Noites Sem fim - O Castelo
Vim a passeio, numa viagem pensando que seria apenas uma aventura de férias, uma história a mais pra contar para as amigas na volta pra casa. Mas o que seria uma estadia de apenas uma semana, se arrasta para mais de um ano. Nunca soube o que me trouxe aqui e nem o que me prende a ele. Apenas não consigo me livrar do encanto e ir embora.
Durante o dia eu vago pelo castelo, esse inferno cercado de gelo e vento uivante, ouço os animais que ali circulam, sei que ao colocar os pés lá fora serei impiedosamente devorada. Aqui dentro, ás vezes o calor é insuportável, não consigo entender, aqui quem faz o clima é ele, depende do humor. Ás vezes um frio maior do que lá fora, outras vezes um calor acima de 40 graus. Há dias em que sopra uma brisa trazendo o cheiro do mar, ás vezes sinto até mesmo o cheiro de rosas e ouço pássaros a cantar, penso que enlouqueci. Aqui dentro tudo é ilusão e a sua ilusão preferida é nos enlouquecer, nos confundir. Assim nos tornamos mais frágeis e vulneráveis. Outro dia pela manhã escutei barulho de carros e buzinas, havia gritos de crianças, pensei ter voltado para casa, senti no ar um cheiro de café da manhã. Creio que nesse dia até mesmo ele estava com saudades de sua família, embora nunca não fale nela.
Não tenho noção das horas, esforço-me para contar os dias, saber a quanto tempo estou fora do mundo real. Aqui o tempo é dele, as horas são contadas por ele, é ele quem manda e eu rebelde como sou, sempre me recuso a me curvar diante de suas vontades, como se fosse possível.
Quando olho lá fora nem sempre vejo a mesma paisagem, mas hoje particularmente, vejo as montanhas geladas que nos cercam e ouço o uivo dos lobos. Essa paisagem é a mais constante, é a sua ilusão preferida. Ele sente, ele sabe que tenho medo do frio, tenho medo de ficar sozinha. Mas, tenho mais medo de sua presença,nunca sei como virá. Ás vezes vem tão doce e sedutor, outras assustador e violento e nos dias de saudades vem calado e quieto. Sinto medo e sinto saudades.
Há muito tempo não o vejo, sinto que não está no castelo, o frio já dura há muito tempo, é como um sinal de que ele partiu e estamos sozinhas, é o frio do abandono. Sempre que se ausenta, ao voltar traz uma nova presa, uma jovem bonita e indefesa. Nos primeiros dias ele só se mostra bem humorado e os dias aqui tem cheiro de mar, lá fora cantam as gaivotas e aqui dentro sopra uma brisa agradável. Penso que nestes dias ele conhece o amor, ele vive o amor. Mas, depois de alguns dias, o clima muda e ele nos abandona. Aí conhecemos o seu lado cruel e sofremos, nesses momentos nos descobrimos perdidas.
Nem sempre penso, mas quando ele não está, sinto uma curiosidade, minha mente se livra do seu domínio e enfim posso pensar. Sinto que ele lê meus pensamentos e governa minhas vontades. Algumas das outras são tão submissas que nem ao menos falam, trazem no rosto sempre uma expressão ausente.
Sei que quando ele voltar irá trazer consigo uma nova mulher e curiosamente sinto ciúmes. Creio que o que me prende aqui, não é o frio lá fora, mas atração que sinto por ele. Sei que jamais vou embora, que sempre que desejar fugir, ele me seduzirá e eu me renderei.
Quando cheguei aqui senti-me deslumbrada, não enxergava mais nada além dele. Naqueles dias ele estava lindo, encantador. Me trouxe pela mão e eu nem me lembrei do mundo que ficava lá fora, ele me prendia em seu sorriso, em seu olhar. Naqueles dias seus olhos eram azuis, sua boca era linda, sua pele morena, saudável e o corpo a minha fonte de prazer. Me dizia frases lindas e eu nem mesmo enxergava as outras que vagavam pelo castelo. Durante o dia eu dormia, durante a noite ele me amava, me exauria. Eram longas noites de amor, ele parecia nunca se saciar e eu o servia. Ao raiar do dia ele partia e eu adormecia, nem me alimentava. Na quarta semana ele trouxe consigo uma loira e ela se deitou conosco, nem pensei em recusar, ele me convencia mesmo antes de falar. Na manhã seguinte, nos deixou exaustas e partiu. A noite ele levou a loira e trouxe duas morenas, e aos poucos ele trouxe todas para nossa cama e eu me deitei com todas, juntamente com ele. Já naqueles dias o clima mudava, já não mais sentia o cheiro do mar e nem dormia o dia todo. Então houve uma noite em que ele não veio, naquela noite comecei a agonizar, no dia seguinte senti o frio e pela primeira vez eu realmente me vi desde que havia chegado ao castelo, estava deprimente, horrível e abandonada. Então descobri um mundo, o mundo que ele nos dava. As noites se tornaram intermináveis e ele apenas uma vaga presença nas ordem que eu recebia. Vagando pelo castelo descobri e vi de modo diferente as mulheres com as quais eu havia me deitado. Elas vagavam como eu, mas não estava tão magras e acabadas como eu estava, então descobri que haviam se alimentado de minha energia. Por algumas, creio que me apaixonei, na ausência dele, eu mesma as convidava para minha cama. Mas, sem ele o prazer não era o mesmo.
Então amanheceu um dia de sol, eu senti o cheiro do mar e ouvi o som das ondas e o grito das gaivotas. As montanhas geladas e os lobos haviam ido embora, ele havia trazido uma nova presa. Ele se renovaria e nós juntamente com ele nos alimentaríamos na nova presa.
Continua...