O Campeão de tiro
Ana Maria, com muitas primaveras no corpo enrugado e com as marcas da vida atribulada e sofrida, que Deus lhe havia privilegiado, estava sentada na poltrona que pertencera ao seu finado Mario, e pensando nos últimos e terríveis momentos que havia passado. Ana Maria, tinha nas mãos, a velha pistola 9mm, que era do falecido e que fora a protagonista número um dos fatos daquele dia sombrio.Tudo havia começado com a chegada de Carolina,a filha querida, que morava fora do Brasil. Carolina viera visitá-la e trouxera seu filho para conhecer a vovó Brasileira. Um menino lindo, loiro, com olhos azuis e embora a descendência germânica do pai ,tinha nos traços da mãe, as sobrancelhas do vovô Mario. Joahnes completara 7 anos nàquela semana e veio comemorar com Ana Maria. Menino esperto, saudável, com uma inteligência acima da sua faixa etária e altamente perspicaz, além de ser bastante arteiro.Carolina, que havia sido rainha em vários concursos de beleza , mesmo com a gravidez e os anos de casamento não havia perdido a exuberância , as formas esculturais, e os ares senhoreais que a deixavam ainda mais bonita.
Aquela segunda-feira jamais será esquecida por Ana Maria e Carolina, pois no domingo anterior,por terem festejado o aniversario de Joahnes foram se deitar tarde da noite. Pela manhã, ao tocar a campainha, Ana ,ainda sonolenta , olha pelo sistema de vídeo percebendo que havia um senhor bem arrumado e com uma caixa colorida na mão. Ana, ao abrir a porta, vê ,para sua surpresa, que o mesmo não estava mais sozinho e tinha um companheiro, que surgira de repente, e por estar armado com uma faca e gritava:
- É um assalto, é um assalto!..não grita velha, ou acabo com a tua raça!!!
No movimento seguinte ,o mais velho, pegando Ana Maria pelo pescoço, vai em direção do quarto levando-a aos empurrões . Ana Maria procurando manter o controle, na esperança, que Carolina ao ouvir os bandidos chamas- se a policia . Vê as suas preces caírem por terra ao ver sua filha empurrada pelo marginal com aparência mais jovem , com o olhar vidrado e voz de falsete disse :
- Olha só o bom-bom que eu encontrei , que baita mulherão cara!
- Amarra ela numa cadeira e vamos ver o que podemos levar – fala o mais velho.
- Qual é a tua cara, eu vou é me divertir primeiro com esse docinho,depois nós levamos as muambas . -
Em ato continuo foi rasgando as roupas de Carolina, jogando-a no chão, baixa as calças e, prepara-se para consolidar a violência.
Ana Maria, não conseguia gritar, que diria tentar fazer alguma coisa, quando algo inesperado aconteceu: seu netinho apareceu com a arma do avô na mão e atirou duas vezes . Os dois malfeitores caem instantaneamente no chão da sala, com um ferimento mortal no meio da testa de cada um . Ana Maria não acreditando no que vê, fica mais assombrada ainda, quando ouve o menino dizer em voz forte :
- Desculpe o contratempo querida, mas não podia deixar que eles maculassem nossa garotinha.
Joahnes desmaia, deixando a arma cair aos pés de Ana Maria . Carolina, ainda zonza com o som dos tiros, consegue sair da posição humilhante que se encontrava, afasta o corpo do marginal , recompoem-se , abraça a mãe e procura reanimar o filho . Ao comprovar que todos estão bem, pega o telefone e chama a policia. Os policiais, ao chegarem, não conseguem acreditar no que estavam presenciando; pois ninguém atira com tanta precisão, muito menos um menino com apenas 7 anos . Foram tomadas as medidas de praxe e confirmada a extensa ficha delituosa dos dois bandidos envolvidos, o resto era com a justiça.
Ana Maria estava novamente só. Não quis ir com Carolina (a filha queria levá-la para a Alemanha) e procurava respostas para as seguintes perguntas :
Como seu neto havia encontrado a arma ? Como poderia ter atirado,se ela tinha certeza de manter a arma descarregada ? Era uma pistola automática e o pente com balas estava em outro local ? E a voz que ouvira de seu netinho, tinha convicção de que era a de seu querido Mario ?
Um leve sorriso formou-se em seus lábios,levantou-se e foi guardar a arma no lugar costumeiro. Dirigindo-se ao quarto, foi até a fotografia de seu casamento, rezou agradecendo a Deus e pareceu-lhe ter visto um piscar de olho naquele rosto maroto de seu amado. Lembrou-se que Mario havia sido campeão de tiro do regimento, pegou a fotografia ,colocou-a no travesseiro, beijou-a, e dormiu abraçada.
Gildo Oliveira