é como a água derramada que não mais se pode juntar! Levantou-se, curvou lentamente a cabeça em gesto de cumprimento e seguiu em frente enquanto eu, admirando  tudo que ele dissera, acompanhei-o com os olhos até perdê-lo de vista por entre os túmulos. Por fim, levantei-me ainda meditando em sua palavras e segui em direção a saída, pois já estava anoitecendo. E como sempre fazia, fitava os olhos em cada túmulo, olhando as fotos e lendo as lápides. E qual não foi a minha surpresa e choque ao fitar os olhos em uma catacumba e ver a foto daquele jovem que há pouco estivera comigo!
Passeei os olhos incrédulos como a buscar maiores informações e constatei que seu óbito se dera a exatamente 15 dias! 
 

OBS.: Trata-se meramente de uma obra de ficção, ainda que intoduza algumas verdades para meditação.
Maurício Pais
Enviado por Maurício Pais em 15/06/2009
Código do texto: T1649363
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