PRAÇA XV Nº 16

Todo mês de março, após a ressaca das férias, quando a vida começa lentamente a tomar conta de nós e o ano finalmente parece que vai deslanchar, uma das tarefas que não se pode abrir mão, para quem tem filhos em idade escolar.É a romaria de pais, levando a tiracolo as famigeradas listas de materiais a serem comprados, a fim de encarar o ano letivo.

Munidos de paciência, tempo, pouco dinheiro, fomos cumprir a gincana de: Pergunta daqui? Especula dali? Pechincha acolá?

Após semanas de intensa aventura, por livrarias, feiras e a grande novidade do momento: As lojas de preço único. Finalmente, quando se pensa que tudo está resolvido...

A pergunta vem, rascante, seca e implacável, no intervalo do Jornal Nacional, no exato momento do ajeitar da erva na cuia.

__ E a mochila, Pai?

Mochila: serve para causar deslocamento na coluna,carregar livros, cadernos, mini-games, merenda; no caso dos adolescentes o inseparável telefone celular ( que nunca tem cartão e/ou está na caixa postal,e as vezes como certos centroavantes “fora da área de cobertura”), e nos intervalos dos recreios, recheada de jornais serve também de bola.

Isto posto, refeitos do susto , os calos e a bolhas dos pés, já sofrendo de antemão, vamos dormir e ter sonhos coloridos com mochilas, merendeiras, malas e todo o tipo de bagageiro.

Após um dia de trabalho, a caminho de casa, chegamos numa banca de camelôs, com artigos importados, bugigangas “paraguayas”, onde estavam expostas diversas mochilas.

Fomos atendidos por um casal jovem, atenciosos e solícitos, e uma graça de criança que estava no carinho, que chamava atenção pelo intenso azul de seus olhos e os cabelos louros cacheados.

Mas, como filho que estuda pela manhã, e mora dentro da televisão à tarde, se não for mochila do “POWER RANGERS”, não serve.

Voltamos a banca para trocar a mochila. Só que desta vez ao invés do simpático casal com seu lindo bebê, quem nos atende, é um senhor grisalho. Diante da pergunta inevitável, por eles, o surpreso vendedor, nos argumentou que faria a troca da mercadoria, e era proprietário daquela banca naquele local a mais de dez anos, e não conhecia nenhum casal conforme a descrição feita por nós, no que foi corroborado pelo demais proprietários de bancas da rua.

Ainda, sestrosos e incrédulos, fomos abordados por um vendedor de cahorro-quente, que ouvia a conversa:

__ Olha, senhor, um casal com estas características, teve uma banca aqui, há mais ou menos quinze anos, mas foram mortos num assalto junto com seu filhinho.

Pesquisando, nos arquivos da Policia , descobri num jornal de quinze anos atrás, com a seguinte manchete:

CRIME NA PRAÇA

“Casal de artesões e barbaramente assassinado, junto com seu filho.

Nas fotos que ilustravam a reportagem, estava o simpático casal, que nos vendera a mochila e seu filho tinha o sorriso mais radiante, que nunca.

JOAO DE DEUS VIEIRA ALVES
Enviado por JOAO DE DEUS VIEIRA ALVES em 14/04/2006
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