N a F o r c a

Colocaram o laço em torno do pescoço do condenado. Seu olhar que parecia distante encontrava-se, no entanto voltado para seu interior. Seu EU gritava os últimos alentos de esperança para seus algozes que pareciam cães raivosos, desejosos de sangue e da satisfação de suas próprias doenças.

O medo que sentem é como o ódio, que os subjuga e assim vêem-se obrigados a cumprir a sina que lhes fora destinada. Pobres diabos ou vampiros que só se satisfazem com o sangue e o sacrifício do homem.

Homem que eles temem, por ele não pertencer ao que eles mais consideram importante.

Pensam poder sufocar aquilo que mais temem, a verdade. Preferem se arrastar como répteis, no grande lodaçal da vida que levam.

Imaginam que enforcando o homem,poderão sufocar a verdade que tanto lhes incomoda.Verdade que se espalhará sobre toda a terra, para redimir todos aqueles que por ela lutam.

Lobos, cães raivosos que precisam de sangue para satisfazer instintos bestiais, de mentes deturpadas e torpes.

Procuram abafar o grito daquele que poderá balançar grotescamente, pendurado por uma corda. Tiram a vida, mas não conseguem entender que os mártires deixam pairando sobre si sua sombra. Sombra traduzida em palavras que deverão aumentar ainda mais. Palavras que irão atormentar-lhes durante os tempos.

E talvez até ouçam:

- Mataram um inocente.

A eles nada mais restará do que a morte. Não a morte a que tentam expor o homem e sim a de suas lembranças e recordações.Com o passar do tempo, o que disse o homem continuará a acalentar o coração de milhões por toda a terra. Seus algozes jazem há muito mortos e esquecidos. Sepultados pelo tempo.

O prisioneiro abre os olhos lentamente e em segundos, olha a multidão, que se aglomera abaixo do cadafalso.

Sorri...Um sorriso triste e contrariado. A contrariedade própria dos justos, associada a enorme dor que sente, por ver a turba que não conseguiu entender o verdadeiro significado de suas palavras

O Carrasco encapuzado aproximar-se trazendo em suas mãos um pano preto, para tapar-lhe a visão.

Aproxima-se e quando vai colocar a venda o homem diz:

-Julgas necessário tapar-me a visão ? -Acaso pensas com isso livrar-se do meu olhar?

-Vamos, cumpre tua missão, tenta impedir que meus olhos o veja, porquanto mesmo sob a terra poderei ver-te e aos outros, do mesmo modo que os vejo agora, como caricaturas malfeitas de homem.

-Vamos aplaca tua ira, tira aquilo que não me deste e mesmo assim continuarei vivo em minhas palavras para atormentar-lhe durante os tempos.

-Continuarei vivo onde existir outro como eu e não serão dias, anos e séculos que irão me envelhecer. Tu, no entanto tens a vida limitada pelo tempo em que vives.

-Eu continuarei, me perpetuarei naqueles que vierem a compreender que a verdade jamais será sufocada, enquanto existir na terra um homem.

-Refiro-me ao verdadeiro homem e não caricaturas malfeitas como vós.

Diante de tais palavras o carrasco baixou a cabeça, retirou o capuz e desceu lentamente a escada do cadafalso. A multidão, a grande massa grita e exige duas execuções. Passa a dirigir ao carrasco toda a sua ira.

O prisioneiro retira as corda do pescoço e se afasta lentamente.

Nenhum dos presentes tem coragem para encarar sua própria realidade e tentar sufocar a liberdade, manifestada naquele momento em um homem, como verdade.

29/09/83

Vanderleis Maia
Enviado por Vanderleis Maia em 13/02/2006
Código do texto: T111486