Meu nome é Johnny!
(Este conto eu escrevi junto com minha nova parceira literária, Sofy Sol. Este é obra nossa)
Todos os dias era a mesma coisa. O mundo parecia sentir pena dele, mas ele tinha um sonho maior que o próprio mundo.
Johnny é uma cara bacana. Roqueiro da pesada. Sempre gostou de beber muito e dirigir feito louco pela cidade com os vidros abertos e o som no último volume. É líder da banda de rock “Alive to die” (vivos para morrer). O grupo se apresenta para milhares de pessoas em muitos países. Os cinco amigos são quase tão famosos quanto os Beatles.
Johnny é um cara de sorte. Bonito, rico, famoso e com uma vida inteira pela frente. É o sonho de todas as meninas. É o desejo de muitos garotos. Muito álcool, drogas, sexo, velocidade e rock and roll.
Essa era história de Johnny, uma vida comum de pop star, tão normal que nem valeria apena contar se não fosse pelo desastre. A fatalidade entrou pela porta da frente sem bater, mudando drasticamente a vida de nosso herói. As drogas, o álcool e a vida louca fizeram muitas vítimas e nesta história não foi diferente. Na madrugada de natal, Johnny e os integrantes da banda, estavam comemorando o belíssimo ano de trabalho. Completamente bêbado Johnny desafia o próprio destino e o de seus colegas. Vidros abertos, velocidade máxima, estrada reta, som no limite e faróis desligados. Não se sabe ao certo o que aconteceu. Nesta noite trágica, quatro jovens foram mortalmente feridos no carro que Johnny dirigia. Uma família, mãe, pai e filho mortos em outro carro sem saber o que os atingiu. Johnny teve as pernas esmagadas entre as ferragens. As pessoas não perdoam este tipo de conduta, a mídia massacrou, o povo condenou e a justiça não teve pena. A família dos que perderam suas vidas processaram o garoto tomando dele o que lhe restava. Nosso herói ficou sem dinheiro, com uma culpa que não cabia dentro de sua cabeça e sem as pernas. Ficou sob custodia. Tentou se matar. Não podia suportar a dor que causara a si mesmo e aos outros. Não conseguia olhar nos olhos dos pais de seus amigos mortos. Seu pai vendeu a maior propriedade que tinham para pagar às custas do processo. Johnny agora estava fadado a viver como um inválido, sobre cadeira de rodas, sustentado por seus pais.
Passados quatro anos, o mundo lembrava, às vezes, da melhor banda de rock daquele trágico ano. Johnny nunca esqueceu. Sofrera cada minuto. Sempre sonhava com os amigos da banda. Uma noite ele teve um pesadelo que interpretou de maneira positiva. No sonho estavam todos vivos, faziam um show para uma multidão de fãs enlouquecidos. O detalhe é que ninguém da banda tinha pernas. Todos eram cadeirantes. Johnny acordou gritando.
Está é uma história de superação. A tragédia já passou.
Johnny tinha uma carta na manga, sabia cantar como poucos e tocava guitarra muito bem. Com um pouco de treino e adaptação dos pedais, em pouco estaria tocando profissionalmente. Johnny coloriu seu mundo novamente quando teve a idéia de montar uma banda de aleijados como ele. Sua mãe vendo seus olhos brilhar pelo entusiasmo resolveu colaborar. No fundo ninguém acreditava muito na idéia, mas o importante era que o rapaz havia encontrado motivos para viver. Johnny Juntou as ultimas economias, colocou um grande anúncio no jornal convocando músicos para o teste. Com o apoio da mãe e de um amigo arquiteto fez um “Home Studio” adaptado para deficientes.
O pré-requisito para entrar na banda era ter alguma deficiência física. Melhor ainda se fossem cadeirantes como ele. O telefone não parava de tocar. No dia do teste uma fila enorme se formou na frente do prédio onde mora. Tinha músico com todo tipo de deficiência. Um baterista sem um dos braços que tocava tão bem quanto Neil Peart, baterista do Rush. Um guitarrista sem as duas pernas e um braço que tocava com os dentes, segurando o instrumento com o braço que lhe restava. Não demorou muito e a banda estava formada. Johnny na guitarra base e voz, Aleijadinho na bateria, Jimi Dentex na guitarra solo, Marcinho Surdinho nos teclados, tem esse apelido, mas na verdade é cego. Faltava apenas o baixista. Entre os candidatos não havia um baixista de boa qualidade. Quando Johnny estava quase ligando para um amigo que tocava baixo muito bem, mas não tinha nenhuma deficiência física aparente, o interfone toca. Johnny atende e logo ouve um som de baixo arrepiante. Mandou o, seja lá quem for, subir. Quando sua mãe abriu a porta para receber o baixista desconhecido, não viu ninguém. Tomou um susto quando olhou para baixo e viu o menor baixista do mundo. A banda estava completa. Dois cadeirantes, um maneta, um cego e um anão. Estava nascendo à banda que Johnny batizou de Rock´s Disabled People, (deficientes do Rock) a banda de rock pesado mais deficiente do mundo. No dia do teste ainda apareceu um produtor musical cadeirante e um assessor de imprensa surdo-mudo. Johnny com esse time começou a marcar estúdio para ensaio e criação.
Logo que a mídia ficou sabendo da parada choveram oportunidades para os caras divulgarem a nova banda. Foram ao Jô Soares, MTV, Altas Horas e até no Faustão. Se apresentaram tocando couvers de rocks clássicos, pois ainda não tinham um repertório fechado. Já faziam sucesso antes mesmo de lançarem o disco. Até mesmo Johnny achava estranho algumas vezes, mas era o que ele queria. Tinha ficado vivo, então, era pra fazer valer apena. Não tinham nada a perder, por isso podiam fazer a mais pura arte, fazer aquilo que realmente gostavam. O povo vai comprar o disco por curiosidade, todos sabem, os roqueiros vão adorar e esse era o objetivo, ganhar dinheiro tocando rock de verdade. O primeiro disco ficou pronto em seis meses. O álbum "Crazy Motherfuckers" vendeu um milhão de copias rapidinho. Logo a banda “Rock´s Disabled People” estava na parada de sucesso de vários países do mundo, com mais de 20 shows por mês.
Até nos sonhos existem pedras para tropeçar. No caso do sonho de Johnny existiam barreiras reais. Na maioria dos programas de TV e rádio os estúdios não tinham nenhuma adaptação para cadeirantes. Ele tinha que ser carregado no colo por algum segurança grandão, e que homem gosta disso? Boa parte das pessoas tinha dificuldades para se comunicarem com seu assessor de imprensa. Mas a máxima dessas barreiras aconteceu no primeiro dia de show em Beijing, China. Pelo excesso de shows eles sempre chegavam poucas horas antes do inicio. Ao chegar se depararam com vários degraus em cima do palco e nenhuma rampa de acesso. Eles teriam que ficar ‘amarrados’ em seus lugares. Jime Dentex ficaria no chão por não ter nenhum apoio para a guitarra. Sinal de Libras em chinês não é nada fácil. Depois de tanto trabalho Johnny achou uma sacanagem cancelar um show mesmo por esses motivos. Eles subiram no palco e arrasaram, tocaram o melhor rock and holl que a china já ouviu. O show foi transmitido ao vivo para varios países do mundo. Johnny, muito esperto, para o show e faz um belíssimo discurso sobre respeito e o direito devido aos deficientes físicos. O público aplaudiu e chorou cantando a música I´m no different from nobody.
A banda lançou o segundo disco “Horror Circus”. Chovia dinheiro e mulher. Não importa a aparência, se tem dinheiro sempre terá mulher. E Johnny que era um rapaz bonito aproveitava até a última gota. Muita mulher, álcool, drogas, sexo e rock and roll. Mas para ele ainda faltava alguma coisa, e não eram as pernas. Ele sentia falta da velocidade. Mandou adaptar um Dojão Americano tunado e adaptado a suas necessidades.
A mais nova melhor banda de rock da atualidade promoveu uma festa para comemorar o sucesso do novo álbum. Mulheres bonitas, bebidas, comidas e drogas à-vontade. A melhor festa do último ano. Um Crow Royal, uma raridade de milhares de dólares que Jhonny aproveitava sozinho. Meia garrafa e ele se propôs mostrar a super máquina que comprara. Entrou no carro, empurrou a cadeira de rodas para o mais longe que conseguiu. Alguns até tentaram adverti-lo. Abaixou os vidros e colocou a música de maior sucesso da banda no último volume. Vidros baixos, velocidade máxima numa estrada reta, o som no limite, sem cinto de segurança. Tudo se repetia. Mas Jhonny teve que parar. Sinal vermelho e muitos carros na pista contrária. Parou alguns metros depois da faixa de retenção. A aceleração do carro continuou. Os olhos dele estavam quase se fechando. O ronco do motor ajudava a se manter acordado. Deu mais um gole no precioso wisky, colocou o copo no apoio... Continuou acelerando. O sinal abriu e saiu em disparada. De 0 a 100 km/h em poucos segundos. O vento entrava no carro e Johnny sentia a liberdade novamente. Mais de 140 km/h a estrada parecia um tapete, quase nenhum carro na pista. 180 km/h somado a madrugada sombria já não é mais possível identificar nada que passa ao redor. 200 km/h vultos passam pela cabeça de Johnny, muitas lembranças, sua vista embaça. Um urso atravessa a rodovia lentamente. Um urso? Ele desvia bruscamente. Perde o controle do carro e bate num poste. Seu corpo é lançado fora se chocando numa árvore. A esse acidente ele não sobreviveria...
Está ainda é uma história de superação.
Alguém chamou a polícia. Johnny ouve sirenes ao longe.
- Hei, rapaz! Hei, cara! – Um policial grita cutucando o braço de Johnny.
- Ele está morto? – Pergunta outro policial.
- Não! Deve está bêbado, ou drogado, ou os dois. – Respondeu. – Acorda! – Gritou.
Johnny abriu os olhos devagar, a claridade dos primeiros raios de sol o cegava. Ele acordou atordoado. Tateou o corpo.
- Dois braços, um pescoço, – dizia com a voz rouca pegando em cada parte do corpo – ombro, peito, pê... Ok! Só me faltam duas pernas. – Sentiu a própria respiração. Estava vivo. Novamente teve um maldito pesadelo! A mistura feita por Johnny de bebidas com remédios controlados, por causa da amputação, sobrecarregou seu organismo que ainda estava fragilizado. Apagou como se tivesse tomado um ‘sossega-leão’.
- Estou vivo! – Gritou a todo pulmão. Se pudesse teria pulado de tanta felicidade.
- Não disse que o cara tava bêbado. – Comentou o policial com seu colega de trabalho.
- Rapaz, está tudo bem? – O que aconteceu?
- Estou vivo. Estou vivo. Estou vivo. – Era única coisa que Johnny dizia. Lagrimas escorriam pelo seu rosto repleto momentaneamente enrugado pela farra.
– Obrigado céus! Obrigado terra! Obrigado Crow Royal! Obrigado remédios! Obrigado! Obrigado! Obrigado!
Dessa vez o pesadelo fora bem pior, não mostrara um recomeço, mostrara seu fim. E essa lição não duraria só alguns anos... Seria para toda vida.
- Camarada – falou o homem da lei num tom amigável –, já vi que está bem, mas qual é o seu nome rapaz?
- Meu nome? – Pensou na pergunta antes de responder. Inspirou forte e respondeu.
- Meu nome é Johnny.
Macaco Pelado e Sofy Sol